A Vida Imitando a Arte. Um Conto de Fadas Moderno. Parte 3.

Um conto erótico de Ménage Literário.
Categoria: Heterossexual
Contém 5470 palavras
Data: 03/11/2025 13:53:06

Nazaré se levantou, pegando o envelope e entregando à jovem.

— Você não viu nada, não sabe de nada e, se perguntarem, a Monalisa passou a noite de sábado no barracão, esfregando o chão.

Talita assentiu, os olhos arregalados com o peso do dinheiro.

— Pode deixar, dona Nazaré.

Ao sair, a porta se fechou atrás dela com um clique abafado.

— Agora sim. — Disse Nazaré, cruzando os braços. — Temos uma faxineira oportunista, um herdeiro encantado e um bandido perigoso e ciumento no meio da história. Essa peça já começa a se escrever sozinha.

— O segredo é conduzir o roteiro. — Disse Getúlio, pegando novamente o celular. — Porque se o mocinho insistir em bancar o cavaleiro da plebeia, a gente transforma a mocinha no problema. E problema, você sabe … se elimina.

Continuando:

Parte 3: “Sexo, Samba e Confronto”.

Getúlio recostou-se na cadeira, cruzando as pernas com ar impaciente.

— Então é simples … — disse, sem rodeios. — … a gente demite a garota. Pronto. Fim da novela. Sem a gata borralheira, sem conto de fadas.

Nazaré, que até então folheava o dossiê de Monalisa, levantou o olhar devagar, um brilho gelado nos olhos.

— Você sempre foi prático demais, Getúlio. Mas, às vezes, a melhor forma de apagar um incêndio é deixá-lo queimando devagar, até que a brasa vire cinzas.

— Traduzindo? — Getúlio arqueou uma sobrancelha, entediado.

— Se a demitirmos agora, levantaremos suspeitas. O Fernando não é burro, apesar de parecer. Ele vai perceber. E o Thomas, com o coração mole que tem, vai perguntar o porquê. — Nazaré levantou-se, caminhando até a janela do escritório, de onde se via o pátio interno da empresa. — A garota fica. Pelo menos, por enquanto.

Getúlio riu contrariado, aquele tipo de riso abafado que escondia ironia.

— Você vai manter a Cinderela às vistas do príncipe …

— Quero mantê-la sob os meus olhos. — Nazaré interrompeu, fria. — Já apaguei o registro da entrada dela no baile. Oficialmente, Monalisa da Silva nunca passou pela portaria principal no sábado à noite. E ninguém vai se lembrar, porque as câmeras da festa estavam voltadas para o palco e os convidados importantes.

Getúlio também se levantou, caminhando até ela.

— Nazaré, isso é um risco. O garoto ficou encantado. Você viu o jeito como ele olhava para ela. Quanto mais tempo ela continuar aqui, mais chance de ele querer descobrir quem era a mascarada da noite.

Ela virou-se para ele, um sorriso discreto se formando no canto dos lábios.

— É por isso mesmo que eu não vou demitir a garota. Vou apenas … movê-la.

— Movê-la?

— Sim. — Nazaré abriu uma das gavetas do armário e retirou um mapa dobrado com as localizações das filiais da holding. — Temos uma unidade de produção lá na Zona Oeste, no limite da cidade. Longíssimo da matriz. Vou providenciar a “transferência” dela pra lá. É uma forma elegante de mantê-la na empresa, mas fora do alcance do meu enteado.

Getúlio observou o gesto dela traçando o mapa com os dedos, satisfeito com o cinismo e a precisão da ideia.

— Inteligente. Assim, se alguém perguntar, ela continua contratada. E o Fernando jamais vai cruzar com ela por acaso nos corredores.

— Exatamente. — Nazaré voltou à mesa e pegou o telefone. — E mais: quero que um dos nossos seguranças de confiança, alguém que não faça perguntas, passe a observar discretamente os passos dela. Relatórios semanais, horários, trajetos, comportamento. Se ela tentar contato com o Fernando, eu quero saber antes mesmo dele pensar em responder.

Getúlio a observava com uma mistura de admiração e receio.

— Às vezes, você me assusta, Nazaré.

— É por isso que você ainda me ama, Getúlio. — Disse ela, com um meio sorriso, colocando o telefone no gancho. — Agora vá providenciar a papelada da transferência. Quero aquela garota longe daqui até o final da semana.

Ela então olhou para a janela novamente, o reflexo de seu rosto no vidro se misturando ao movimento dos funcionários no pátio lá embaixo.

— Contos de fada são bonitos, Getúlio — Murmurou. — Mas eles sempre terminam antes da meia-noite. Engolidos pelas sombras.

{…}

No dia seguinte, quando o e-mail do RH chegou, o coração de Monalisa afundou: “comparecer ao setor de Recursos Humanos às nove horas”.

Ela chegou pontualmente, de uniforme limpo e olhar desconfiado. O corredor do RH parecia mais frio que o normal e o silêncio das outras funcionárias era quase um aviso. A moça que a atendeu mantinha um sorriso profissional, daqueles que não revelam nada.

— Monalisa, né? Pode sentar-se, querida. É rapidinho.

Monalisa ajeitou o crachá e assentiu.

— Disseram que é sobre uma transferência ...

— Isso mesmo. — A mulher digitava sem olhar pra ela. — A empresa está fazendo alguns ajustes de pessoal. Você vai pra filial da Zona Oeste, cobrir uma ausência no setor de serviços gerais.

Monalisa piscou, surpresa.

— Mas ... por quê? Eu fiz alguma coisa errada? Meu serviço não está bom?

— É algo temporário, tá? Normal, acontece com vários funcionários. — A moça sorria, como se recitasse um texto decorado. — Seu registro já foi atualizado, e seu vale transporte já deve ter caído na sua conta. É só carregar o cartão. E seu turno na filial já começa hoje. Pode ir.

— Temporário ... quanto tempo? — Monalisa insistiu, querendo respostas.

— Isso depende da demanda. — A atendente, já impaciente, respondeu. — Só faz o que estão te mandando, tá?

Monalisa tentou protestar, mas percebeu que não iria adiantar. A mulher já chamava o próximo nome, enquanto lhe entregava um papel com o novo endereço. Saiu da sala com a cabeça fervendo. No ônibus, o barulho da cidade parecia distante e o peso de não entender o que estava acontecendo era o que mais doía.

Monalisa desceu do ônibus desanimada, ainda muito confusa. O novo endereço ficava num bairro industrial, cheio de galpões, fumaça e caminhões entrando e saindo sem parar. O portão da filial era grande, de ferro azul desbotado, com o logotipo da empresa riscado pelo tempo. Ao se apresentar na portaria, um segurança simpático apenas pediu o crachá e a conduziu até o setor de produção. Lá dentro, o som das máquinas era ensurdecedor e o cheiro de óleo e detergente, misturados, fazia arder o nariz.

— Você que é a Monalisa, né? — Perguntou uma mulher robusta, com o cabelo preso num lenço e o rosto suado. — Seja bem-vinda. Eu sou a Cida, a encarregada aqui. Qualquer coisa, fala comigo.

Monalisa sorriu, grata pelo tom amistoso.

— Obrigada. É meu primeiro dia aqui.

— Aqui é mais puxado que no escritório, viu? — Cida avisou, passando-lhe um carrinho de limpeza e indicando o setor ao fundo. — Mas a gente se ajuda.

Monalisa assentiu e respirou fundo. O chão era largo, sujo de graxa e poeira. O barulho das prensas e das empacotadoras fazia o coração bater no mesmo ritmo, pesado e constante.

Enquanto trabalhava, suando sob o uniforme, pensava na antiga rotina: os corredores limpos, o silêncio, as janelas amplas. Ali, tudo era mais bruto. Mas talvez fosse isso o que esperavam dela: que se cansasse, que desaparecesse no meio da multidão. Ainda assim, no meio do barulho e da exaustão, havia algo em seu olhar que resistia. Precisava do dinheiro, não tinha para onde correr ou para quem pedir ajuda.

À noite, o som dos tamborins e o cheiro de cola quente tomavam conta do barracão da escola de samba. O trabalho ali era duro, mas diferente. Tinha riso, música e vida. Monalisa chegou atrasada, o rosto abatido, as mãos ainda manchadas pelos produtos de limpeza.

Maria do Socorro, sua madrinha e coordenadora das costureiras, percebeu de longe.

— Ô minha filha, que cara é essa? — Perguntou, largando as plumas que segurava.

Monalisa tentou disfarçar com um sorriso cansado.

— Nada não, madrinha. Só um dia cheio.

— Cheio e triste, pelo visto. — Socorro limpou as mãos no avental e a puxou pelo braço, levando-a para um canto. — Fala logo. O que houve?

Monalisa suspirou.

— Fui transferida da empresa. Para uma filial lá na Zona Oeste.

— Transferida? Do nada?

— Do nada. Disseram que é só pra cobrir a falta de pessoal, mas ... eu sinto que tem alguma coisa errada, madrinha. — A voz dela falhou. — Eu não fiz nada. Nunca faltei, nunca levei advertência ...

Socorro balançou a cabeça, entendendo mais do que dizia.

— É assim mesmo, filha. Quem depende, precisa, tem que abaixar a cabeça e trabalhar.

— Mas por que comigo? Eu só trabalho ... só tento viver minha vida.

— Justamente. — Socorro a abraçou, firme. — O mundo não perdoa quem tenta subir sem pedir licença. Mas você não vai se abater, ouviu?

Monalisa encostou o rosto no ombro da madrinha, deixando escapar o choro contido.

— Eu não queria sair de lá. Eu estava indo bem ...

— Vai continuar indo, onde quer que te coloquem. — Socorro afastou o rosto dela com as duas mãos e sorriu. — Você tem estrela, menina. Gente como você pode até tropeçar, mas não cai fácil, não.

Do outro lado do galpão, o batuque começou. O ensaio da escola de samba já estava fervendo. Monalisa respirou fundo e sentiu o coração desacelerar. Mesmo sem entender o motivo da transferência, sabia que ali no meio das cores, dos sons e dos abraços, ainda havia um lugar onde ela podia ser apenas ela.

O barracão fervilhava de atividade. Tecidos coloridos pendiam dos varais improvisados, lantejoulas cintilavam sob as lâmpadas fluorescentes e o som distante da bateria marcava o ritmo do trabalho. Monalisa, de lenço na cabeça e avental, ajeitava penas de pavão em um dos adereços quando ouviu a voz grossa e familiar de seu sogro ecoar no corredor.

— Dona Socorro, preciso de uma menina. Tá faltando pessoal no camarote hoje. — Ele surgiu na porta, enxugando o suor da testa com um lenço. — Vinícius tá resolvendo um problema lá fora e esqueceu de me avisar dessa bagunça.

Socorro levantou a cabeça da máquina, sem parar de costurar.

— O que mais tem é mulher preguiçosa por aqui. Escolha qualquer uma.

O homem suspirou, impaciente, até que os olhos se voltaram para Monalisa. O olhar suavizou.

— Você. — Disse, apontando o dedo grosso, mas com gentileza. — Você é perfeita, minha nora. Bonita, simpática, atenciosa …

Monalisa assentiu, jamais diria “não” para aquele homem.

— Me dá uma força lá em cima hoje. — O sogro continuou. — Preciso de alguém bonito, simpático, que saiba falar direito com o povo endinheirado e os convidados. O camarote vai receber uns figurões e a gente não pode fazer feio.

— Mas sogro … — Começou, nervosa, olhando o uniforme manchado de cola quente. — Eu não tô arrumada pra isso, nem ...

— Arruma ela, Socorro. — Interrompeu o homem, já se virando para subir. — Troca essa roupa, bota um shortinho e uma blusinha, passa um batom ... A gorjeta vai ser boa, menina. E quem sabe não vem algum patrocínio novo pro desfile?

Monalisa hesitou, mas não havia muito o que discutir. Dizer não ao sogro era o mesmo que contrariar Vinícius. Negar não terminaria bem para ela.

Socorro suspirou, levantando-se.

— Anda, filha. Vamos dar um jeito nisso.

Poucos minutos depois, Monalisa surgiu renovada. O cabelo solto caía em ondas naturais sobre os ombros, e a roupa simples, porém justa, realçava o corpo belo e elegante. Ela respirou fundo, tentando disfarçar o nervosismo.

— Lembra o que ele disse — Murmurou Socorro, a enfeitando com algumas bijuterias. — Sorria, seja gentil e ... cuidado com os olhos de quem sobe lá pra cima.

Monalisa sorriu, mas sem graça, sem entender o aviso. Quando atravessou o portão lateral, o som da bateria pareceu crescer e, sem saber, ela caminhava direto para o destino que tanto tentava evitar.

{…}

Era sexta-feira à noite, e a cidade respirava um ar leve de fim de semana. Eduardo já estava há meia hora buzinando na porta do prédio quando Fernando finalmente cedeu, vencido pela insistência do amigo.

— Cara, você vai apodrecer aí dentro. — Disse ele, impaciente, enquanto esperava. — Um chope, música e gente nova. É disso que você precisa.

Fernando sorriu sem jeito, ajustando o relógio.

— Eu já encontrei o que queria, lembra? Mas ela evaporou.

— Lá vem você com essa história da Cinderela ...

— Ela existe. — Respondeu Fernando, convicto. — Eu só não sei quem é.

Eduardo revirou os olhos, mas não insistiu.

O barzinho era desses lugares da moda, cheio de gente bonita, risadas e luzes amareladas que disfarçavam a melancolia de qualquer um. Fernando tentou se adaptar ao clima, mas, mesmo com um copo de chope nas mãos e o som animado do funk tocando, o pensamento sempre voltava para o baile da empresa, para o leve perfume e o olhar tímido da mulher mascarada.

Logo, algumas conhecidas de Eduardo se juntaram à mesa. Eram alegres, tagarelas, cheias de histórias e planos para a noite. Uma delas, de vestido preto, grudou em Fernando imediatamente. Ele era educado, mantinha a conversa viva, mas seu pensamento estava longe dali.

— A garota só falta esfregar a buceta na sua cara. Vai ficar de frescura ou partir logo para o abate? — Eduardo falou, baixo, apenas para Fernando escutar.

— Não tô no clima. Ela é direta demais. — Fernando respondeu.

Eduardo se irritou.

— Porra, irmão. Tu tá apaixonado, não castrado. Sabe-se lá o que tua Cinderela tá fazendo numa sexta-feira à noite. Deixa de ser trouxa, passa o rodo, alivia o stress e depois corre atrás da sua Cinderela imaginária, caralho.

Eduardo foi puxado por outra garota e se afastou, irritado com a morosidade do amigo. A garota, Júlia, não perdeu tempo, partindo para o ataque ainda mais direto.

— Nós vamos dançar ou apenas ficar aqui nos encarando?

Fernando respirou fundo, se lembrou das palavras do amigo e se levantou decidido.

— Vamos!

Julia sorriu, satisfeita por finalmente quebrar sua resistência.

Os dois se uniram a Eduardo e a outra garota na pista de dança, ao som do funk carioca que animava a noite.

Após se render, trocar beijos e carícias mais ousadas com Júlia, Fernando foi arrastado, por ela, para o banheiro. Ela sabia muito bem o que queria e já o empurrou para dentro, prensando-o contra a parede.

— Me fode. Aqui, agora. Eu tô num tesão louco por você.

A batida pulsante do funk era um martelo contra a cabeça de Fernando, mas ali, trancado na cabine de acessibilidade do banheiro do bar, o som era apenas um zumbido abafado, um eco distante de outra realidade. A única realidade agora era o gemido abafado da garota contra seu ouvido e o cheiro adocicado do perfume misturado ao mofo úmido do ambiente.

O banheiro era espaçoso, sim, mas não o suficiente para abafar o rugido do próprio sangue em suas veias. Ele a empurrou contra a porta, as mãos agarrando suas coxas, levantando-a. O vestido curto subiu, revelando a cinta-liga que ele descobrira minutos antes. Seus dedos afundaram na carne macia de suas nádegas, e ela gemeu, enterrando o rosto em seu pescoço.

— Assim, Fernando … assim … — Ela gemeu alto, ofegante, as palavras saindo entrecortadas.

Ele a penetrou de uma vez. O corpo dela era quente e a buceta pulsava de prazer, se ajustando perfeitamente ao redor do pau. Mas enquanto seu quadril estocava num ritmo acelerado e suado, sua mente vagava: Não era ela ali.

Os olhos dele se fecharam. Em vez do cabelo loiro de Julia, ele viu ondas castanhas escuras. Em vez dos pequenos brincos de argola, ele viu um brinco delicado de pedra brilhante piscando sob a luz fraca. Em vez do rosto contorcido de prazer de Julia, ele viu aquele sorriso misterioso, enigmático, parcialmente escondido por uma máscara prateada. A mulher mascarada. A do baile. Aquela que ele nem sabia o nome, mas que não saía da sua cabeça desde o momento em que seus olhos se encontraram no meio da pista.

— Você tá me fodendo do jeito que eu gosto … forte … — Júlia arfou, suas unhas cravando nas costas dele através da camisa.

Fernando abriu os olhos por um instante, vendo o rosto dela, mas não enxergando. Ele murmurou um “é?” rouco, quase inaudível, e enterrou o rosto no pescoço dela, mas cheirou jasmim, não o aroma amadeirado que a mulher mascarada tinha.

A fantasia era mais poderosa que a realidade. A possibilidade dela, mais excitante que a carne da mulher em seus braços. Cada movimento de seus quadris, cada solavanco que fazia a porta tremer em sua moldura, era para ela. Para a desconhecida.

Ele imaginou suas mãos, não nas costas de Júlia, mas nas curvas daquela mulher. Imaginou sua boca, não no pescoço suado de Júlia, mas naquela pele canela brilhante, beijando do ombro até a nuca, até a orelha …

— Se vira pra mim! — Ele ordenou, a voz mais áspera do que pretendia.

Júlia obedeceu, ofegante, apoiando as mãos na porta. A nova posição foi mais profunda, e ela soltou um grunhido de surpresa e prazer.

— Ah, caralho … bem aí … assim …

Fernando puxou o vestido dela para baixo, expondo suas costas e se curvou sobre ela, seu corpo cobrindo o dela. Ele a possuía com uma ferocidade que a fez gemer mais alto, cada impacto vibrando contra a porta.

— Mete, seu safado … fode essa buceta …

Mas em sua mente, era a mascarada que estava gemendo. Era ela que arqueava as costas para ele, era ela que balbuciava seu nome em um sussurro rouco de desejo.

— Fode essa buceta, Fernando … mais forte … Ahhhhh …

A imagem era tão vívida, tão real, que uma onda de calor violento percorreu seu corpo. O suor escorria por suas têmporas. Sua respiração cada vez mais rápida.

— Caralho, Fernando… você tá acabando comigo … Ahhhh … — Júlia gemeu, sua voz tremendo com cada estocada mais profunda.

Ele não respondeu. Suas mãos agarravam os quadris dela, puxando-a para encontrar cada uma de suas investidas com uma força quase brutal. A pele dela sob as palmas de suas mãos era suave, mas ele sentia o cetim imaginário do vestido da outra. O ar pesado do banheiro cheirava a cerveja derramada e desinfetante barato, mas ele inalou profundamente, procurando por um vestígio de um perfume que não estava lá.

O desejo era alucinógeno. Um monstro crescendo em suas entranhas, alimentado por um fantasma. Ele queria ouvir ela gritar. Queria sentir ela contra ele. Queria arrancar aquela máscara com os dentes e descobrir o rosto por trás do mistério.

— Não para … por favor, não para … — Júlia suplicou, sua voz uma mistura de prazer e desespero.

Seus dedos se contraíram nas curvas de Julia. Ele cambaleou, seus joelhos quase cedendo. O mundo se estreitou para aquele ponto de fricção úmida e quente, para a visão na sua mente que era mais clara que a mulher à sua frente. O rugido na sua cabeça abafou tudo: a música, os gemidos de Júlia, o rangido da porta … Em sua mente, só havia ela. A Cinderela mascarada gemendo.

Ele soltou um rosnado, um som gutural e animal que nem parecia vir dele.

— Ahhhhhh …

Empurrou uma última vez, fundo, tão fundo que sentiu o baque do corpo de Julia contra a porta. O orgasmo o atingiu como um trem desgovernado, um clarão branco e silencioso que apagou tudo, até a imagem da mulher mascarada, substituindo-a por uma pura e cega sensação física que o fez tremer da cabeça aos pés, suas pernas ficando fracas.

— Caralho, garota … o que foi isso? — Ele tentou se recompor, vendo que tinha gozado de forma egoísta, esquecendo de sua parceira.

Ele desabou sobre as costas dela, ofegante, o suor escorrendo de seu rosto no dela. O coração batia descontroladamente em seu peito, como se tentasse escapar.

— Caralho digo, eu … Nunca gozei tão forte … — Ela só se mantinha em pé por causa do corpo dele, a prensando contra a porta.

Por um longo momento, o único som foi a respiração ofegante dos dois, misturada ao baque surdo da música.

Fernando se afastou, se apoiando na parede oposta, puxando as calças para cima com as mãos trêmulas. Julia escorregou pela porta, virando-se e encostando nela, as pernas visivelmente fracas, um sorriso tonto e exausto em seu rosto.

— Nossa, Fernando … O Edu não mentiu … — Júlia disse, arrumando o vestido com movimentos lentos e preguiçosos. — Parecia que você tava possuído. Foi delicioso.

Fernando passou a mão pelo rosto, tentando recuperar o fôlego, tentando voltar à realidade. Ele olhou para ela, para o rosto bonito e satisfeito de Julia e sentiu uma pontada de culpa. Mas era fraca, ofuscada pelo eco latejante do prazer e pela imagem teimosa que já começava a se formar novamente em sua mente e forçou um sorriso.

Os dois voltaram para perto dos amigos. Júlia sorria de orelha a orelha

— Você tá com uma cara de quem perdeu o bloco! Eu te conheço. — Brincou Eduardo. — Acabou de transar, mas parece que voltou de um velório.

A garota que estava com Eduardo anunciou:

— A gente tá indo pro ensaio da escola de samba lá na comunidade. Hoje tem bateria completa e até feijoada!

— Ah não, fala sério … — Protestou Fernando, rindo sem vontade — Escola de Samba, agora?

— Vamos, cara! É perto daqui. A gente assiste um pouco, come alguma coisa … — insistiu Eduardo, já empolgado. E completou, apenas para Fernando ouvir. — Quem sabe você não encontra sua Cinderela por lá?

As meninas, animadas, já discutiam planos, mas Fernando ficou um instante em silêncio, olhando o copo vazio. A música do bar parecia distante.

— Tá bom. — Disse, levantando-se com um meio sorriso. — Vamos ver se o destino tem mesmo senso de humor.

E, entre risadas e o barulho das taças, saíram todos do bar, sem imaginar que, naquela noite, o destino também tinha seus planos.

{…}

A bateria fazia o chão da quadra vibrar como se tivesse coração próprio. O ensaio da escola de samba fervia em cores, suor e alegria. Eduardo abriu um largo sorriso ao ver a multidão entrando na quadra e bateu palmas, empolgado.

— Agora sim, parceiro! É disso que eu tô falando!

Fernando, porém, desceu do carro com a mesma calma de quem estava indo a uma reunião de negócios. A roupa básica, camiseta escura, destoava das camisetas coloridas e das latas de cerveja nas mãos do povo. Ainda assim, sua presença não passou despercebida. Assim que o segurança o reconheceu, abriu o portão com presteza.

— Boa noite, doutor Fernando! O pessoal vai ficar feliz de ver o senhor por aqui. Faz tempo, hein?

— Doutor? Corta essa. Doutor é meu pai. Só Fernando, por favor. — Respondeu, esboçando um sorriso contido.

Ele se virou para Eduardo.

— Você disse que a gente estava vindo? Se adiantou?

O amigo, sorridente, respondeu.

— Lógico! O sobrenome Krüger abre qualquer porta nessa cidade.

A notícia de que o herdeiro dos Krüger estava na quadra correu mais rápido do que o som da bateria. Em poucos minutos, diretores, passistas e até o mestre-sala o cercaram, cumprimentando-o com respeito e entusiasmo.

— A casa é sua, fique à vontade! Quer subir pro camarote? Tem um lugar reservado pro senhor e seus amigos.

Eduardo piscou para as garotas, animado:

— Ouviu, estamos com o “príncipe encantado”. Somos celebridades.

Fernando riu sem graça, balançando a cabeça, mas aceitou o convite. Subiram juntos, acompanhados por um funcionário da escola. Lá de cima, o camarote VIP parecia um pequeno oásis de luxo: sofás de couro, luzes mais brandas, belas garçonetes servindo espumante, e um grupo de convidados que misturava empresários, celebridades e atletas.

O samba pulsava na quadra e o contraste entre o luxo do camarote e a paixão popular do ensaio era gritante. Eduardo já se enturmou com as garotas, brindando e rindo alto, enquanto Fernando se encostava na balaustrada, observando o mar de gente sambando ao ritmo contagiante da bateria.

Ele não sabia por que, mas sentia um aperto no peito. Algo ali parecia familiar, como se uma energia invisível o puxasse para o meio daquela multidão mascarada pelo brilho do carnaval. Mal sabia ele que, a alguns metros, a mulher que o assombrava desde o baile estava prestes a entrar em cena novamente.

As luzes coloridas piscavam ao ritmo do samba, refletindo nas taças de espumante e no suor dos foliões que lotaram a quadra. O camarote fervilhava de risadas, música e perfume caro misturado com o cheiro doce da caipirinha. Eduardo já parecia em casa. Novas acompanhantes apareceram, trazidas por Eduardo e uma das garotas, de shorts brilhante e top dourado, o puxava para dançar e, em poucos minutos, eles já se beijavam encostados no corrimão, rindo entre um passo e outro.

— Viu só, parceiro? — Gritou ele, ofegante, apontando para Fernando. — Enquanto a sua Cinderela não aparece, aproveita, não perde tempo! Um pouco de diversão casual não mata ninguém!

Fernando ergueu o copo com um sorriso breve, mas o olhar distante.

— Não é questão de tempo, Edu. É questão de vontade. E eu tô sem nenhuma agora. Já me diverti hoje, já deu.

As garotas, inclusive as novas que se juntaram, Júlia entre elas, aproveitaram o momento para se aproximar. Uma delas, já conhecida Fernando, morena de cabelos longos, tocou de leve o braço dele, fingindo comentar o ensaio lá embaixo.

— Você devia relaxar, Fernando. O ensaio tá lindo e você tá com essa cara de quem tá num velório.

Já outra, de olhos verdes, riu, inclinando-se o suficiente para que o perfume dela o envolvesse.

— Ou será que tá esperando alguém? Uma “princesa” talvez?

Fernando a encarou, e ela insistiu:

— Princesa … Príncipe Encantado … pegou a referência?

Fernando manteve o sorriso educado, mas desviou o olhar.

— Nada disso. Só tô apreciando o samba. Às vezes, é bom observar sem ser parte da cena.

Eduardo gargalhou.

— Observando, né? Isso é o que o povo chama de “modo viúvo”! — Brincou, arrancando risadas das garotas.

Fernando balançou a cabeça, divertido, mas o olhar se perdeu na multidão. Foi então que algo mudou no ar. Um perfume leve, uma mistura de jasmim e sabonete barato, o atravessou de repente, trazendo uma lembrança confusa.

Monalisa passou bem ao lado da mesa, equilibrando com cuidado um baldinho prateado cheio de latas de cerveja gelada. O brilho do alumínio refletiu na luz colorida, iluminando por um instante o rosto dela, ainda mais bonito sob o calor da quadra. Ela deixou o baldinho sobre a mesa, agradeceu e se afastou, sem olhar diretamente para Fernando.

Ele, por sua vez, virou o rosto instintivamente, como se tentasse captar algo que lhe escapava. O som da bateria, os risos, as vozes … tudo pareceu se afastar por alguns segundos.

— Você tá bem, cara? — Perguntou Eduardo, entre um gole e outro.

Fernando piscou, voltando ao presente.

— Tô. É que … por um segundo, achei que reconhecia um perfume.

Eduardo ergueu o copo e riu:

— Aí está, o príncipe encantado farejando a Cinderela! Relaxa, Fernando. Aquele baile acabou. O mundo real não tem espaço para contos de fada.

Fernando apenas sorriu, sem responder. Mas dentro dele, algo dizia o contrário.

Fernando segurava o copo, distraído, enquanto o olhar passeava pelo camarote. Por um instante, o perfume passou novamente, doce e leve, e ele sentiu o coração apertar de uma forma estranha. Instintivamente, suas mãos tocaram o colar que carregava no peito, o cordão prateado com a aliança da mãe de Monalisa. Um gesto automático, quase inconsciente, mas suficiente para despertar lembranças confusas, como se algo familiar estivesse perto.

— Cara, você tá todo esquisito … — Disse Eduardo, percebendo a mudança de expressão do amigo. — O que tá pegando?

Fernando apenas balançou a cabeça, sem conseguir falar. Seu olhar seguia Monalisa, que agora se aproximava discretamente com outro baldinho de cervejas, mas para a mesa do lado.

Ela cruzou por ele rapidamente, o suficiente para perceber que Fernando a observava. Um sorriso tímido escapou, quase imperceptível. Mas ela sabia: mundos diferentes, vidas separadas. Ela não podia se permitir prolongar aquele instante. Ele se perdeu naquele sorriso tímido, magnético, familiar, mas quando Monalisa se afastou, já buscando se misturar à multidão, um som ríspido a parou no meio do passo:

— O que você tá fazendo aqui?

Era Vinícius. O namorado, o filho do dono do morro, os olhos brilhando de ciúmes contido, a presença intimidadora, mesmo sem tocar nela. Ele a olhava de cima a baixo, com o olhar vidrado no short curto e no top que deixava sua barriga de fora.

Monalisa engoliu seco, o coração disparado.

— Eu … eu só … estava servindo as bebidas … — Respondeu, tentando se acalmar, mas o medo fez sua voz sair trêmula.

Fernando, do outro lado, ergueu a sobrancelha, confuso e preocupado. Eduardo percebeu o clima e cochichou, mais para ele mesmo do que para o amigo:

— Ué … tá vendo? Isso que eu falei … o mundo real é sempre mais complicado que qualquer conto de fadas.

Vinícius estreitou os olhos, percebendo o desconforto dela e deu um passo mais próximo, sua mão já apertava o braço de Monalisa, a voz baixa, controlada, mas ameaçadora:

— Melhor você me explicar direitinho o que tá acontecendo.

Eduardo percebeu que Fernando deu um passo à frente e, sem hesitar, segurou o amigo pelo pulso.

— Cara, não se mete nisso. Aquele cara é perigoso, filho do bicheiro, dono desse morro.

O samba ecoava forte no salão, a bateria estava quente, furiosa, mas no camarote o ar estava denso, eletrizado. Vinícius segurava o braço de Monalisa com força, ignorando os olhares em volta. O gesto, mais que ciúme, era posse.

Ela tentou se soltar, a voz trêmula:

— Vini … por favor, tá todo mundo olhando.

Fernando observava, imóvel por um instante. Vinícius, contra a vontade de Monalisa, puxou a namorada com força, a arrastando dali.

Eduardo murmurou ao seu lado:

— Não se mete, cara …

Mas já era tarde. O corpo dele se moveu antes que a razão o alcançasse. Num passo firme, Fernando agarrou o punho de Vinícius, forçando-o a soltá-la.

— Solta ela. Agora.

O tom de voz fez o burburinho diminuir. A música parecia distante, abafada.

Vinícius virou-se devagar, o olhar faiscando de ódio.

— Tu tá maluco, playboy? Aqui, quem manda é o meu pai, não o seu. Isso é assunto meu.

— Não quando você põe a mão nela desse jeito. — Respondeu Fernando, o rosto impassível, mas os olhos duros.

Eduardo se colocou rápido entre os dois, tentando impedir o pior.

— Gente, calma. Calma. Não é lugar pra isso.

— Sai da frente, mauricinho! — rugiu Vinícius, empurrando-o com força. — Ninguém fala comigo desse jeito no meu morro!

Monalisa, desesperada, tentou intervir:

— Vini, para! Foi o seu pai quem mandou eu subir pra ajudar aqui! Eu não escolhi, ele mandou!

Mas o rapaz não escutava mais nada. O sangue fervia, o orgulho queimava. Deu um passo brusco e partiu pra cima de Fernando.

O movimento foi rápido, um golpe cego, mais raiva do que técnica. Fernando desviou, agarrou o braço do agressor e, com um giro firme, usou o próprio impulso dele contra si. Em segundos, Vinícius estava no chão, o rosto colado ao piso, o braço torcido num controle perfeito.

Os gritos ecoaram.

— Calma! Calma, gente! — Eduardo tentou conter o tumulto, olhando em volta.

Vinícius se debatia, furioso, cuspindo ameaças:

— Me solta, desgraçado! Tu não sabe com quem tá mexendo!

— Sei exatamente. — Respondeu Fernando, sem elevar a voz. — Um covarde que acha que amor é coleira. Que relação é posse.

Ele manteve o controle até sentir que o outro não tinha mais força para reagir. Então o soltou, dando um passo atrás.

Vinícius se levantou cambaleante, o olhar misto de ódio e humilhação.

— Tu vai pagar por isso, playboy. — Rosnou, o dedo em riste. — Aqui, ninguém mexe comigo e sai impune.

Monalisa, trêmula, tentava acalmar a situação:

— Vini, por favor … vamos embora.

Ele a fitou com desprezo, cuspindo as palavras:

— Depois a gente se acerta. — E saiu empurrando quem estivesse no caminho, sob olhares de reprovação e cochichos.

O silêncio ficou pesado por alguns segundos. Eduardo olhou para o amigo, meio pasmo:

— Cara … você acabou de arrumar um problema do tamanho do Rio de Janeiro.

Fernando respirou fundo, o coração acelerado, mas a consciência limpa. Seus olhos se voltaram para Monalisa, que ainda o encarava. Assustada, confusa, grata e apavorada ao mesmo tempo.

Ela tentou dizer algo, mas a voz falhou. Apenas baixou os olhos e saiu rápido, seguindo o caminho do namorado e, ao se virar, algo brilhou no chão, bem diante de seus pés. Um colar — o mesmo cordão que ela usava, contendo a aliança da mãe.

Ela se abaixou, com as mãos ainda trêmulas e o recolheu do chão. Por um instante, o tempo pareceu parar. O samba, as vozes, tudo ficou distante. Ao erguer o olhar, encontrou Fernando, parado a poucos metros, o olhar fixo nela, surpreso, emocionado. Ele reconheceu a joia e, junto dela, o perfume, o olhar, o gesto delicado. Levou a mão ao peito, procurando, mas sabia que ele não poderia estar ali.

A dúvida que o atormentava desde o baile se desfez como neblina. Ela era a mulher mascarada. Sua Cinderela. Mesmo que ainda não soubesse seu nome, agora conhecia seu rosto.

Monalisa prendeu o colar contra o peito, sem dizer nada. Apenas sustentou o olhar de Fernando por um breve segundo e, com um adeus silencioso, se virou e desapareceu entre a multidão do camarote.

Fernando permaneceu ali, imóvel, com o coração acelerado. Agora ele sabia quem ela era. E, mais importante, conhecia seu rosto.

Continua …

É PROIBIDO CÓPIA, REPRODUÇÃO OU QUALQUER USO DESTE CONTO SEM AUTORIZAÇÃO – DIREITOS RESERVADOS – PROIBIDA A REPRODUÇÃO EM OUTROS BLOGS OU SITES. PUBLICAÇÃO EXCLUSIVA NA CASA DOS CONTOS ERÓTICOS.

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 21 estrelas.
Incentive Ménage Literário a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.
Foto de perfil de Ménage LiterárioMénage LiterárioContos: 83Seguidores: 349Seguindo: 37Mensagem Três autoras apaixonadas por literatura erótica. Duas liberais, e uma mente aberta, que adora ver o parquinho pegando fogo.

Comentários

Foto de perfil de Sensatez

Fernando e Monalisa terão que passar por muitos obstáculos se realmente vão querer ficar juntos, prevejo uma guerra de poder complicada.

0 0