Capítulo XXVII - Mais perto do que nunca!
Caio narrando...
A madrugada tinha um silêncio estranho, sufocante. O som dos monitores na UTI se tornava quase insuportável, cada apito parecia uma martelada no meu peito. Um lembrete cruel de que Rafa estava ali, vivo, mas ainda entre a dor e a incerteza. O médico tinha dito que eu podia ficar só um pouco, mas como sair? Como abandonar o homem que é tudo o que eu tenho, deitado, frágil, depois de tudo que passou? Eu não conseguia. Eu não queria.
Aproximei a cadeira e fiquei observando cada detalhe dele. Os fios de cabelo bagunçados contra o travesseiro, o rosto mais magro, mas ainda lindo, os lábios ressecados que eu tanto conhecia, o peito subindo e descendo num ritmo que parecia testar minha fé a cada segundo. A sensação era de que se eu desviasse o olhar por um instante, a vida poderia fugir dele.
As lágrimas começaram a cair sem que eu percebesse outra vez. Peguei meu caderno azul, aquele que guardava rabiscos de sentimentos de Rafa, que nunca tive coragem de mostrar a ninguém, pois eram íntimos demais, acho que só Miguel chegou a ter contato com eles. Comecei a escrever, cada palavra era um grito preso na garganta.
"Rafa, amor da minha vida… eu tenho tanto medo. Medo de te perder para essa dor que já te feriu tanto, medo de te perder para alguém que talvez te ame mais do que eu. O ciúme sempre me corroeu porque você é incrível demais, e eu sempre me perguntei se eu seria suficiente. Mas mesmo assim, você ficou. Mesmo assim, me escolheu. Você me perdoou quando eu não merecia, me amou quando eu só ofereci insegurança. Se você me der mais uma chance, prometo nunca mais deixar nada, nem ninguém, colocar dúvidas entre nós. Eu só quero uma coisa: viver a vida inteira ao seu lado."
Fechei o caderno com as mãos trêmulas, as lágrimas molhando a capa já gasta. Apertei os dedos dele com cuidado e sussurrei:
— Desculpa, Rafa… eu fui tão idiota. Eu tive tanto medo de perder você que quase te afastei de mim. Mas eu te amo. Te amo mais do que tudo. Eu não sei, não posso imaginar a minha vida sem você.
De repente, senti os dedos dele se moverem. Foi tão leve que achei que tinha imaginado. Olhei rápido e vi seus olhos se abrindo devagar. Aquele olhar cansado, mas intenso, me atingiu como um raio.
— Você… acha mesmo que eu trocaria você por alguém, Caio? — a voz dele saiu fraca, rouca, mas firme como sempre.
Meu coração disparou.
— Rafa… meu Deus! Você acordou… Eu não queria que você ouvisse, mas é o que eu sinto. É tudo o que eu sinto.
Ele esboçou um sorriso pequeno, mas cheio de força.
— Eu ouvi tudo. E agora você vai ouvir também. Nunca existiu outro alguém. Desde que você entrou na minha vida, só existiu você. Nem por um segundo eu pensei em te deixar. Nem quando brigamos, nem quando você foi duro comigo. Porque meu coração já era seu. Sempre foi, sempre vai ser você.
As lágrimas escorriam sem controle.
— Rafa… eu não mereço esse amor todo. Depois de tudo, eu não mereço…
Ele apertou minha mão com a pouca força que tinha, mas foi o suficiente para me calar.
— Você merece. Sempre mereceu. Só não consegue enxergar. Mas eu vou te mostrar, agora.
Ele respirou fundo e ergueu a mão que segurava a minha.
— Olha pra minha mão, Caio. Vê o que tem aqui.
Foi então que percebi. A aliança já estava ali, brilhando sob a luz fraca da UTI. Sempre esteve. O símbolo de tudo o que éramos.
Meu coração quase parou.
— Rafa… isso é…?
Ele sorriu, mesmo cansado.
— É, Caio. Eu não queria esperar mais. Eu quero passar o resto da minha vida com você. Quero acordar e saber que você tá ao meu lado. Quero dividir cada riso, cada lágrima, cada medo. Então… aceita casar comigo?
Levei as mãos ao rosto, sem conseguir conter o choro.
— Rafa… meu amor… é claro que sim! Claro que eu aceito! Eu aceito mil vezes, quantas você quiser!
Segurei a mão dele contra o meu peito, como se assim pudesse protegê-lo do mundo.
— Eu prometo que vou honrar isso. Eu prometo que nunca mais vou duvidar, nunca mais vou deixar o medo falar mais alto. Eu vou ser o homem que você merece. Eu vou te amar até o último dia da minha vida.
Ele fechou os olhos por um instante, respirou fundo e deixou uma lágrima escorrer pelo rosto.
— Eu já sabia que você ia dizer sim… mas ouvir isso da sua boca… Amor, é o melhor presente que eu poderia ter.
Aproximei meu rosto, beijei sua mão e deixei que minhas lágrimas se misturassem as dele.
— Você me deu uma nova vida, Rafa. Agora eu vou te dar a minha inteira.
Ele sorriu, mesmo fraco, e respondeu com voz baixa, mas firme:
— Então estamos quites, porque eu também sou só seu. E nada, Caio, nada vai nos separar.
Naquele instante, entre fios, monitores e cicatrizes, nasceu algo maior que um pedido de casamento. Era uma promessa de eternidade.
Algumas horas depois...
As luzes da UTI eram frias e constantes. Mas naquele instante, depois do “sim” que dei para o Rafa, parecia que até elas tinham ficado mais suaves. Ele adormeceu logo depois do pedido, a mão ainda segurando a minha, e eu fiquei ali, olhando para ele como se quisesse guardar cada traço dele em mim.
O peito dele subia e descia devagar, os fios dos monitores continuavam apitando, lembrando que ainda havia um caminho longo pela frente. Mas naquele momento, eu já não tinha mais medo do tempo. Eu tinha esperança. E isso já era mais do que eu imaginava ter dias atrás.
Passei os dedos pelo cabelo dele, com cuidado para não incomodá-lo, e senti as lágrimas caindo sem pressa de novo, Rafa me desarmava e eu chorava, porque depois disso tudo, eu queria sorrir e ser feliz ao seu lado. Elas não eram só de dor — eram de alívio, de amor, de uma gratidão tão grande que nem cabia em palavras. Eu nunca tinha imaginado viver um momento assim.
Puxei minha mochila para perto e tirei dela outro caderno. Não o azul, mas um marrom, onde eu guardava anotações soltas, rabiscos que nunca terminei. Abri em uma página em branco e comecei a escrever. A caneta parecia mais pesada que o normal, como se cada palavra saísse arrastando um pedaço do meu coração.
"Rafa… eu tô escrevendo de novo porque não sei como colocar isso só na voz. Eu tô aqui, do seu lado, vendo você dormir, depois de ter sido tão forte, depois de ter sobrevivido a tudo. Eu ainda não acredito que você me pediu em casamento, mesmo depois de tudo que eu fiz, de tudo que eu disse. Eu me sinto tão pequeno perto do tamanho do seu amor…"
As lágrimas caíram sobre a página, borrando as primeiras letras. Eu respirei fundo, tentei continuar.
"Eu passei tanto tempo com medo. Medo de perder você para outra pessoa, medo de não ser suficiente. Medo de não estar à altura. E esse medo me fez dizer coisas que nunca deveria ter dito. Mas agora, vendo você aqui, eu entendo que esse medo não importa. O que importa é que a gente se escolheu. Que mesmo machucados, a gente se encontra. E eu quero, Rafa, eu quero passar cada dia do resto da minha vida te lembrando que eu nunca mais vou duvidar do que a gente tem."
Fechei o caderno devagar, respirando fundo. A madrugada já ia cedendo lugar ao amanhecer. Pela pequena janela da UTI, um fio tímido de luz laranja começou a entrar, tingindo o quarto de uma cor quase sagrada.
Olhei para Rafa e sussurrei, mesmo sabendo que ele dormia:
— Eu te amo tanto, Rafa… eu não vou te perder de novo. Nunca mais.
Nesse momento, os dedos dele se mexeram de novo. Eu segurei com mais força.
— Eu tô aqui, amor… eu tô aqui.
Ele abriu os olhos devagar. A voz saiu baixa, quase um sopro:
— Eu ouvi você escrevendo… mesmo sem entender as palavras… eu senti.
Meu coração apertou.
— Você ouviu?
Ele esboçou um sorriso fraco, mas cheio de luz.
— Senti tudo. E eu quero que você saiba, Caio… eu não preciso que você seja perfeito. Eu só preciso que você esteja aqui. E você está.
As lágrimas voltaram. Eu passei a mão no rosto, tentando respirar.
— Rafa… eu passei tanto tempo com medo de perder você que quase te perdi. Eu não sei se consigo me perdoar.
Ele levou a mão trêmula ao meu rosto, encostando nos meus lábios com um toque leve.
— Eu já te perdoei há muito tempo. O que aconteceu não importa mais. O que importa é agora. É o nosso sim. É a vida que a gente vai construir.
Eu desabei, encostando a testa na dele.
— Eu te amo. Eu te amo tanto. Eu nunca mais vou te fazer duvidar disso.
Ele sorriu, com os olhos brilhando.
— Então casa comigo, Caio. Casa comigo e me mostra todos os dias esse amor.
Eu segurei o rosto dele com as duas mãos.
— Eu vou casar com você, Rafa. Eu vou te amar todos os dias, em cada detalhe. Eu vou ser tudo que você precisa.
Ele respirou fundo, fechou os olhos e sussurrou:
— Então já somos marido e marido, aqui, agora, mesmo antes do papel. Porque meu coração já é teu.
O sol começou a entrar mais forte pela janela. Eu fiquei ali, segurando ele, deixando que a luz do amanhecer nos cobrisse como um testemunho silencioso do que estávamos vivendo.
Não era só um pedido de casamento. Era uma promessa de renascimento.
Rafa narrando...
Eu ainda estava deitado, a respiração um pouco pesada, mas os olhos já abertos, quando ouvi a porta se abrir devagar. Pensei que fosse Caio voltando, mas era Miguel. Ele entrou com aquele jeito meio desajeitado de quem não sabia se deveria estar ali.
— Posso... entrar? — perguntou, quase em sussurro, com o corpo parado na porta.
Sorri fraco, levantando um pouco a mão.
— Claro que pode. Não precisa pedir, Miguel. Você já faz parte disso aqui.
Ele fechou a porta devagar, como se tivesse medo de fazer barulho, e puxou uma cadeira. Se aproximou, mas hesitou antes de sentar. O olhar dele parecia pesado, como se carregasse um fardo que não conseguia soltar.
— Rafa... eu quase achei que você não ia voltar, cara. — A voz dele tremeu, embargando. — Naquele dia, vendo você naquele hospital quando tomou o tiro foi desesperador. Eu fiquei com tanto medo... medo de te perder, medo de ver o Caio desmoronar. E quando fiquei sabendo que sumiu do mapa, nem consigo dizer como me senti. Sério, eu nunca tinha visto alguém sofrer como Caio sofreu nos últimos dias. Ele gritava teu nome como se estivesse tentando segurar sua alma com as próprias mãos.
Respirei fundo, emocionado, e encostei a cabeça no travesseiro.
— Eu consigo imaginar. E eu sei que você esteve lá e está aqui agora, quando tudo isso começou. Eu sei de tudo, Miguel. Sei que você doou sangue pra mim naquela noite. E sei que ajudou a me procurar também. Você fez muito, muito mais do que qualquer outra pessoa faria. Caio me contou. Mas, mesmo antes dele falar, eu sentia... como se tivesse uma parte de você correndo dentro de mim.
Ele abaixou a cabeça, tentando disfarçar as lágrimas que já escorriam.
— Eu só... eu só fiz o que precisava ser feito. Eu não podia deixar você ir embora. Não podia deixar o Caio sozinho.
— Não diminui o que você fez. — Apertei a mão dele, mesmo fraco. — Muita gente teria virado as costas. Mas você ficou. Você correu, você segurou o Caio, você deu o que tinha dentro de você pra me manter vivo. Isso não é pouca coisa, Miguel. Isso é grande. Você não imagina o quanto sou grato. Eu te amo, meu amigo! Tu é muito especial para mim.
Ele respirou fundo, mas a voz saiu embargada.
— Eu nunca pensei que ia me importar tanto, sabe? Eu conheci você há pouco tempo, mas... de alguma forma, parece que já é uma vida inteira. E quando eu vi o Caio, destruído, chorando... eu pensei: "Eu preciso ser forte por eles". Eu nem sei de onde tirei força, mas eu não podia fraquejar. Tu é muito especial também!
Dei um meio sorriso, ainda com lágrimas nos olhos.
— E foi exatamente essa força que salvou a gente. Você cuidou do Caio, cuidou da minha mãe quando ela não conseguia nem respirar de tanto chorar. Você virou meu irmão, Miguel. Um irmão de alma.
Ele ergueu os olhos, surpreso.
— Irmão?
— Sim. Porque laços de sangue são importantes, mas os laços que a gente escolhe são ainda maiores. E é por isso que eu quero te pedir uma coisa.
Ele se inclinou para frente, com o coração acelerado.
— O quê?
— Quero que você seja nosso padrinho de casamento. Meu e do Caio.
O silêncio que se seguiu foi cheio de peso. Miguel arregalou os olhos, deixou escapar um riso nervoso e depois cobriu o rosto com as mãos.
— Você tá falando sério? Eu? Padrinho de vocês?
— Claro que sim. — Sorri, mesmo fraco. — Você acha que eu ia deixar de fora a pessoa que literalmente me ajudou a voltar pra vida? Padrinho não é só alguém que segura a aliança. É alguém que tá junto em cada batalha, em cada vitória. E você já provou que é essa pessoa.
Ele balançou a cabeça, emocionado.
— Rafa, eu não sei nem como reagir... Eu nunca imaginei que seria tão importante assim pra alguém. Eu sempre fui aquele cara que fica de lado, sabe? O que ajuda, mas nunca é lembrado. E agora você... você me coloca nesse lugar?
— Porque você merece. Porque você já é parte disso, mesmo sem perceber. Você entrou na nossa história pra ficar.
As lágrimas escorreram dos olhos dele de novo. Ele riu, limpando com o dorso da mão.
— Eu aceito. Aceito de coração aberto. Mas só com uma condição.
— Qual? — perguntei, curioso.
— Que você nunca mais me faça passar por um susto desses. Porque, olha, eu juro que quase morri do coração naquele hospital.
Rimos juntos. A risada foi leve, sincera, quebrando um pouco o peso da emoção que pairava.
— Prometo tentar, Miguel. — falei, ainda rindo. — Mas, sendo eu, você já sabe... nada é tão simples assim.
Ele balançou a cabeça, rindo junto, e depois ficou sério de novo.
— Rafa... eu tô honrado de verdade. Eu vou estar lá, no altar, com vocês dois. E vou ser o padrinho mais orgulhoso do mundo. Você pode ter certeza disso.
— E eu vou estar ali, olhando pra você, e agradecendo a Deus por ter colocado você no nosso caminho.
Miguel se levantou devagar, se inclinou e me abraçou com cuidado, desviando dos fios e aparelhos. Apertou firme, como quem não queria soltar.
— Você merece ser feliz, Rafa. E eu vou estar do seu lado, sempre. Do seu e do Caio.
— E eu vou estar do seu lado também. Porque amizade verdadeira não tem volta. A gente só segue junto.
Ele sorriu, com os olhos vermelhos, e me olhou uma última vez antes de fechar a porta.
Minutos depois...
A porta se abriu de mansinho, e por um instante o som do corredor invadiu o quarto — o tilintar de passos, o rodar de uma maca distante. Caio entrou devagar, o olhar ainda cansado, mas com aquele brilho no fundo dos olhos que sempre reacendia quando via Rafael.
Ele parou por um momento, observando a cena: Miguel de pé ao lado do leito, com as mãos ainda tremendo e os olhos marejados; Rafael sorrindo fraco, o corpo coberto pelos fios e tubos, mas o semblante leve, sereno.
— Posso interromper? — perguntou Caio, num tom quase brincalhão, tentando disfarçar o nó que se formava na garganta.
Miguel se virou rápido, limpando as lágrimas com o dorso da mão.
— Ah, cara... não tem o que interromper, não. A gente só tava aqui falando da vida. E, bom... o seu noivo acabou de me fazer chorar feito criança.
Caio arqueou uma sobrancelha, sorrindo.
— Ele tem esse dom. Vira e mexe, me faz chorar também — mas, no meu caso, geralmente é de raiva antes de ser de emoção.
Rafael soltou uma risada fraca, que fez os dois olharem pra ele com ternura.
— Ah, então quer dizer que eu sou o problema e a solução, é isso?
— Exatamente, — Caio respondeu, se aproximando da cama e ajeitando o lençol sobre o peito dele. — Você me tira do eixo, me desmonta todo... mas depois vem com esse sorriso, e eu esqueço até do motivo da briga.
Miguel riu, balançando a cabeça.
— Meu Deus, vocês dois são uma novela viva. Acho que vou precisar de terapia depois de ser padrinho desse casal.
Caio piscou, surpreso. — Pera... padrinho? Como assim, Miguel?
Rafael respirou fundo e olhou pra ele com aquele brilho tranquilo, cheio de significado.
— Eu pedi pra ele ser nosso padrinho. Porque sem ele, eu nem estaria aqui pra te pedir em casamento, Caio. E porque ele foi o braço forte quando você precisou.
Caio desviou o olhar, tocado. Ficou em silêncio por alguns segundos antes de responder, a voz embargada:
— Eu sei... ele foi incrível. Quando tudo desabou, Miguel foi quem me manteve de pé. Eu só conseguia chorar e gritar o teu nome, Rafa... e ele tava ali, segurando a minha mão, me lembrando que você era forte. Que você ia voltar pra mim.
Miguel tentou disfarçar a emoção, mas a voz saiu trêmula.
— Ah, Caio... você não precisa agradecer. Eu só fiz o que qualquer pessoa faria. Eu não aguentava ver você daquele jeito. E eu também não ia deixar o Rafa ir embora, entende? Era como se eu soubesse que ele ainda tinha uma história pra viver. Que vocês ainda tinham muito o que viver.
Rafael estendeu a mão, tocando de leve a de Miguel.
— E é por isso que você vai estar lá com a gente, quando essa história continuar. Porque você faz parte dela agora. Não só como amigo, mas como irmão. Eu não quero que exista espaço pra medo, pra ciúme, pra distância. A gente passou por demais pra perder tempo com isso.
Caio olhou pros dois, o peito cheio de algo que não cabia em palavras. Deu um passo à frente e estendeu a mão para Miguel.
— Vem cá, cara.
Miguel hesitou, mas Caio insistiu:
— Sério. Vem aqui!
Eles se abraçaram. Forte. Sincero. Daqueles abraços que dissolvem mágoas antigas e criam algo novo — uma confiança.
Rafael observava tudo com os olhos marejados, o coração batendo forte.
— Olha pra gente..., disse, sorrindo. — Se alguém me dissesse meses atrás que o cara que doou o próprio sangue pra mim ia virar nosso padrinho e que o meu ciumento preferido ia abraçá-lo com tanto carinho... eu juro que não acreditava.
Caio soltou um riso emocionado, enxugando os olhos.
— É que eu aprendi, Rafa. Aprendi que o amor não é sobre posse. É sobre partilhar. E hoje, vendo tudo isso, eu entendo que o que a gente tem é maior do que qualquer medo.
Rafael estendeu a mão pra ele.
— Vem aqui, então.
Caio segurou firme, inclinando-se até o rosto dele.
— Eu tô aqui, meu amor.
— E eu tô inteiro, por sua causa. — respondeu Rafa, a voz carregada de emoção. — E por causa de vocês dois. Porque o amor que me trouxe de volta não foi só o teu, Caio. Foi o amor de todos que acreditaram que eu ainda tinha um motivo pra ficar.
Miguel passou a mão no rosto, rindo entre as lágrimas.
— Vocês vão me fazer chorar mais do que filme de drama, juro pra Deus.
Rafael sorriu, fraco, mas com os olhos brilhando.
— Então acostuma, padrinho, porque com a gente é emoção até o fim.
Eles riram juntos. O riso ecoou pelo quarto e, por um momento, o som das máquinas pareceu se calar. Era como se o hospital inteiro tivesse parado pra ouvir aquele instante: o renascimento de uma história que resistiu à dor, ao medo, ao tempo.
Caio encostou a testa na de Rafa, e disse baixinho:
— A gente venceu, amor.
— E vai continuar vencendo, — respondeu Rafa, sorrindo. — Um dia de cada vez.
Miguel olhou para os dois, o coração leve, e sussurrou:
— Que sorte a minha ter cruzado o caminho de vocês.
E ali, naquela madrugada silenciosa e cheia de promessas, os três entenderam o que era o verdadeiro significado da palavra família, aquela que nasce da dor, cresce no amor e se eterniza no perdão.
