DISCERE 2 - TEMPO DE AMAR - CAPÍTULO 8: FAMÍLIA

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Gay
Contém 3184 palavras
Data: 10/10/2025 02:16:18

Os dias seguiam tranquilos em São Paulo. No Instituto Discere, os alunos mergulhavam em provas e trabalhos, ansiosos pela recompensa de um mês inteiro de férias. Cada um já fazia planos: viagens, cursos, descanso. Valentim, entretanto, tinha um contratempo. Por causa do pé quebrado, não conseguiu tirar a carteira de motorista no prazo que havia sonhado, o que significava passar parte das férias estudando para conquistar a tão desejada habilitação.

Enquanto esse momento não chegava, ele passava horas tentando resolver exercícios de química.

Noah estava ali no quarto com ele, igualmente concentrado — mas não em fórmulas ou equações. Seu foco era o primeiro evento do Clube Arco-Íris, que liderava com entusiasmo. A ideia inicial era trazer a Dra. Eunice para uma palestra sobre relacionamentos tóxicos. Porém, o grêmio estudantil vetara o tema.

— Adequado é meu ovo! — esbravejou Noah, rascunhando o discurso que abriria as atividades do clube.

Valentim ergueu os olhos do caderno e fingiu estar refletindo.

— Deixa eu adivinhar... Gabriel?

— Exato. — Noah largou a caneta, irritado. — O desgraçado vetou o primeiro tema do Clube Arco-Íris. Agora vamos falar sobre aceitação. Ele bem que podia aceitar a minha mão na cara dele! — Se levantou e foi até o namorado, agitado. — E a primeira reunião vai ficar para depois das férias.

Valentim se esticou na cama, relaxando a coluna, e sorriu.

— Sabe do que a gente precisa?

— De bolar um plano contra o Gabriel?

— Não. — Ele se levantou e envolveu Noah num abraço. — De fazer um amor gostoso.

Noah resistiu por alguns segundos, mas logo se rendeu ao beijo.

— Tua mãe pode entrar. Quero que ela continue achando que sou casto.

— Meu querido, ela já viu os preservativos e o lubrificante. Ela sabe que a gente faz mais do que beijar. — Valentim provocou, arrancando um suspiro divertido de Noah.

— Idiota.

— Mas é sério. — Ele manteve o olhar firme. — A gente combinou que ia tomar cuidado com o Gabriel. Agora que a direção está de olho nele, talvez ele finalmente nos deixe em paz.

Antes que Noah pudesse responder, a porta se abriu de repente.

— Filho! — Victor entrou sem bater.

O susto foi imediato. Valentim empurrou Noah, que quase caiu sobre a cômoda. Victor apenas sorriu: sabia bem como funcionavam os hormônios adolescentes. No começo, estranhara a presença constante de Noah em sua casa, mas agora já o via como parte da família, assim como acontecia com Karla. Lutara contra a resistência dos Almeida Cardoso para defender o filho, e faria tudo de novo se fosse preciso.

— Pai! O que o senhor tá fazendo aqui? — perguntou Valentim, desajeitado, tentando disfarçar a excitação com as mãos no colo.

— Você quer dizer na minha casa ou dentro do teu quarto? — retrucou Victor, com ironia.

— A segunda opção. — Valentim se apressou em sentar na cama, cruzando as pernas.

— Eu ia chamar vocês pra jantar fora, mas pelo jeito aqui tá mais divertido. — brincou Victor, rindo do embaraço. — Ah, e, filho... já pensou na proposta que te fiz? Quero preparar os documentos e—

— Ainda estou pensando, pai. — Valentim o cortou rápido.

— Tudo bem. — Victor levantou as mãos em rendição. — Boa noite, garotos. E, por favor... porta aberta. — disse, provocativo, antes de sair.

Assim que ficaram sozinhos, Noah virou-se curioso.

— Que proposta?

— Ah, nada demais... só sobre qual carro eu vou querer. — respondeu, desconversando. Deitou-se ao lado do namorado e o beijou. — Em breve você vai ter um mozão habilitado. Vamos dar altos rolês, parça.

— Parça é? — Noah arqueou a sobrancelha.

— Mozão, lindo, príncipe, amor da minha vida... — Valentim listou, teatral.

— Amor da sua vida?

— Você é, Noah. Não tem noção de como eu te amo.

— Eu também te amo, Valentim. — Noah sussurrou, com um sorriso. Mas o momento romântico foi interrompido pelo estômago de Valentim, que roncou alto, arrancando uma gargalhada do namorado. — Acho que o jantar com os teus pais é uma boa. A gente merece, depois desse fim de semana atolado de trabalhos e exercícios.

— Obrigado! — Valentim fingiu choramingar, mas já se levantava, animado.

***

Em um dos shoppings mais badalados de São Paulo, Narciso e João Paulo caminhavam lado a lado, matando tempo antes da sessão de cinema. Desde o beijo inesperado nos corredores da escola, algo havia mudado entre eles. Não sabiam definir ao certo o que era aquilo, mas concordaram em tentar — fosse um namoro, uma amizade diferente ou apenas um encontro de descobertas.

João Paulo estava como sempre: simples, quase invisível. Vestia uma camiseta preta lisa, calça jeans azul e um par de tênis já gastos pelo tempo. Sem acessórios, sem detalhes chamativos, carregava em si uma naturalidade descomplicada que passava despercebida pela multidão.

Narciso, ao contrário, parecia carregar a própria luz. O chapéu, bem-posicionado, lhe dava um ar de charme calculado. A jaqueta jeans pendia sobre os ombros com a precisão de quem sabe se vestir para ser notado. A calça justa moldava suas pernas, e os coturnos pretos, impecavelmente polidos, completavam o conjunto. Pequenos acessórios discretos, mas estrategicamente escolhidos, reforçavam ainda mais sua aura de estilo.

Onde Narciso passava, os olhares o acompanhavam. João Paulo não sabia dizer se era pela fama que o amigo carregava ou simplesmente pela beleza quase hipnótica. Talvez fosse um pouco dos dois. O fato é que Narciso tinha o dom de transformar até o chão frio de um shopping em passarela, enquanto João Paulo permanecia na sombra, apenas observando.

Na bilheteria, depois de discutirem brevemente, decidiram assistir a um filme brasileiro. João Paulo insistiu que cada um pagaria o próprio ingresso, mas Narciso, sem pestanejar, escolheu a sala VIP. O coração de João Paulo disparou. O preço: oitenta e cinco reais. Por sorte, ele ainda tinha a carteirinha estudantil no bolso, o que lhe dava direito à meia-entrada. Mesmo assim, gastar quarenta e dois reais e cinquenta centavos em um filme lhe parecia um luxo fora de alcance.

Com os ingressos em mãos, seguiram para a bomboniere. Os valores exibidos nas placas eram quase irreais. Narciso, impassível, pediu uma pipoca pequena, um suco natural de laranja e algumas balas. A conta fechou em cento e trinta reais. Já João Paulo, contido, pediu apenas uma água e um pacote de jujuba. Vinte e cinco reais.

— Eu não costumo comer durante o filme — disse ele, tentando disfarçar o incômodo.

Mentira. A verdade era que adorava pipoca, mas não podia gastar tanto. Preferiu fingir indiferença, enquanto observava Narciso carregar o combo luxuoso como se fosse a coisa mais natural do mundo.

A sala de cinema se abriu diante deles, e João Paulo não pôde esconder o espanto. O espaço era imenso, com fileiras e fileiras de poltronas que se estendiam até onde os olhos alcançavam, a iluminação suave criando uma atmosfera de aconchego e imponência ao mesmo tempo. O cheiro de pipoca recém-feita misturava-se ao ar-condicionado, e as luzes discretas no chão indicavam os corredores como pequenas estrelas.

Eles escolheram lugares bem no centro, segundo Narciso, a posição ideal para aproveitar o filme — nem distante demais da tela, nem colado a ela. Assim que João Paulo se deitou na poltrona, sentiu como se tivesse descoberto um paraíso secreto. A maciez era tão superior à sua cama que ele quase teve uma epifania. Como algo tão simples podia ser tão confortável? Virando o rosto para o lado, viu Narciso relaxado, sem o chapéu, saboreando pipoca com naturalidade.

Os trailers começaram. João Paulo se lembra apenas da risada solta de Narciso diante de uma comédia que pretendia assistir. Depois, um toque suave em seu rosto o despertou. Abriu os olhos devagar e se deparou com Narciso sorrindo para ele. O ator estava sem a jaqueta. Num sobressalto, João Paulo percebeu que a usava sobre os ombros. Olhou ao redor e notou que a sala já estava vazia.

— Eu dormi o filme todo? — perguntou, incrédulo.

— As duas horas. — Narciso respondeu tranquilo, ainda com um sorriso leve. — Você é muito fofo.

— Eu não acredito... — João Paulo passou a mão nos cabelos cacheados, desajeitado. — Por que você não me acordou?

— Você dormia tão sereno. Mas começou a tremer e eu coloquei a jaqueta em você. Por um instante, achei até que tinha morrido. — Brincou, rindo sozinho.

— Desculpa... é que essa poltrona é tão confortável...

— Ei. — Narciso levantou a mão e tocou de leve o rosto de João Paulo. — Tá tudo bem. Essas coisas acontecem.

— Cara, gastei uma grana e nem assisti aos trailers... — lamentou.

— Se quiser, eu posso te passar o valor...

— Não é essa a questão, Narciso. Quer saber? Deixa pra lá. — engoliu o orgulho, sem querer estragar o momento. — Mas você gostou do filme?

— Sim. O filme foi incrível. Mas ter você dormindo nos meus braços foi bem melhor. — Narciso se aproximou e, sem hesitar, beijou João Paulo.

Um pigarro interrompeu a cena. Era um funcionário do cinema, lembrando-os de que precisavam liberar a sala para a limpeza. Os dois caíram na gargalhada pela situação e saíram juntos, ainda rindo, rumo à praça de alimentação.

Com esforço, Narciso convenceu João Paulo a aceitar que ele pagasse o jantar em uma rede de fast food. Pegaram a comanda e ficaram esperando. No intervalo, Narciso falava entusiasmado sobre o filme. A protagonista, contou, havia contracenado com sua mãe em uma novela da Rede Mundo.

— E como é conviver no mundo dos famosos? — perguntou João Paulo, curioso.

— Incrível, assustador e tenebroso. — Narciso resumiu, rindo.

— Uau. E a sua atriz favorita?

— Regina Sorrah. Ela é incrível. Me ensinou muito. Teve uma cena em que precisava humilhar todo o elenco porque era a vilã. A cada take, ela pedia desculpas a todos. Uma generosidade rara. — Narciso recordou com carinho.

— E a pior pessoa?

— Nem era ator. Foi um cantor, Klinger Lourenço.

— O do duo Klinger e Kleiton? Mentira! A minha mãe é fã dele.

— Falando na dona Joana... quando vai me apresentar? O Valentim vive dizendo que ela é incrível, generosa e à frente do tempo.

— Podemos marcar. Mas já aviso que ela é maluquinha.

— Deve ser maravilhosa, por ter criado um filho como você. — Narciso se interrompeu quando o número da comanda apareceu na tela. — Vou pegar nosso lanche.

Sentaram e começaram a comer. João Paulo, pouco a pouco, ficava mais à vontade na presença de Narciso. Nunca tinha imaginado que, além de conversar com o ator que sempre admirou, chegaria a beijá-lo. O único receio era a reação da mãe, que também nutria um fascínio pelo jovem astro. Ele afastou os pensamentos e se concentrou no sanduíche diante de si.

Narciso, por sua vez, o observava com fascínio. O simples jeito de João Paulo segurando o lanche parecia hipnótico. O ator não gostava de hambúrguer, evitava frituras e refrigerantes havia anos, mas fez questão de compartilhar aquele momento com ele. Notara que João Paulo usara carteirinha estudantil para comprar os ingressos, e que, antes, só havia pegado água e jujuba. Sabia que o amigo vinha de origem humilde, e queria retribuir de alguma forma.

Mordeu o sanduíche devagar, sentindo um sabor que lhe era quase esquecido. O pão macio, o queijo derretido, a carne suculenta. Depois, uma batata frita, salgada no ponto certo. Do nada, uma lágrima escorreu de seu rosto.

— Você está bem? — perguntou João Paulo, parando de comer, preocupado.

— Eu estou ótimo. — Narciso limpou a lágrima com a mão. — É que não como fritura há uns dez anos. Isso é uma delícia. — Disse, rindo de si mesmo, e voltou a mastigar. — Obrigado, João Paulo. — falou de boca cheia, saboreando cada segundo.

***

O Instituto Discere sempre fora conhecido pela excelência no ensino e pelo rigoroso sistema de avaliação. O fim de semestre era marcado por um grande evento: a reunião entre pais, mestres e alunos, ocasião temida por muitos. Mas, naquele ano, o clima era diferente. Pela primeira vez, Valentim não estava preocupado. Ele havia passado em todas as matérias, com uma ajuda preciosa de Noah e Karla, que revisaram os conteúdos ao lado dele. O esforço conjunto dera resultado, e o sorriso no rosto do rapaz era prova disso.

Outro que também se destacara fora João Paulo, que além de passar sem dificuldade, ganhou o prêmio de melhor redação em literatura. A conquista o deixou completamente bobo, como se ainda não acreditasse que seu talento fora reconhecido em meio a tantos alunos. Narciso, por sua vez, mantinha o costumeiro desempenho mediano: não se esforçava demais, mas também não deixava que suas notas caíssem a ponto de preocupar Helena.

Entre risadas e conversas no gramado da escola, os amigos discutiam o destino das férias. Karla estava radiante, ansiosa para conhecer a família do namorado no Nordeste. Noah queria apenas descansar, longe de Gabriel e de qualquer drama. Valentim, com a perna ainda em recuperação, ficaria em São Paulo para as aulas de direção; só depois, aproveitaria os dias na fazenda de Noah.

— E você, João Paulo? Planos para as férias? — perguntou Karla.

— Trabalhar. — respondeu o rapaz, ainda admirando o pequeno troféu de melhor aluno. — Em julho acontece uma feira em São Paulo. A gente vende os crochês da minha mãe.

Valentim ergueu uma camisa malfeita de crochê, com pontos tortos e desiguais.

— Será que ela aceitaria as minhas peças?

— Melhor não, né? — respondeu João Paulo, rindo.

— Sou um artista incompreendido. Agora eu te entendo, Narciso. — brincou Valentim, voltando a se concentrar no crochê.

— Muito. — Soltou Noah, que estava tentando ajustar o gorro que ganhou do namorado.

João Paulo desviou o olhar para Narciso, que permanecia deitado na grama, observando o céu nublado.

— E você?

— Acho que vou para o Rio de Janeiro. Vai ter um teste para uma série. Se eu conseguir o papel, passo as férias gravando.

— Prefere gravar novela ou série? — perguntou Karla, acariciando os cabelos de Breno, que usava o colo dela como travesseiro.

— Série. Novela é longa demais. Série é mais rápido, são só semanas. Também gosto de filmes.

— Eu amo aquele slasher Pacto do Demônio Sangrento 4 – O Renascer da Morte. Sua morte foi icônica.

— Levou dois dias para gravar aquela cena. Entrou sangue em lugares que nunca imaginei. — contou Narciso, arrancando risadas do grupo.

Narciso aproveitou a deixa e compartilhou detalhes curiosos da rotina dentro de um estúdio de gravação. Mas o toque do sinal interrompeu a conversa: era hora da reunião de pais e mestres.

As famílias seguiram para as salas. Frida, ao receber o boletim do filho, se encheu de orgulho. Gabrielle, a mãe de Noah, recebeu elogios do diretor pelo clube que o rapaz criara na escola. Angela Delgado, ex-miss Brasil e mãe de Karla, conheceu Breno — mas os dois decidiram esconder, por enquanto, o fato de ele ser trans. Quem representou Breno foi a tia, já que seus pais moravam no Nordeste.

No segundo ano, tudo também corria bem. Helena parabenizou Narciso pelas notas, mas logo precisou sair para uma reunião de negócios — além de cuidar da carreira do filho, agora também gerenciava outros jovens talentos. Enquanto isso, Joana, mãe de João Paulo, estava encantada. Nunca tivera muitas oportunidades de conhecer a escola e ficou impressionada com a estrutura. Seu coração, no entanto, se encheu ainda mais de alegria ao ver a conquista do filho reconhecida com o prêmio de redação.

Quando os pais foram dispensados, João Paulo aproveitou para fazer um tour com a mãe pelo colégio. Andavam pelos corredores quando Joana deu um grito súbito.

— João Paulo, é o... Sócrates, Platão, Odisseu, Hércules...

— Narciso, mãe. — corrigiu o rapaz, vermelho de vergonha. — Não precisa citar todos os nomes da tragédia grega.

Narciso riu baixinho, levantando-se com a calma que lhe era típica.

— Narciso, esta é a minha mãe, dona Joana.

O ator estendeu a mão, mas Joana o puxou para um abraço apertado. Estava tão emocionada que mal conseguia falar. Durante a pandemia, sua principal distração ao lado do filho era maratonar 'Correntes do Amor', uma das novelas mais vistas do país, e o primeiro papel de protagonista de Narciso.

— Menino, você é de verdade. — disse ela, tocando o rosto de Narciso como se ainda não acreditasse. — Eu e o João Paulo somos seus grandes fãs. Já assistimos a todas as suas novelas e séries.

— Ah, é mesmo? — Narciso olhou para João Paulo, que parecia um pimentão maduro de tanto constrangimento. — João Paulo nunca me disse.

— Menino, ele tem uma blusa com o teu rosto. Acho que era da novela "Seu coração me pertence".

— Essa novela é mais antiga, eu tinha um papel pequeno...

— Que nada. Foi o primeiro crush do João Paulo. Ele tinha cartazes e revistas com o teu rosto. Foi assim que descobri que...

— Chega, mãe... preciso te mostrar a escola. — Murmurou João Paulo.

— Opa, um tour? Eu topo, dona Joana. Se a senhora quiser, claro. — ofereceu Narciso, divertido.

— Claro que quero. Não é todo dia que Narciso Figueiredo me guia dentro de uma escola. — afirmou Joana, agarrando o braço do rapaz. — Menino, que pele bonita.

— Eu mereço... — suspirou João Paulo, andando atrás dos dois, já arrependido de ter proposto o passeio.

Joana caminhava pelas dependências do Instituto Discere, observando cada detalhe com a curiosidade de quem ainda se encantava com a imponência do lugar. Enquanto isso, em outra ala do colégio, Gabriel recebia o próprio boletim.

A família dele não havia comparecido à reunião, e talvez isso nem o surpreendesse mais. O papel em suas mãos refletia um desempenho impecável: gabaritou todas as matérias. Nem mesmo João Paulo, com toda a dedicação e esforço, havia conseguido resultados tão brilhantes. Gabriel, no entanto, não sorriu. Olhou ao redor e viu pais abraçando filhos, mães chorando de orgulho, famílias celebrando juntas. Apertou o boletim com força até amassá-lo, como se o valor das notas desaparecesse junto com aquele gesto. Sem pensar duas vezes, caminhou até a lixeira e o jogou fora.

O toque insistente de seu celular o fez parar. Ao ver o nome no visor, um arrepio percorreu-lhe a coluna. Atendeu.

— Alô?

— Você vem para Brasília? — perguntou a voz fria de sua mãe. — Olha, Gabriel, eu acho melhor você continuar em São Paulo. O seu pai ainda está chateado com a situação do ano passado.

— Situação? — repetiu ele, sentindo a raiva subir. — O fato do filho dele ser gay é uma situação? Quer saber... foda-se os dois. Eu vivo melhor sem vocês!

Desligou bruscamente e, tomado pelo impulso, arremessou o celular contra a parede. O aparelho se partiu em pedaços pelo chão.

— Que atuação cativante. — comentou uma voz atrás dele.

Gabriel se virou, irritado, e deu de cara com Valentim.

— Vai se foder! — gritou, antes de sair apressado pelo corredor.

Valentim observou a cena, balançando a cabeça. Se aproximou dos restos do celular quebrado e, sem pensar muito, os guardou na mochila.

— Deus é bom o tempo todo. — murmurou consigo mesmo, quase divertido.

Poucos segundos depois, Noah apareceu, o procurando.

— Amor, eu estava atrás de você. Aconteceu algo?

Valentim ajeitou o cabelo, como se nada tivesse acontecido.

— Não, amor. Ouvi um barulho e pensei que fosse algo importante, mas era só um animal assustado que fugiu.

Noah sorriu com certo alívio.

— Puxa, queria que você passasse as férias comigo.

Valentim o abraçou com carinho e, com um olhar enigmático, respondeu:

— Eu sei, bebê... mas tenho a impressão de que o próximo semestre vai ser interessante.

Um sorriso discreto lhe tomou o rosto, como se já pudesse prever as turbulências que viriam.

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Comentários

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AH, DE QUE ADIANTA UM BOLETIM CHEIO DAS MELHORES NOTAS SE NEM OS PAIS SE IMPRESSIONAM COM ISSO. DE QUE ADIANTA UM BOLETIM MARAVILHOSO E UM CARÁTER DE MONSTRO? MORTE AO GABRIEL.

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