DISCERE - QUATRO ELEMENTOS - CAPÍTULO 10: CONSCIÊNCIA

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Gay
Contém 3484 palavras
Data: 07/09/2025 03:37:44

CURTE ROMANCES FOFOS E COM UMA HISTÓRIA CONTAGIANTE? ACESSA AÍ:

O jardim da Escola Discere ainda estava silencioso naquela manhã, exceto pelo canto suave dos pássaros e o leve farfalhar das folhas. O sol nascente atravessava as copas das árvores, tingindo de dourado a grama úmida. Valentim andava de um lado para o outro, incapaz de conter a raiva que fervia dentro dele.

— Eu vou matar esse tal de Gabriel! — Exclamou, gesticulando com as mãos, como se o próprio ar à sua frente fosse culpado.

Karla, sentada em um dos bancos de madeira, observava o amigo com um olhar preocupado, mas firme.

— Calma, Val. Essa atitude não vai levar a nada. — Pediu, cruzando as pernas e tentando transmitir serenidade, embora também estivesse irritada com a ousadia de Gabriel.

Valentim parou por um instante, respirando fundo, antes de falar de novo:

— O meu pai enviou as fotos para os advogados. Eu nunca ouvi tanta merda... Porra, é só um beijo. — A voz dele carregava mais indignação do que tristeza, mas o peso da situação se infiltrava em cada palavra.

Noah permanecia quieto desde que chegaram ali. Sentado na beira de um canteiro de flores, olhava para o chão como se o mundo à sua volta estivesse distante. Os dedos se entrelaçavam nervosos, o corpo rígido, e havia no seu rosto uma tensão que Valentim reconhecia bem — a mesma de quando Noah lhe contou sobre o que tinha vivido em Brasília no ano anterior. Um arrepio percorreu Valentim.

Ele se aproximou devagar, com a intenção de tocar o braço do namorado, mas Noah se levantou antes que pudesse fazer isso, recuando dois passos.

— Hoje começa a semana de provas. Eu não tenho tempo para isso. — Disse, sem encarar ninguém.

— Noah, por favor... — Valentim tentou, dando um passo à frente.

Mas Noah já estava se afastando pelo caminho de pedras, em direção ao prédio principal. Sua silhueta desapareceu entre os corredores, deixando no ar apenas a tensão cortante de suas palavras.

Karla suspirou e se levantou.

— Deixa ele, Valentim. O Noah está certo. A gente precisa se concentrar na prova. Depois vamos dar um jeito nesse tal de Gabriel.

Valentim não respondeu de imediato. Ficou ali, parado no jardim, sentindo o vento leve tocar seu rosto, mas sem conseguir afastar a sensação de que, por mais que tentasse, o dia já tinha começado torto.

***

A semana de provas chegou como um vendaval para todos na Escola Discere. O ar carregava um peso quase palpável — não apenas pela pressão acadêmica, mas pelas preocupações que cada um carregava em silêncio.

Valentim, apesar das sessões no psicólogo e de todo o esforço para estudar, não conseguia se concentrar o suficiente. As palavras dos livros se misturavam na sua mente, sempre interrompidas por dois fantasmas persistentes: a homofobia do pai e o inferno constante que Gabriel vinha fazendo na vida de Noah. Era como se, mesmo sozinho, nunca estivesse realmente em paz.

Karla também vivia seus próprios medos. Por mais que tentasse manter o foco nas provas, a ameaça constante de seu relacionamento ser descoberto a sufocava. O pai, um homem de raízes rígidas de uma família tradicional de São Paulo, jamais aceitaria saber que a filha namorava um homem trans. O segredo era um peso constante, e ela vivia equilibrando suas verdades para que não caíssem na visão dos outros.

Noah, por sua vez, já estava exausto. As olheiras denunciavam noites mal dormidas, e sua cabeça não parava de reproduzir o mesmo filme: Valentim chegando, pedindo para conversar e dizendo, com a frieza que Noah mais temia, que estava confuso... que tudo não passara de um teste de sexualidade. O pensamento era cruel, mas ele não conseguia afastá-lo.

Durante a prova de biologia, esses devaneios o castigavam. De repente, sem aviso, lágrimas quentes começaram a escorrer pelo seu rosto. Ele se lembrou de Gabriel, das provocações, e o ódio veio tão rápido que, num impulso, quebrou o lápis com força. O som seco chamou atenção.

Karla, que estava sentada próxima, ergueu os olhos, surpresa. Mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, o professor exigiu silêncio e todos voltaram a se concentrar.

Minutos depois, Noah respirou fundo, tirou um pequeno papel dobrado do bolso e, sem olhar diretamente para ela, o deslizou até Karla.

— Entrega pro Valentim... por favor — disse, quase num sussurro.

Karla franziu a testa, sem entender. Mas guardou o bilhete e, assim que teve oportunidade, caminhou até a sala de Valentim. Ele pegou o papel, abriu com calma... mas não chegou até o final. As palavras foram como golpes invisíveis. Antes de terminar, seus olhos já estavam marejados, e logo as lágrimas escorriam.

***

Valentim,

Eu não sei por onde começar... talvez porque nenhuma palavra pareça suficiente para explicar o que estou prestes a fazer. Quando a gente se conheceu, eu jamais imaginei que você iria bagunçar meus dias de um jeito tão bom, nem que o simples som da sua risada pudesse me fazer esquecer o mundo lá fora. Mas a vida não é só sobre momentos bons, e agora... sinto que preciso ser honesto — pelo menos até onde eu consigo ser.

Você e eu... somos diferentes demais. E, antes que isso vire algo maior, acho melhor parar por aqui. Eu sei que essas diferenças já pareciam pequenas antes, mas tenho medo de que, com o tempo, elas se tornem muralhas. Você é tempestade e madrugada, e eu... sou manhãs calmas. Você corre para o mundo como se ele fosse seu, e eu fico à margem, tentando entender onde me encaixo.

Talvez seja covardia, mas prefiro encerrar agora do que assistir a gente se machucar depois. Você não merece alguém que viva em dúvida, que carregue um peso que não tem coragem de contar.

Eu espero, de verdade, que você me guarde em um canto bom da sua memória. Porque eu vou guardar você. Sempre.

***

Com a mão trêmula, ele amassou parcialmente o bilhete e passou a manga da blusa no rosto, tentando conter o choro. Karla se aproximou, mas ele não disse nada. Nem uma palavra. Apenas pegou sua mochila e saiu da sala.

Valentim não foi para casa. Preferiu andar sem rumo pelas ruas cinzentas de São Paulo. O vento frio batia contra o rosto, mas era o peso no peito que realmente doía. O celular tocou várias vezes — os pais ligando, insistindo. Até que, num impulso, parou sobre uma ponte, olhou para o rio abaixo e, sem pensar duas vezes, arremessou o telefone. O som do impacto na água foi quase libertador.

***

No dia seguinte, a escola inteira estava em alvoroço. Não se falava de outra coisa: Valentim estava desaparecido. Colegas já compartilhavam mensagens e fotos pelas redes sociais, pedindo informações.

Noah, por outro lado, tentava se esconder atrás da rotina. Compareceu às provas como se nada tivesse acontecido, tentando mascarar o vazio que o consumia. Mas Karla não suportou vê-lo assim.

No meio do corredor, ela o segurou pelos braços e o empurrou contra a parede com força. Seus olhos queimavam de raiva.

— Você se faz de indiferente, Noah... mas sofre como todo mundo! — A voz dela era firme, cortante. — Você sempre disse que tinha medo de o Valentim partir seu coração... mas foi você quem partiu o dele! E agora ele sumiu! — ela apertou mais os ombros dele, como se quisesse cravar as palavras na pele. — A culpa é sua, Noah. O desaparecimento dele... é culpa sua!

As palavras de Karla atingiram Noah como um soco no estômago. Ele ficou imóvel, encarando a amiga como se tentasse assimilar cada sílaba, mas tudo parecia confuso demais. O corredor parecia mais estreito, o ar mais denso.

— Eu... — Tentou dizer algo, mas a voz falhou. O nó na garganta cresceu, sufocante. — Você não entende...

— Não entende o quê, Noah?! — Karla não recuou nem um passo. — Você acha que ele era só mais um? Que podia simplesmente escrever um bilhete e desaparecer da vida dele como se nada tivesse acontecido? Você acha que isso não tem consequência?!

Noah desviou o olhar, encarando o chão. Seus olhos começaram a arder, mas ele se recusava a chorar ali, no meio de todos. Ainda assim, a imagem de Valentim lendo a carta se repetia na sua mente, como uma cena cruel que não parava de voltar.

— Eu só queria... proteger ele. —Murmurou, quase para si mesmo.

— Proteger? — Karla deu uma risada curta, sem humor. — Você feriu ele, Noah. Feriu de um jeito que talvez não dê pra consertar.

Ela soltou os ombros dele, mas seu olhar continuava afiado. Noah ficou parado, se sentindo exposto, como se todos os olhares do corredor estivessem sobre ele.

Naquele momento, percebeu o que mais o assustava: não era o sumiço de Valentim, nem o julgamento de Karla. Era a possibilidade real de que, quando — e se — o encontrassem, Valentim já não quisesse mais saber dele.

Noah respirou fundo, tentando se recompor. Pegou a mochila, passou por Karla sem dizer mais nada e entrou na sala de aula. Mas, por dentro, algo nele começava a ruir.

Longe dali, em algum ponto desconhecido da cidade, Valentim caminhava sozinho, tentando decidir se voltava para casa... ou se continuava desaparecido por mais um tempo.

***

— Ei, garoto! — o atendente do café chamou, despertando Valentim, que levou um susto. — Vamos fechar. Você não tem que voltar para casa?

— Já estou indo, senhor. — respondeu Valentim. Ele estava longe de casa desde a noite anterior e havia passado o dia inteiro vagando pelas ruas de São Paulo.

O vento frio da noite cortava o rosto de Valentim enquanto ele caminhava pela Avenida São João. As luzes dos postes piscavam, algumas queimadas, e o movimento dos carros era um zumbido constante ao fundo. Ele não sabia exatamente para onde estava indo — apenas colocava um pé na frente do outro, tentando se afastar de tudo que lembrasse Noah, a escola, ou a própria casa.

A carta ainda estava no bolso do casaco, amassada, como se o papel carregasse um peso físico. Por mais que tentasse, não conseguia parar de pensar nas palavras escritas ali. Cada frase parecia ecoar em sua mente como um refrão doloroso: "Somos diferentes demais"... "prefiro encerrar agora"... "você não merece alguém tão complicado".

Ele parou diante de uma banca de jornal fechada e se encostou na parede fria, respirando fundo. O coração batia acelerado, não pela caminhada, mas pela confusão que o dominava. Uma parte dele queria acreditar que Noah tinha algum motivo que ia além do que estava escrito. Mas outra parte não via explicação que justificasse tanta covardia.

Sem celular, não havia como saber quem o procurava ou o que diziam na escola. Isso, de certo modo, o deixava aliviado. Não queria mensagens de pena, nem conselhos, nem a voz dos pais tentando minimizar a dor.

As horas passaram. Ele atravessou ruas, entrou em bairros que raramente visitava, até chegar a um parque mal iluminado. Escolheu um banco afastado, sent e ficou ali, abraçando os joelhos, enquanto observava o reflexo trêmulo da luz na água de um lago artificial. O silêncio ao redor parecia gritar mais alto do que qualquer conversa.

No fundo, Valentim sabia que não poderia fugir para sempre. Mas, por enquanto, estar longe de tudo era a única forma de respirar.

Longe dali, Noah passava a noite em claro, encarando o teto, sem saber que Valentim ainda estava por ali — tão perto, mas ao mesmo tempo inalcançável.

***

O parque estava vazio, envolto por um silêncio inquietante. Valentim estava sentado no banco, ainda com o corpo encolhido pelo frio, quando percebeu duas silhuetas se aproximando pelo canto mais escuro da alameda. Os homens caminharam devagar, como predadores que não tinham pressa.

O mais alto, magro e de olhar agressivo, apontou diretamente para os pés de Valentim.

— Ô, bacana... tênis bonito esse aí. Deve ter pago caro, né?

O outro, mais baixo e com o corpo largo, soltou um riso áspero.

— É, mas hoje vai mudar de dono. Passa essa porcaria logo.

Valentim se levantou num salto, o coração disparado.

— Não vou dar — disse, tentando manter firmeza na voz.

O mais baixo deu dois passos para frente, colando o rosto no dele. O hálito cheirava a álcool barato.

— Vai dar sim, otário... ou a gente te desmonta aqui mesmo.

Valentim recuou, mas antes que pudesse pensar em correr, o magro o acertou com um soco no queixo tão forte que sua cabeça girou. Ele cambaleou, tentando se recompor, mas o outro veio por trás, segurando-o pelos ombros e o jogando contra o chão.

O impacto foi seco. A dor explodiu nas costas. Antes que pudesse se levantar, recebeu um chute no abdômen que arrancou todo o ar dos pulmões.

— Quer pagar de durão, é? — o mais baixo gritou, chutando-o outra vez, agora nas costelas.

Valentim tentou rolar para o lado e proteger o rosto, mas o magro se ajoelhou sobre ele e desferiu uma sequência de socos na face. O som abafado dos golpes se misturava com a risada debochada dos dois. Ele sentiu o gosto metálico do sangue escorrendo pela boca.

— Segura ele! — ordenou o robusto, enquanto arrancava os tênis com violência. — Olha só... vai ficar perfeito em mim.

Mesmo já rendido, Valentim levou mais dois chutes no rosto, o último tão forte que seu corpo se estirou no chão, mole, como se a força tivesse sido arrancada de vez. A visão se turvou, e a última coisa que sentiu foi a grama úmida colando no rosto.

Os homens se afastaram rindo, comentando sobre o "presentinho" que tinham acabado de ganhar, enquanto Valentim permanecia ali, desacordado, abandonado na escuridão do parque.

***

A madrugada avançava silenciosa, cortada apenas pelo rangido metálico de um carrinho de mão sendo empurrado pela calçada. Joana e João Paulo, mãe e filho, voltavam de uma festa de bairro onde haviam recolhido diversas sacolas cheias de latas de alumínio. O peso fazia o carrinho balançar, mas para eles, aquilo era ouro: significava comida e contas pagas.

No caminho de volta, ao cruzarem o parque quase deserto, Joana parou de repente. Sua lanterna improvisada — um celular velho com a tela quebrada — iluminou um corpo estirado na grama. Um rapaz, jovem, pálido, com o rosto inchado e marcas visíveis de agressão.

— Meu Deus... João Paulo, olha isso! — Eexclamou, já se agachando ao lado dele.

João Paulo franziu o cenho, desconfiado.

— Mãe, deixa isso quieto... vai saber quem é esse cara. Pode ser confusão, pode ser problema pra gente.

Joana ignorou. Aproximou o rosto para verificar se ele ainda respirava.

— Tá vivo, mas tá machucado... Olha pra ele, João Paulo, deve ter a idade da sua irmã. Eu nunca vou deixar alguém tão novo e arrebentado desse jeito largado no relento.

— Mas, mãe... e se ele tiver metido em coisa errada? A gente não sabe de onde ele veio! — Insistiu o rapaz, inquieto.

— Eu sei de onde ele veio: do mesmo mundo que tenta matar pobre e jovem todos os dias. — Joana se levantou com firmeza. — Vai botar ele no carrinho. Agora.

João Paulo resmungou, mas obedeceu. Retirou cuidadosamente as sacolas de latas e encostou o carrinho no gramado. Com algum esforço, ergueu o corpo desacordado de Valentim. O peso parecia maior do que o esperado, não pela massa, mas pela gravidade do que carregava: um desconhecido, espancado, sangrando, e totalmente indefeso.

O rangido do carrinho agora soava diferente enquanto avançavam pelas ruas silenciosas. Joana caminhava ao lado, de olho no rapaz, se certificando-se de que respirava. O frio da madrugada se tornava mais cortante, mas no rosto de Joana havia apenas determinação.

Eles desapareceram pelas ruas estreitas, levando Valentim para o único abrigo que podiam oferecer: a casa simples no fundo de uma viela, onde, por aquela noite, ele estaria longe da escuridão do parque — e, por enquanto, longe de todos que o procuravam.

***

A luz fria e esbranquiçada da delegacia realçava as olheiras no rosto de Victor e Frida. Sentados lado a lado na recepção, esperavam o delegado responsável atender o chamado. O relógio marcava quase meia-noite, mas para eles, o tempo parecia ter perdido qualquer sentido desde que souberam que Valentim não havia voltado para casa.

Victor Almeida Cardoso era um homem sisudo, dono de uma postura impecável e de um semblante que raramente cedia a emoções visíveis. Mas, naquele momento, a rigidez não disfarçava o peso nos olhos. Por dentro, a culpa latejava. Ele lembrava que a última interação com o filho havia sido uma briga — uma discussão acalorada sobre Noah, o garoto com quem Valentim estava se relacionando. Não era exatamente sobre o namoro em si... mas sobre o que as pessoas diriam. O sobrenome Almeida Cardoso carregava peso na sociedade paulista, e Victor temia a reação dos círculos sociais tanto quanto a desaprovação de certos familiares.

Frida, ao seu lado, parecia outra pessoa. Por anos, havia negligenciado Valentim, ocupada demais com compromissos e obrigações para perceber o quanto ele precisava dela. Mas depois do diagnóstico de TDAH, algo mudou. Começou a olhar para o filho com outros olhos, a entender suas dificuldades e a valorizar seus pequenos avanços. A sexualidade dele nunca foi problema para ela; só queria vê-lo feliz — e em segurança.

— Senhor Victor, senhora Frida, por favor, podem entrar. — Pediu um policial, abrindo a porta para uma pequena sala de atendimento.

Lá dentro, o delegado escutou com atenção. Victor explicou o horário em que perceberam que o filho não havia voltado, falou sobre a última vez que o viram, e mencionou que ele estava emocionalmente abalado. Frida acrescentou detalhes sobre a rotina de Valentim, os lugares que ele frequentava, e o círculo de amizades.

A tensão na sala era palpável. Enquanto Victor falava, olhava fixamente para a mesa, tentando manter a voz firme. Frida, por outro lado, segurava um lenço e enxugava discretamente os olhos.

Assim que terminaram, o delegado fez um aceno para um dos investigadores na sala ao lado. Em poucos minutos, a delegacia começou a se movimentar: chamadas para viaturas, alertas enviados para unidades próximas, imagens de câmeras de segurança requisitadas.

Victor observava em silêncio, a mandíbula travada. Frida, com as mãos entrelaçadas, parecia rezar sem som. A busca por Valentim havia oficialmente começado — e agora, cada minuto contava.

***

O Instituto Discere, normalmente barulhento e cheio de energia juvenil, estava tomado por um clima de inquietação. Pelos corredores, grupos de alunos sussurravam entre si, criando as mais variadas teorias sobre o sumiço de Valentim. Alguns diziam que ele havia fugido de casa por causa dos pais; outros, que algo mais grave havia acontecido nas ruas de São Paulo. Os boatos cresciam a cada hora, e ninguém parecia saber onde terminava a verdade e começava a invenção.

Na manhã daquela quarta-feira, logo após a prova de literatura, Noah foi chamado por um funcionário até a sala de reuniões da direção. Caminhou pelo corredor tentando imaginar o motivo, acreditando que poderia ser algo relacionado ao desempenho escolar. Mas, ao abrir a porta, congelou.

Dois policiais estavam sentados ao lado da psicóloga da escola, Dra. Eunice. Mais ao fundo, sua mãe, com expressão preocupada, segurava a bolsa com força. O coração de Noah disparou.

— Entre, Noah, sente. — Pediu a Dra. Eunice, num tom calmo, mas carregado de seriedade.

Ele obedeceu, meio hesitante. Ao se sentar, percebeu que um dos policiais, um homem de meia-idade com olhar firme, o observava atentamente.

— Eu sou o investigador Moraes. — Disse o homem, se inclinand para frente. — Estamos cuidando do caso do desaparecimento de Valentim. Quero que saiba que as primeiras 24 horas são cruciais para encontrar alguém. Então, precisamos que você seja o mais claro e sincero possível.

Noah engoliu em seco, o corpo inteiro em alerta.

— Você e Valentim estavam em um relacionamento? — Perguntou Moraes.

— Estávamos... — respondeu, com a voz baixa.

— A escola nos informou sobre uma carta que você escreveu para ele. Quero que me diga exatamente por que escreveu e o que estava acontecendo entre vocês nos últimos dias.

Noah apertou as mãos sobre o colo. Explicou que havia se sentido pressionado por problemas pessoais, mencionou Gabriel e a sensação de que talvez estivesse atrapalhando a vida de Valentim. Contou que colocou tudo no papel porque não teve coragem de falar pessoalmente.

— E depois disso? Valentim entrou em contato? Ligou? Mandou mensagem? — Insistiu o policial.

Noah balançou a cabeça, e a voz começou a falhar.

— Não... nada. E eu... — Respirou fundo, tentando conter as lágrimas — eu acho que foi minha culpa. Se eu não tivesse terminado daquele jeito... ele não teria sumido.

O silêncio que se seguiu foi pesado. Dra. Eunice colocou uma mão sobre o ombro de Noah, mas ele já chorava, as lágrimas caindo sem que conseguisse contê-las.

— Eu só queria proteger ele... mas acabei afastando. Agora não sei onde ele está, nem se está bem.

O investigador Moraes fez algumas anotações, o semblante sério, mas a voz controlada.

— Vamos fazer de tudo para encontrá-lo, Noah. Mas para isso, precisamos que você continue colaborando. Cada detalhe importa.

Noah assentiu, enxugando o rosto com as costas da mão. O peso da culpa parecia esmagá-lo mais a cada minuto.

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Comentários

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REALMENTE, MUITA COVARDIA. NÃO SE TERMINA UM RELACIONAMENTO ATRAVÉS DE UM BILHETE. ESTE CONTO ESTÁ CADA VEZ MELHOR, PRENDE E OLHA QUE A PRINCÍPIO EU NEM IRIA CONTINUAR LENDO. MAS CONSEGUIU PRENDER MINHA ATENÇÃO. VICTOR CARDOSO TEM A SUA PARCELA DE RESPONSABILIDADE NISSO TAMBÉM. SE PREOCUPOU MAIS COM O FALATÓRIO DO QUE COM OS SENTIMENTOS DO PRÓPRIO FILHO. LAMENTÁVEL. TRAFIÇÕES EXISTEM PARA SEREM QUEBRADAS. O QUE IMPORTA É O VERDADEIRO AMOR. CONTINUE RAPIDINHO...

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