DISCERE - QUATRO ELEMENTOS - CAPÍTULO 4: CORAÇÃO BATENDO FORTE

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Gay
Contém 3163 palavras
Data: 19/08/2025 13:41:13

CURTE ROMANCE LGBT FOFO E LEVE? ACESSA AI:

O cheiro de tinta fresca impregnava o ar do quarto de estudos, misturado ao aroma suave de pão de queijo recém-assado. Noah e Karla estavam sentados no chão, cercados por cartolinas, pincéis e pequenos frascos de tinta acrílica. O mapa da região amazônica, que ocupava quase toda a extensão do tapete, parecia mais uma obra de arte do que um simples trabalho de geografia.

Apesar do clima de concentração, havia algo que inquietava Noah — a presença do pai, Raphael, que caminhava pelos corredores da casa com a mesma expressão carrancuda de sempre, mas sem o blazer ou a maleta inseparável. Desde que se entendia por gente, Noah nunca lembrava de ver o pai tanto tempo em casa. O trabalho no Senado sempre vinha antes de tudo — até mesmo da família. Mas naquele fim de semana, um projeto emergencial o mantivera em casa, e isso trazia a Noah uma estranheza difícil de disfarçar.

— Eu juro que essa sombra está torta. — Resmungou Noah, apontando para uma região ao norte do mapa.

Karla, já impaciente com o projeto, apenas revirou os olhos. Antes que pudesse retrucar, a empregada apareceu com uma bandeja de sucos e lanches.

— Bem, isso é um sinal para pararmos. — Disse Noah, sorrindo e pegando a bandeja com gratidão.

— Por favor, eu não aguento mais o cheiro dessa tinta. — Respondeu Karla aliviada, levantando-se para esticar as pernas.

Assim que se afastou do mapa, o celular dela vibrou. Ela olhou a tela e sorriu com suavidade, atendendo de imediato.

— Oi, amor. Não, estou na casa do Noah. Estamos presos em um trabalho de geografia... — Karla andava de um lado para o outro enquanto falava. — E como estão as coisas em Belo Horizonte? Que bom. Estou ansiosa para te ver. Beijo. Te adoro.

Desligou o aparelho sem notar a expressão desconfiada de Noah.

— Espera, o Valentim está em Minas Gerais? — Perguntou ele, franzindo a testa enquanto deixava a bandeja na mesa ao lado.

— Puta merda. — murmurou Karla, percebendo o deslize.

— Eu vi que ele postou alguma coisa na piscina...

Ela hesitou por um instante, como se decidisse entre manter o segredo ou confiar nele. Respirou fundo e se aproximou, pegando a mão de Noah — e logo soltando ao sentir a tinta grudenta em seus dedos.

— Bem, Noah, o que eu vou te contar agora não pode vazar, tá?

Ele assentiu, intrigado.

— Eu terminei com o Valentim. Estou conhecendo outro cara.

Noah piscou, surpreso.

— Terminou? O Valentim está solteiro?

— Basicamente. — Ela se abaixou para pegar um pincel caído e falou mais baixo. — Posso contar com sua discrição?

— Claro. Fora que nunca entendi o que você via no Valentim. Ele tem cara de... sei lá, troglodita.

Karla riu, balançando a cabeça.

— Não, Noah. Muito pelo contrário. O Valentim é o meu melhor amigo. Ele é um cara gentil, conselheiro... atrapalhado. — Ela sorriu de verdade agora, o tipo de sorriso que carrega memórias boas. — Sério, dentro desse universo de aparências, o Valentim foi quem segurou na minha mão quando tudo estava desmoronando. Dá uma chance para ele. Eu não sei o que te faz ser tão arisco com o Valentim, mas saiba que ele não é essa pessoa que você imagina. Ele é um bom amigo.

Noah encarou o mapa inacabado à sua frente. As fronteiras traçadas com tanto cuidado agora pareciam confusas, assim como seus sentimentos.

Dava para confiar no que Karla dizia?

Ou será que o maior desafio da Gincana dos Quatro Elementos não era competir... mas aprender a se abrir?

***

A tarde caía lenta sobre os jardins organizados da mansão da família Cardoso, tingindo o céu de laranja e dourado. No quarto espaçoso de paredes claras e estantes abarrotadas de livros, Valentim rabiscava mais uma vez seu resumo de literatura. Era o terceiro. E, assim como os outros, não lhe agradava. Risos e vozes distantes vinham da cozinha, onde Gisele preparava o jantar, mas ali no quarto reinava uma inquietude abafada. A luz da luminária projetava sombras que dançavam sobre a escrivaninha, tão caótica quanto sua mente.

Frustrado, empurrou os papéis para o lado e foi até a mochila encostada no sofá. Retirou dali um envelope com o selo do Instituto Discere — os documentos entregues pela psicóloga, Dra. Eunice. Era apenas uma assinatura, mas pesava como se fosse uma sentença. Encara o papel com os olhos arregalados. Já havia ensaiado diversas vezes, mas a coragem ainda era uma visitante ausente.

Será que eu conseguiria forjar a assinatura dos meus pais?

A pergunta soou como um sussurro proibido. A resposta veio com clareza: não.

Valentim não era esse tipo de pessoa. Mesmo com medo, decidiu seguir pelo corredor silencioso, cruzando os quadros de família e os móveis de madeira nobre até alcançar a porta escura do escritório do pai.

Lá dentro, Victor Cardoso se recostava na poltrona de couro. Um homem de 48 anos, porte atlético, apesar das olheiras e das rugas de preocupação que haviam se aprofundado nos últimos anos. Os cabelos grisalhos davam a ele um ar respeitável, mas carregavam também o peso de quem tentava sustentar um império familiar sozinho. Era dono de uma rede de lojas de departamentos, mas desde a pandemia via seu império passar por uma instabilidade ou outro, mas sempre buscava se reeiventar.

— Pai, com licença. — A voz de Valentim quebrou o silêncio.

Victor tirou os óculos, esfregando os olhos como se quisesse enxergar melhor a realidade.

— Pode entrar, Valentim. Aconteceu algo?

— Mais ou menos... Eu tive uma conversa com a psicóloga da escola, a Dra. Eunice. Ela pediu para vocês assinarem este documento. — Contou o jovem, estendendo o papel.

Victor recolocou os óculos e leu, com atenção crescente.

— TDAH? Você tem TDAH?

— Ainda não é confirmado, mas eles querem investigar. — Explicou, sentando-se diante do pai.

Antes que Victor pudesse reagir, a porta se abriu suavemente.

— Querido, pedi para Rafaele trazer o jantar aqui. — Frida entrou com um sorriso calmo, vestindo um robe elegante de seda. Seus olhos se iluminaram ao ver o filho. — Filho, o que está fazendo aqui com o teu pai?

— Aparentemente, o teu filho tem TDAH, Frida. — Anunciou Victor, mostrando o documento.

— TDAH? Filho, você está doente?

— Não exatamente, mãe. É considerado um transtorno neurobiológico. Mas fiquem tranquilos, a escola está me acompanhando e vou passar por um especialista. — A voz de Valentim saiu firme, sem tremores.

O ambiente pesou por alguns instantes. Victor e Frida se entreolharam. Havia receio, culpa e surpresa nos olhos dos dois. Mas também havia amor — embora um amor que nem sempre soube se expressar.

Com gestos lentos, os dois assinaram o requerimento. Entregaram de volta ao filho, com um olhar que dizia mais do que qualquer palavra: sabemos que erramos. Estamos tentando entender.

Valentim saiu do escritório sentindo-se estranho. Parte aliviado, parte vulnerável. Pela primeira vez, havia falado de algo íntimo — e fora ouvido.

Assim que a porta se fechou, Victor largou os papéis e encarou o teto.

— Frida, e se a saúde mental do Valentim atrapalhar o futuro da empresa?

— Victor, que absurdo. — A esposa o olhou, indignada. — Valentim se esforça tanto. Às vezes, acho que exigimos demais dele. Está na hora de agirmos como pais, de verdade.

Victor respirou fundo. Seus olhos estavam cansados. Por dentro, ainda era o menino que sonhava em superar os irmãos e ser o orgulho do pai.

— Eu tenho medo, Frida. Medo de não deixar nada pro Valentim. Já revisei as planilhas da empresa várias vezes...

— Então por que não pede ajuda dos teus irmãos? — Sugeriu ela.

— Nunca. — Respondeu ríspido. — Eles vão me chamar de fracassado. Eu vou dar um jeito.

Frida se levantou, caminhou até a janela e olhou para o céu escurecido.

— Amanhã vou à escola. Quero falar com o conselho, entender tudo sobre esse diagnóstico. Já erramos demais com o nosso filho.

Victor apenas assentiu. O silêncio entre eles era pesado, mas necessário. Lá fora, os últimos vestígios do pôr do sol desapareciam no horizonte. Dentro da casa, talvez, um novo ciclo estivesse começando — mais sincero, mais humano.

***

Os corredores do Instituto Discere fervilhavam como formigueiros inquietos. Mochilas pendiam dos ombros, vozes se misturavam num burburinho contínuo, e os tênis dos alunos faziam ecoar passos apressados por entre as paredes brancas adornadas com murais de premiações acadêmicas e fotos das edições passadas da Gincana dos Quatro Elementos. As fardas azul-marinho dominavam o cenário como se todos fossem peças de um mesmo tabuleiro, exceto por uma figura que destoava com elegância rara.

No meio daquela confusão adolescente, uma mulher caminhava como se tivesse saído das páginas de uma revista de alta costura. Frida Almeida Cardoso — artista plástica renomada nos círculos culturais de São Paulo — parecia deslocada, não pela beleza, mas pela serenidade com que enfrentava o caos. A pele parda, radiante sob a iluminação artificial, contrastava com os cabelos encaracolados que caíam até os ombros em espirais perfeitamente moldadas. O vestido branco, fluido e minimalista, dava a impressão de que flutuava. Era uma peça tão cuidadosamente desenhada que desafiava qualquer uniformidade ao redor.

Frida estava claramente perdida. Os olhos castanhos percorriam os corredores com hesitação, segurando firme a bolsa de couro claro presa ao antebraço. Parecia buscar por um ponto fixo em meio ao labirinto colegial.

Foi Karla quem a notou primeiro. A jovem caminhava ao lado de Noah, ainda comentando sobre o trabalho de Geografia que haviam passado o fim de semana inteiro montando. Ao ver a ex-sogra, parou subitamente, o corpo tenso, a voz travada por um breve segundo de surpresa e desconforto.

— Frida? O que você está fazendo aqui? — Perguntou, a voz tentando disfarçar o susto com simpatia.

Frida sorriu, cordial.

— Estou procurando a sala do conselho. Pode me ajudar?

Karla hesitou, o olhar escapando para Noah como quem procura uma saída educada.

— Claro... a gente só vai entregar o trabalho de Geografia e...

— Karla, vai entregar o projeto. Eu levo a Sra. Cardoso até a sala do conselho, preciso deixar um documento lá também. — Interrompeu Noah, já ciente do constrangimento da amiga.

— Perfeito. Frida, um prazer te ver. O Noah vai te acompanhar. Obrigada, migo! — Disse Karla, aliviada, antes de desaparecer por entre os alunos.

Noah se transformou ao lado de Frida. Seu semblante juvenil se tornou mais sério, quase profissional. Falava com respeito e naturalidade, mencionando uma exposição de Frida no MASP e até uma instalação interativa que ela assinara em Berlim. Frida se mostrou surpreendida e encantada com o conhecimento do rapaz, e o trajeto até a sala do conselho ficou mais leve, recheado de comentários sobre arte e juventude.

O setor administrativo do Instituto Discere contrastava com o restante da escola. Ao chegarem à Sala do Conselho, se depararam com um ambiente imaculado, de paredes brancas e decoração minimalista. Quadros modernos, muitos deles do acervo da própria escola, decoravam as paredes. No canto oposto, uma pequena fonte criava o som suave de água em queda, como se quisesse acalmar os que ali entravam. O lugar cheirava a eucalipto e tinta fresca.

Frida agradeceu a companhia e se dirigiu à recepção, explicando que havia agendado uma reunião com a psicóloga da escola, Dra. Eunice. Noah, por sua vez, entregou à secretária um envelope.

— Eu queria protocolar essa solicitação. É um projeto voltado à saúde mental dos jovens LGBTQPIA+ aqui da escola. — Contou ele com firmeza, colocando o papel sobre o balcão.

A secretária, uma senhora simpática de óculos vermelhos, sorriu calorosamente.

— Querido, você pode me fazer um favor? — Pediu ela, cobrindo o fone com a mão. — Estou no telefone com a mãe de um aluno. Você pode ir até a sala de reunião ao lado da psicóloga e pegar a solicitação de criação de grupos? Está em cima da mesa, por favor.

Noah assentiu e seguiu pelos corredores mais silenciosos do setor administrativo. À sua esquerda, reconheceu a sala de atendimento psicológico, cujas janelas de vidro fosco impediam qualquer invasão de privacidade. Logo ao lado, a porta semiaberta da sala de reuniões o convidava a entrar — mas foi detido pelo som de vozes vindas de dentro.

— O Valentim está realmente doente? — Reconheceu a voz de Frida, tensa.

— Calma, Sra. Cardoso. — Respondeu a psicóloga com firmeza serena. — Estamos dando o melhor atendimento possível para o Valentim. O TDAH não é uma doença e podemos tratar de diversas maneiras. Só queremos um ambiente seguro para ele.

— Mas demorou tanto... é tudo culpa minha.

Houve uma pausa, longa o suficiente para que Noah sentisse o peso daquela declaração.

— Não existe culpado neste cenário, Sra. Cardoso. Não coloque esse fardo nas suas costas. — respondeu a Dra. Eunice, com voz firme, mas empática.

— TDAH? — Pensou Noah, o coração dando um pequeno salto. — Isso explica muita coisa.

Com delicadeza, ele entrou na sala de reunião, pegou o papel solicitado e saiu, deixando para trás não apenas a conversa interrompida, mas também uma nova peça no quebra-cabeça que era Valentim.

***

O auditório do Instituto Discere estava decorado com bandeirolas brancas. As mesas estavam espalhadas com folhas coloridas, tesouras, réguas e canetas. Era hora do "Desafio dos Aviões de Papel" — uma prova que misturava criatividade, precisão e habilidade, para a alegria dos professores que queriam ver os alunos "usando a cabeça" antes do início da prova de matemática.

Valentim chegou atrasado, por causa do teste que fez com a psicóloga da escola, e abriu um sorriso meio torto no rosto. Karla estava em uma das fileiras da plateia, torcendo discretamente. Ele sentou-se ao lado de Berenice, que já dobrava uma folha com maestria.

— Você acha que o fedelho vai conseguir voar com alguma dessas porcarias? — Provocou Valentim, sem disfarçar o desdém.

— Pode apostar que sim. — Respondeu Karla, soltando uma risada.

Noah entrou por uma das portas laterais, calmo, com o olhar de quem já havia vencido antes mesmo de começar. Sem cumprimentar ninguém, sentou-se na primeira fila do lado oposto, e tirou de sua mochila uma folha especial que, segundo boatos, era papel reciclado com uma tecnologia japonesa que prometia melhor aerodinâmica.

— Isso é trapaça. — Murmurou Valentim, já irritado.

Noah ouviu, se virou e piscou.

— Só é trapaça se você não souber dobrar direito.

O anúncio da professora Leda soou pelo microfone, chamando a atenção.

— Senhores e senhoras, iniciamos o Desafio dos Aviões de Papel! O objetivo é construir um avião que voe o mais longe possível. As equipes terão três tentativas e somarão pontos pela distância e pela precisão da aterrissagem.

O jogo começou e logo se transformou em uma disputa acirrada. Valentim usava toda a sua habilidade, mas Noah parecia estar sempre um passo à frente — seus aviões cortavam o ar com uma elegância quase insultante.

Em uma das tentativas, o avião de Valentim quase colidiu com o teto, desviou para o lado e caiu no chão, longe da linha de chegada. Noah lançou seu avião com um leve movimento de pulso, e ele voou rente à parede, aterrissando perfeito numa marcação desenhada no chão.

— É, fedelho. — Valentim sussurrou. — Você ganha essa.

Noah sorriu, e pela primeira vez, Valentim percebeu que havia algo mais do que rivalidade no olhar dele. Um brilho divertido, quase um convite para se aproximar.

Na saída, Noah passou perto e soltou:

— Melhor você ir se acostumando a perder, idoso.

Valentim respondeu com uma risada nervosa.

— Tá bom, tá bom. Mas só dessa vez, hein.

Enquanto os alunos voltavam para as salas, Karla se aproximou de Valentim.

— Ele é mesmo impossível, né?

— Impossível e irritante. — Concordou ele, olhando para o corredor vazio por onde Noah havia sumido.

***

Realmente, a cabeça de Valentim não estava no lugar. Desde o término com Karla, nada parecia no eixo. O diagnóstico recente de TDAH, ainda não totalmente assimilado, se misturava à ansiedade da Gincana dos Quatro Elementos, criando um emaranhado de pensamentos que o deixavam exausto. Mas o mais desconcertante era que tudo isso não vinha à mente separadamente — era como se as preocupações decidissem se juntar em coro e falar todas ao mesmo tempo.

Naquele fim de tarde chuvoso, ele aguardava o motorista da família na pequena guarita da escola, quando o céu desabou. A água caiu com violência, formando poças rápidas e transformando o pátio em um mar de reflexos acinzentados. Sem conseguir correr até o portão, Valentim ficou ilhado ali, observando os pingos grossos respingarem nas janelas de acrílico.

Foi então que Noah apareceu correndo pelo corredor lateral, o casaco do uniforme estendido sobre a cabeça como um escudo improvisado. Apesar da tentativa de se proteger, sua blusa branca estava colada ao corpo, revelando a silhueta magra, quase atlética, e a pele levemente bronzeada. Os cabelos molhados grudavam na testa, e havia algo de despreocupadamente belo naquele desleixo encharcado.

O espaço da guarita era estreito, feito para abrigar apenas uma pessoa com conforto, mas os dois se ajeitaram ali, encolhendo os ombros, dividindo o chão seco e o silêncio.

Por alguns segundos — ou talvez minutos — nenhum dos dois disse nada. O silêncio era quase palpável, preenchido apenas pelo som da chuva tamborilando no telhado. De tão perto, Valentim conseguiu ver cada detalhe do rosto de Noah. O traço do maxilar, os cílios longos, a curvatura suave do nariz. Era um rosto quase angelical, equilibrado entre a delicadeza e a firmeza. A pele, lisa e sem marcas, parecia convidar o toque, e Valentim se pegou desejando estender a mão.

Do outro lado, Noah também observava. E, aos poucos, os olhos com os quais sempre enxergara Valentim — olhos de rivalidade, de provocação — começaram a vê-lo diferente. Como se pela primeira vez ele realmente estivesse ali.

— Aerodinâmica. — Soltou Noah, com um sorriso leve, rompendo o silêncio e fazendo o coração de Valentim dar um salto inesperado.

— Oi?

— Não foi o papel diferenciado que me ajudou a vencer a prova do ar. Foi a aerodinâmica. Quando eu era pequeno, o meu pai me ensinou a fazer aviões de papel.

Ele falava com um sorriso sincero, sem arrogância. Um sorriso que desarmava.

— Você arrasou lá. Tem arrasado em todas as provas. — Comentou Valentim, num tom mais baixo do que queria. Quase admirado.

— Obrigado. — respondeu Noah, com os olhos brilhando, talvez pelo reflexo da chuva, talvez não.

Valentim hesitou, o coração batendo mais rápido, antes de soltar a pergunta que até aquele momento só existia dentro dele.

— Posso perguntar por que é um babaca comigo? Eu nunca te fiz nada. — Disse, se assustando com a própria coragem. — Digo, não que eu ligue, mas... eu nunca te fiz nada.

Noah baixou os olhos por um segundo, como se buscasse uma resposta que já sabia, mas não sabia como dizer.

— É complicado, gato. — murmurou ele, num tom quase íntimo. E então, com um gesto suave, esticou a mão e tirou um cílio preso na bochecha de Valentim. Os dedos passaram rápidos, mas deixaram um rastro de calor.

A buzina do carro cortou o momento como uma lâmina. Valentim deu um pulo, arrumou a postura, pigarreou e assentiu.

— Boa tarde, Noah.

Saiu quase apressado, como quem fugia de algo que ainda não entendia bem. Noah ficou ali, sozinho na guarita, com a chuva ainda caindo ao redor. Só então percebeu que seu próprio coração também batia mais forte.

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Comentários

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Criei essa conto só para comentar aqui kkkkk estou gostando muito do conto, você publica em outros lugares? tipo wattpad e tals?

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