Esse é o Episódio 2 da Série: "Entre Dois Silêncios". Caso ainda não tenha lido o Episódio 1 sugerimos começar por ele!
Três meses se passaram desde Bali. Três meses de um silêncio denso, que não era ausência de som, mas a presença de tudo o que não era dito.
A memória daquela noite não era uma lembrança; era um fantasma que vivia com eles. Estava no espaço extra entre seus corpos na cama. No jeito como Christian a observava quando pensava que ela não estava vendo. No modo como Fran segurava seu olhar por um segundo a mais que o necessário.
Naquela noite, a tela do laptop de Christian brilhava na penumbra da sala. E-mails de trabalho se acumulavam, mas sua atenção estava presa a uma única linha na caixa de entrada, não lida, mas memorizada.
De: Ethan.
Assunto: Obrigado pela última noite.
Um e-mail educado, formal, que ele recebeu semanas atrás. Um agradecimento pela hospitalidade. Mas, para Christian, cada palavra era um código. "Hospitalidade". "Última noite". Ele não precisava abrir. O conteúdo real não estava no texto, mas na ferida que ele cutucava dentro de si. Com um clique, fechou o notebook.
O silêncio voltou a reinar.
Fran estava deitada no sofá, vestindo uma camiseta dele que lhe caía como um vestido curto, e uma calcinha de algodão simples. Sem sutiã. A luz da luminária esculpia a curva de sua coxa, o contorno suave de seu seio sob o tecido. Ela virou a página do livro. O som do papel pareceu ecoar pela sala.
Christian se levantou, uma necessidade súbita de quebrar a inércia. Foi até a cozinha, pegou um copo d’água que não queria e ficou parado, encarando o reflexo distorcido na torneira. O cheiro dela estava no ar – um perfume suave de amêndoas e pele, o mesmo cheiro que impregnou o quarto de hotel em Bali. Aquilo não morreu. Estava apenas esperando.
Ele voltou para a sala, parando ao lado do sofá.
— Tá tarde… — disse, a voz soando oca.
Fran ergueu os olhos do livro. Não respondeu. Apenas o olhou. E naquele olhar, ele viu tudo de novo: o quarto de hotel, a cama desfeita, o corpo dela se movendo sob o de outro homem.
Christian sentou-se no braço do sofá, a ponta dos dedos roçando a pele da perna dela num gesto que queria parecer casual. Ela não se afastou. Não se moveu. Apenas aceitou o toque, o corpo dela um poço de calma.
Fran virou mais uma página, mas seus olhos não a acompanharam. Ela fechou o livro, colocando-o de lado com uma lentidão ritualística. Seu olhar se perdeu num ponto qualquer da parede à frente. E então, com uma voz baixa, quase um devaneio sensual, ela disse:
— Ele tinha o olhar calmo.
A frase, dita com uma inocência devastadora, atingiu Christian como um soco no estômago. Não era uma acusação. Era pior. Era uma constatação.
— O quê? — ele conseguiu perguntar.
Ela virou o rosto para ele, como se só agora se desse conta de sua presença. Mas não se corrigiu. Não se desculpou. Apenas deixou a frase pairando entre eles, carregada de significado. Os ombros dela relaxaram, como se o peso de guardar aquele pensamento finalmente tivesse sido aliviado.
Ele não aguentou. Levantou-se e foi para o quarto. Sozinho.
No escuro, deitou-se de lado sobre a cama, ainda vestido. A imagem dela em Bali o assaltou. Fran ajoelhada. Fran gemendo. Fran entregue. O desejo era uma dor física. Sua mão desceu, abriu o zíper da calça e ele começou a se tocar. Devagar. Masturbava-se em silêncio, com a humilhação deliciosa da memória.
A porta do quarto se abriu devagar, um ranger quase inaudível.
Uma voz suave, quase um sonho, cortou a escuridão.
— Ethan...?
Christian congelou. A mão parou. O coração disparou.
— É você? — a voz dela continuou, cheia de uma esperança frágil e perigosa. — Tenho te procurado...
Fran entrou no quarto. Não como sua esposa, mas como uma sonâmbula procurando por um fantasma. Ela o viu na cama, paralisado, e um sorriso lento, conhecedor, curvou seus lábios na penumbra. O jogo tinha começado, e as regras eram dela.
Ela se aproximou da cama, a camiseta balançando em volta de suas coxas nuas. Em vez de subir ao seu lado, ela se ajoelhou no colchão e, com uma fluidez hipnótica, passou uma perna por cima dele e sentou-se em seu colo, de frente para ele.
O peso dela era real, quente, pressionando-o contra o colchão. Seu membro, semi-ereto e exposto, estava agora preso entre o ventre dela e o dele. A intimidade era sufocante, absoluta.
Ela se inclinou, o rosto a centímetros do dele, o cabelo caindo como uma cortina entre eles e o mundo.
— Você gostou de ver, não gostou? — sussurrou,
Christian engoliu em seco, incapaz de mentir. Apenas assentiu.
Ela se inclinou, o rosto a centímetros do dele. O cheiro dela o envolveu.
— Então vê de novo.
Sua mão desceu e encontrou a dele, afastando-a. Os dedos dela, firmes e frios, envolveram seu membro. Não era um carinho. Era uma tomada de posse. Ela o olhou nos olhos, a escuridão dando ao seu rosto um ar de máscara impenetrável. E então, ela desferiu o golpe.
— Fica quieto… — sussurrou, a voz cortante. — ...Ethan.
O ar saiu dos pulmões de Christian. O nome. O nome proibido, dito por ela. A dor e o prazer se fundiram numa onda vertiginosa. Ela começou a masturbá-lo, o ritmo firme, clínico, como se sua mão fosse um instrumento e o corpo dele, um experimento.
— Você queria que eu gozasse por outro — ela continuou, a voz implacável, cada palavra uma faca. — Que eu pedisse pra ele o que nunca pedi pra você.
Christian ofegava, o corpo se arqueando.
— Ele era tão... grande dentro de mim. — A mão dela apertou a base dele. — Preenchia um espaço que eu nem sabia que estava vazio. Você gosta de me imaginar assim, sendo preenchida por ele?
Ele gemeu, um som que era metade agonia, metade êxtase.
— Ele não precisava perguntar. Ele simplesmente sabia. — O ritmo dela acelerou. — A mão dele nas minhas costas, a pressão... ele sabia exatamente como me fazer calar a boca e apenas sentir. Eu nunca gemi daquele jeito pra você, não é? Com ele... eu não conseguia me segurar. Eu era dele naquele momento. E você nos deu permissão.
Ele estava no limite, o corpo tremendo, a mente estilhaçada.
— E se eu dissesse... — ela parou por um instante, apenas segurando-o com força, forçando-o a olhar para ela — ...que às vezes, quando você me beija... eu ainda procuro o gosto dele?
Aquilo o quebrou. Um gemido rouco escapou de sua garganta. Ele ia gozar. Agora.
E então, ela parou.
Soltou-o. O silêncio absoluto caiu sobre eles.
Fran desceu da cama com a mesma calma com que subiu. Foi até a porta. Antes de sair, virou o rosto por sobre o ombro, os olhos brilhando na penumbra.
— Você insistiu tanto por isso, Christian. Por tanto tempo eu neguei. — Sua voz era fria, mas havia uma promessa de fogo nela. — Agora... espero que você aguente.
Ela fez uma pausa, deixando o peso das palavras afundar.
— Porque você acordou algo em mim que não vai voltar a dormir.
A porta se fechou.
Ele ficou ali. Na escuridão. Quebrado. E mais aceso do que nunca.
Porque aquilo não tinha morrido.
Tinha acabado de nascer.