Fui traído por quem eu mais amava

Um conto erótico de Arthur
Categoria: Heterossexual
Contém 5234 palavras
Data: 08/07/2025 21:58:11

Cresci numa casa simples, de paredes descascadas e quintal de terra batida, numa rua estreita da periferia. Não havia luxo, mas havia calor. Meu pai, Fabiano, era homem de poucas palavras e muitos gestos; sua voz grave me dava segurança, mesmo nos dias difíceis. Depois da morte da minha mãe no parto, foi ele, junto com Dona Lúcia — minha avó —, quem segurou o mundo no lugar.

Dona Lúcia era o centro da casa. Cozinhava com uma paciência de outro tempo, contava histórias no fim da tarde e sabia o momento exato de quando eu precisava de um colo ou de um puxão de orelha. Entre ela e meu pai, aprendi que o amor podia ser firme e silencioso. Era uma vida apertada, mas cheia de afeto — e, por muitos anos, bastava.

Quando eu tinha apenas dez anos, a vida, em sua crueldade silenciosa, decidiu testar a resiliência daquela pequena família. Dona Lúcia adoeceu. A doença foi rápida e cruel, uma sombra que se alastrou em seu corpo frágil, levando-a em poucos meses, deixando um vazio imenso. A perda foi um golpe devastador, um terremoto que abalou as estruturas da casa e da minha alma, deixando-me desorientado. O silêncio na casa se tornou mais pesado, um vazio ensurdecedor que antes era preenchido pela voz suave da minha avó, por suas canções de ninar e suas histórias. O riso do meu pai, antes tão fácil e contagiante, agora era mais contido, um som abafado pela dor, um eco da tristeza que nos envolvia. Mas a dor, de alguma forma misteriosa, uniu pai e filho ainda mais. Meu pai, um homem de poucas palavras, mas de um coração imenso e uma força inabalável, assumiu o papel de pai e mãe, de amigo e confidente. Nós nos tornamos inseparáveis, uma dupla improvável que encontrava conforto na presença um do outro, na cumplicidade dos olhares e na força dos abraços, construindo um novo alicerce sobre as ruínas do passado.

Os anos se passaram, e eu cresci, transformando-me em um jovem alto, de ombros largos e um olhar penetrante, que herdara a determinação inabalável do meu pai e a sensibilidade aguçada da minha avó. Aos 21 anos, a minha vida tomou um novo rumo, um desvio inesperado que me levaria a um destino que eu jamais poderia prever, um caminho que se revelaria tortuoso e cheio de armadilhas. Foi quando eu conheci Isabela. Ela era uma estudante de artes, com cabelos castanhos que caíam em ondas sobre os ombros, como uma cascata de seda, e um sorriso que iluminava qualquer ambiente, dissipando as sombras e trazendo luz. Seus olhos, de um verde intenso como esmeraldas, eram curiosos e cheios de vida, e sua risada, um som melodioso que eu nunca me cansava de ouvir. Tinha um corpo esguio, com as curvas nos lugares certos, uma bunda arrebitada e seios que enchiam a palma da minha mão com perfeição.

Nós nos conhecemos em uma exposição de arte local, um evento que eu achava um tanto quanto pretensioso, mas que se revelou um divisor de águas na minha vida. Quando os meus olhos encontraram os de Isabela, algo mudou. Foi um instante, um clique, uma conexão instantânea que me fez esquecer o cansaço e a pressa, o barulho e a agitação. Nós conversamos por horas, sobre arte, sobre a faculdade, sobre sonhos e aspirações, sobre a complexidade da existência e a beleza das coisas simples. A cada palavra, eu me sentia mais e mais atraído por aquela mulher vibrante, inteligente e cheia de paixão, uma força da natureza que me cativava.

O namoro começou de forma intensa, como um rio que transborda. Ela passava os fins de semana na nossa casa, pois não tinha um bom relacionamento com os pais, então dividia um quarto com uma amiga. Meu pai, que sempre foi reservado e um tanto quanto fechado, abriu-se para Isabela com uma facilidade surpreendente, apoiando nosso namoro. Ele via nela a alegria e a vivacidade que haviam se perdido com a morte da minha avó, um raio de sol em meio à escuridão que ainda pairava sobre a casa. Isabela se tornou parte da família, e a casa, antes preenchida apenas pela presença de pai e filho, agora irradiava a energia contagiante de um novo amor, de uma nova esperança.

Havia uma urgência entre nós que não se explicava. Estávamos juntos há pouco tempo, mas a intensidade parecia de anos. Nossos encontros tinham algo de entrega e descontrole — como se o corpo reconhecesse antes da razão.

Cada toque carregava uma familiaridade quase desconcertante. Era como se nossas peles conversassem. O desejo não era só físico: era uma necessidade de estar, de se fundir, de desaparecer no outro por alguns instantes.

Mesmo nos silêncios, havia ardor. Mesmo nas conversas mais banais, um fio invisível nos puxava para perto. Com ela, eu não era apenas amado — eu era inteiro, completo de um jeito que assustava. Tinha certeza de que aquilo ia deixar marca. E, no fundo, eu queria que deixasse.

Quando meu pai estava fora e tínhamos a casa só pra gente, tudo ficava mais fácil — mais livre. A tensão entre nós não era mais novidade. Já tínhamos nos tocado, nos provado, conhecido cada canto um do outro. Mas aquela noite… aquela noite ficou.

A chuva batia forte nos vidros, abafando o som do mundo. Estávamos no sofá quando ela sentou no meu colo como quem já sabia o que queria — sem vergonha, sem cerimônia. O beijo veio direto, urgente, molhado. Ela gemeu baixo quando eu segurei sua nuca e puxei seus cabelos. A gente se conhecia o bastante pra não precisar pedir.

Levei ela pro quarto, tropeçando nas roupas pelo caminho. Cada peça arrancada era um atraso. Ela já estava molhada quando deitei ela na cama. Passei a língua pela barriga até chegar na buceta. Lambi com vontade, com foco. Ela sabia exatamente como guiar minha cabeça, quando apertar as coxas, quando me deixar usar os dedos também. Gritou meu nome quando gozou, e eu quis rir de orgulho, mas estava duro demais pra qualquer outra coisa.

Ela me puxou por cima dela e disse:

— Entra. Agora.

Obedeci. Sempre obedecia. A penetrei com vontade e fundo, do jeito que ela gostava. Ela se contorcia, mordia o ombro, dizia “mais, mais” com a voz embargada. A cama balançava no ritmo dos nossos corpos. O cheiro dela me deixava tonto.

Viramos. Ela subiu em mim. Eu deixei as mãos soltas, só admirando. As curvas, os seios balançando, o jeito como ela me olhava por cima, mandando e gozando ao mesmo tempo. Era ela no controle, e eu adorava me perder ali.

O gozo veio forte. Ela apertou minha cintura com as pernas, cravando as unhas nos meus ombros. Jorramos juntos, suados, tremendo. Depois ela deitou no meu peito, como sempre fazia. Ficamos em silêncio por um tempo.

— Você vai me amar para sempre? — ela perguntou, de olhos fechados.

Respondi sem pensar:

— É claro que eu vou. Você é a mulher da minha vida.

Ela não disse nada. Só deu um sorriso terno e me abraçou mais forte.

A minha vida parecia um conto de fadas, um sonho do qual eu nunca queria acordar, uma utopia que eu acreditava ser eterna. Eu tinha um pai que me amava incondicionalmente, uma namorada que me completava em todos os sentidos e um futuro promissor pela frente, repleto de possibilidades, de planos e de esperanças.

Mas a felicidade, como eu aprenderia da forma mais dolorosa, é um estado efêmero, uma borboleta que pousa por um instante e logo alça voo, deixando apenas a saudade de sua beleza. E o destino, um mestre cruel que adora pregar peças, estava prestes a mostrar sua face mais sombria, a revelar sua verdadeira natureza. A primeira rachadura no meu mundo perfeito surgiu de forma inesperada, como um trovão em céu azul, anunciando a tempestade que se aproximava, uma tempestade que devastaria tudo em seu caminho.

Meu pai, que trabalhava em uma pequena serralheria na cidade, um ofício que ele dominava com maestria, com a experiência de anos de trabalho árduo, sofreu um acidente. Uma máquina antiga, que ele conhecia como a palma da mão, que ele havia operado por décadas, falhou, e um pedaço de metal o atingiu em cheio, com uma força brutal. Ele quebrou o quadril e ficou paralisado da cintura para baixo, uma sentença cruel que o aprisionaria em uma cadeira de rodas por algum tempo, dependente de outros para as tarefas mais básicas. A notícia me atingiu como um choque, quebrando minha paz e segurança. O homem forte que eu conhecia, meu pilar, agora estava preso a uma cama, dependente e com o olhar vazio. O impacto foi grande, a dor profunda, um silêncio pesado que eu não sabia como expressar.

Isabela, com sua natureza prestativa e solidária, prontificou-se a ajudar, como um anjo da guarda que surge nos momentos de maior desespero, oferecendo consolo e apoio. Ela passava horas no hospital, depois na nossa casa, cuidando do meu pai com uma dedicação que me comovia, que me fazia admirá-la ainda mais. Ela o ajudava no banho, na alimentação, nas sessões de fisioterapia, em tudo o que ele precisava, com uma paciência e um carinho que pareciam inesgotáveis. Eu, que estava dividido entre o trabalho e os cuidados com o meu pai, sentia-me grato pela presença de Isabela, porque assim não ficava tão sobrecarregado e conseguia dar uma assistência melhor ao meu pai. Com o tempo, notei que Isabela e meu pai estavam mais próximos. Trocas de olhares demorados, risadas baixas, piadas que eu não entendia e que cessavam quando eu chegava. Às vezes sentia uma pontada de ciúmes, mas sabia que era por puro afeto, nada que preocupasse. Pareciam estar criando uma amizade — algo novo, leve, que eu até achava bom para os dois.

Em uma sexta-feira calorenta, voltei mais cedo do trabalho naquela noite, exausto, só querendo tomar banho e relaxar. A casa estava bem silenciosa, parecia que Isabela não estava. Mas, ao passar pelo corredor, ouvi sons abafados vindo do quarto do meu pai. A porta estava entreaberta e, por impulso, espiei.

O que vi me congelou. Isabela estava sobre ele, nua, seus corpos grudados, se movendo em um ritmo frenético. Ele puxava o cabelo dela com força, os dedos entrelaçados na nuca dela, como quem exige domínio. A mão apertava o lençol com força, enquanto o quadril dele se movimentava contra o dela, um balanço marcado e urgente.

O suor escorria pela pele dela, brilhando sob a luz fraca, enquanto ela arqueava as costas, mordia o lábio inferior, com o olhar feroz e ao mesmo tempo desesperado. O pau dele entrava e saía da bucetinha dela num vai e vem brutal e incessante, cada investida fazendo-a gemer alto, misturando prazer e intensidade.

Por um instante, nossos olhos se cruzaram. Foi como se o mundo parasse. O choque me imobilizou. Eu não consegui desviar o olhar, mesmo que tudo dentro de mim implorasse para fugir. Eu sentia a raiva subir, o peito apertar, e a dor que queimava, cortante, rasgando tudo.

Quando perceberam minha presença, eles se separaram num instante. O rosto de Isabela ficou pálido, os olhos arregalados de culpa. Meu pai desviou o olhar, perdido, sem palavras. O silêncio que se seguiu esmagou tudo.

Eu não sabia se chorava, gritava ou simplesmente morria por dentro.

— Como puderam fazer isso comigo? — minha voz saiu cortante, cheia de dor e raiva, atingindo os dois como facas. — Comigo? Com a família que eu sempre valorizei? Com o meu pai, meu porto seguro?

Meu pai tentou falar, mas a voz falhou, embargada pelo choro.

— Filho... eu... não foi planejado... — ele gaguejou, os olhos marejados — Foi um sentimento que surgiu... eu estava sozinho, e Isabela esteve ao meu lado... A gente... a gente não quis magoar você... não queria...

Isabela, com lágrimas nos olhos, engoliu a culpa.

— Arthur, por favor... me escuta. Eu não queria te ferir. Nada foi premeditado. Aconteceu. O coração não escolhe quem amar... foi um erro, um deslize...

Eu balancei a cabeça, sentindo o peito arder.

— Erro? Deslize? Vocês destruíram tudo! — gritei, sentindo a dor física apertar meu peito — Eu confiava em vocês! Em vocês dois!

Olhei para Isabela e depois para meu pai, vendo o pesar e a vergonha estampados nos rostos deles.

— Como podem pedir perdão depois de me jogar no chão assim? — minha voz quebrou. — Não quero desculpas vazias.

Meu pai tentou se aproximar, mas eu recuei.

— Fique longe de mim! — disse, com lágrimas que eu tentava conter. — Vocês me traíram.

Isabela, soluçando, falou num fio de voz:

— Arthur, eu amo você... não foi só isso... eu juro...

Mas eu não quis ouvir. O vazio crescia dentro de mim, esmagando tudo. Lembrei da minha mãe que nunca conheci, símbolo de pureza que parecia rir da minha inocência. Pensei na minha avó, que me ensinou o valor da família, que certamente estaria decepcionada.

— Eu não consigo mais olhar para vocês... — falei, a voz carregada — Essa casa não é mais minha.

Peguei uma mochila, atirei roupas dentro, qualquer coisa, sem pensar.

— Não, Arthur, por favor, fica! — Isabela implorou, mas eu não olhei para trás.

Sai pela porta, sentindo as vozes deles se perderem no ar, súplicas que não consegui ouvir. A noite me engoliu, e eu queria esquecer tudo — apagar aquela dor, aquela traição que me queimava por dentro.

Eu fui para a casa do Lucas, meu amigo de infância e meu refúgio. Ele não fazia perguntas, só estava lá, ouvindo, oferecendo apoio sem julgamentos. Os dias viraram semanas de raiva, tristeza e um vazio que parecia não ter fim. Não conseguia dormir, não conseguia comer; a traição me perseguia como um fantasma.

Depois daquela noite, tudo terminou de vez. Mais de um ano se passou desde que descobri a traição, e o silêncio entre nós nunca mais foi quebrado.

Foi pelas redes sociais que eu soube do casamento deles. Um post simples, uma foto sorridente com a legenda feliz, foi um soco no estômago. Eles tinham unido suas vidas oficialmente — a prova de que eu havia sido substituído, descartado.

Anos depois, descobri que tinham tido um filho. Um meio-irmão que eu nunca conheceria, um símbolo vivo do que foi roubado de mim.

Durante esses anos, meu pai nunca desistiu de tentar se reaproximar, mandando mensagens e presentes, mas todos foram rejeitados. Eu não queria nada deles. A ferida era profunda demais, e o perdão não existia no meu coração.

Eu tentei seguir em frente, mas a traição grudou na minha pele como uma sombra que não sai. Fui para a balada, conheci umas garotas, fiz umas transas rápidas, sem pensar, sem sentir. O sexo era só um jeito de calar o que eu tinha dentro, não uma cura.

Teve a Lara, que tentou algo mais, mas eu não consegui ir além de beijos, transas e conversas rasas. Ela queria algo real, e eu só tinha medo, raiva e vazio. Ela desistiu depois de 3 meses.

A Júlia, da faculdade, tentou puxar papo, marcar algo. Eu aceitei por educação, mas não tinha interesse. Era como se a minha cabeça estivesse em outro lugar, sempre voltando para aquilo que perdi.

Lucas me olhava de lado, sem paciência pra minhas desculpas.

— Vai dizer que você nunca gostou de nenhuma? — ele perguntou seco.

— Gostar? Gostar eu gostei. — eu respondi, quase sem voz. — É tudo uma mistura de medo, raiva e... cansaço. Não quero me machucar de novo.

— Mas não vai se curar se ficar se fechando — ele rebateu.

Eu ri, um riso sem graça.

— Quem disse que eu quero me curar? Às vezes acho que tô mais confortável na dor.

Lucas ficou em silêncio. Eu sabia que ele queria ajudar, mas não tinha o que dizer.

Eu me tornei um estranho pra mim mesmo, incapaz de confiar, de amar, preso num ciclo onde o vazio só aumentava.

Certo dia, Lucas estendeu uma carta direcionada para mim. Era meu pai, mais uma vez, a primeira vez tentando falar comigo por carta. Eu hesitei por dias antes de abrir. No fundo, sabia que ele carregava um peso enorme — uma culpa que parecia maior do que ele mesmo. Eu queria saber o que estava escrito ali, mas relutava.

Quando finalmente li, as palavras dele doíam na pele, cruas e sinceras, marcadas por um arrependimento que parecia sincero demais para ignorar, mas ainda assim impossível de apagar.

Carta de Fabiano:

“Meu querido Arthur,

Quero que saiba que te amo profundamente, mais do que qualquer palavra pode expressar.

Sei que causei uma dor imensa, e não há perdão que possa apagar o que fiz. Eu falhei como pai, e carrego essa culpa todos os dias.

Não quero justificar nada, porque não há desculpa que valha a traição que você viu. Só posso dizer que me arrependo de verdade, de todo coração.

Você sempre foi e sempre será a parte mais importante da minha vida, e a dor de te magoar é algo que me destrói por dentro.

Sei que talvez nunca consiga seu perdão, mas desejo que você encontre paz e felicidade, longe da sombra que eu deixei. O sentimento que surgiu entre mim e Isabela foi verdadeiro, é verdadeiro, mas o preço que pagamos é um peso que me corrói todos os dias.

Cuide-se, meu filho.

Com amor e arrependimento,

Fabiano”

Fechei a carta com as mãos trêmulas, o papel amassado entre os dedos. As palavras do meu pai ecoavam dentro de mim, doloridas. Pela primeira vez em anos, uma dúvida inquietante começou a crescer no meu peito: e se eu tentasse perdoar? Quando pensava no assunto, parecia impossível, mas e se eu tentasse pelo menos? Aquela ponte parecia distante demais, e talvez eu nunca conseguisse atravessá-la por completo, mas a ideia de tentar me trouxe uma fagulha que eu nem sabia que ainda existia.

Surpreendentemente, percebi que sentia falta do meu pai — não daquele homem perfeito e invencível que eu conheci, mas da presença dele, mesmo marcada por tudo o que aconteceu. E, por mais que eu quisesse odiar Isabela com toda a força, tudo o que vinha à minha mente era uma dor enorme, um vazio que parecia sugar tudo de mim. A raiva ainda existia, claro, mas era uma sombra distante diante daquela tristeza profunda, da desilusão que me corrói até hoje. A traição deixou uma ferida aberta que não parava de doer.

Nas semanas seguintes, aquela carta virou um peso e, ao mesmo tempo, um estranho conforto. Eu a relia em silêncio, tentando entender meus próprios sentimentos, debatendo entre a vontade de me proteger e o desejo de encontrar algum tipo de paz, mesmo que fosse apenas um pouco. O tempo parecia passar devagar, como se meu coração estivesse preso num limbo entre o que foi e o que poderia ter sido.

E então, numa tarde qualquer, o telefone tocou. A voz do outro lado, pesada e triste, anunciou a notícia que me fez chegar no fundo do poço: meu pai havia falecido.

Senti o chão sumir sob meus pés. Tudo o que me invadiu foi uma mistura confusa de dor, arrependimento e um vazio ainda maior. A chance que eu começava a imaginar — mesmo que pequena e frágil — agora parecia uma oportunidade perdida, uma porta que nunca teria coragem de abrir.

O funeral do meu pai foi um turbilhão de emoções para mim, uma mistura caótica de dor, arrependimento e uma estranha sensação de estar de volta ao lugar que um dia foi o meu lar, mas que agora parecia tão distante e modificado. A pequena igreja, onde eu havia sido batizado e onde a minha avó foi velada, estava lotada. Rostos conhecidos da infância, vizinhos, amigos do meu pai, todos ali para prestar suas últimas homenagens. No meio da multidão de rostos conhecidos e desconhecidos, eu a vi. Isabela. O tempo havia sido gentil com ela, esculpindo em seu rosto traços de maturidade e uma beleza mais serena, mas a tristeza em seus olhos, um verde outrora vibrante, agora opaco, era inegável. Ela estava diferente, mais madura, com uma aura de melancolia que a tornava quase irreconhecível, uma sombra do que um dia foi. Ao lado dela, um menino de uns sete anos, com os mesmos olhos expressivos e o sorriso travesso do meu pai, olhava para mim com uma curiosidade inocente, uma pureza que contrastava com a dor que me cercava. Era o meu meio-irmão, o pequeno Daniel, o filho do meu pai e de Isabela, um elo inesperado com um passado que eu tentava desesperadamente esquecer.

O contato inicial foi formal, distante, ditado pela burocracia fria do inventário. Reuniões com advogados em escritórios impessoais, pilhas de documentos a serem assinados, decisões financeiras e jurídicas a serem tomadas. Eu e Isabela nos víamos em um ambiente estritamente profissional, discutindo bens e heranças, evitando qualquer menção ao passado doloroso que nos unia.

As conversas eram curtas, objetivas, desprovidas de qualquer emoção. Mas a presença do menino, o pequeno Daniel, começou a quebrar o gelo, a derreter a barreira de ressentimento que eu havia construído. Daniel, com sua energia contagiante, sua curiosidade insaciável e sua adoração instantânea por mim, agia como uma ponte entre nós dois. Ele perguntava sobre o pai, sobre mim, sobre as histórias que meu pai contava, e eu, sem perceber, me via respondendo, contando histórias, e até mesmo sorrindo, um sorriso que há muito não aparecia no meu rosto.

O luto, de um jeito estranho e quase cruel, nos aproximou.

A dor de lidar com a morte de alguém que, para mim, era ao mesmo tempo figura paterna e fantasma, me obrigou a encarar não só o passado, mas também Isabela. Era impossível fugir. Ela estava lá, firme, segurando papéis, falando com advogados, resolvendo o que eu não tinha cabeça pra resolver, tentando seguir em frente. Não houve reconciliação, nem gestos afetivos. Mas havia respeito. Um reconhecimento de que, por mais destruídos que estivéssemos, tínhamos que atravessar aquilo juntos.

Conforme os meses passavam, começamos com conversas práticas. “Você viu o e-mail do contador?”, “O Daniel vai ficar com a tia Renata essa semana”, “A chave da casa está com você ou comigo?” Coisas assim. Mas aos poucos, a formalidade foi amolecendo, dando lugar a comentários mais pessoais, a perguntas não tão burocráticas.

— Você ainda tá trabalhando com design? — ela me perguntou certa vez, num tom leve, quase casual.

— Tô, sim. Fazendo uns freelas, e agora com um estúdio fixo. Nada muito grande — respondi. — E você? Parou de dar aula?

— Só nos primeiros meses do Daniel. Agora voltei. Meio período.

Falávamos como dois conhecidos que dividem lembranças incômodas. E, com o tempo, sem perceber, começamos a nos escutar de verdade.

Numa noite especialmente cansativa, fui com Isabela até a antiga casa do meu pai. A casa estava vazia, ecoando lembranças. Daniel havia ficado na casa da tia, o que nos deu algo raro: silêncio. Ela abriu uma garrafa de vinho que encontrou esquecida na despensa.

— Aceita? — ela perguntou, segurando duas taças.

Assenti com a cabeça. O copo estava gelado na minha mão.

— Lembra da primeira vez que você veio aqui comigo? — ela perguntou, com um meio sorriso melancólico. — A gente riu tanto daquela torneira que espirrava água pra cima...

Assenti de novo. A lembrança me acertou no peito.

— Foi antes de tudo... — acrescentei.

Ela olhou para o chão, depois para mim.

— Muito antes.

A primeira taça virou a segunda. E a conversa, antes controlada, começou a escapar pelas bordas. Tocamos em assuntos que evitamos por anos.

— Eu tentei odiar você, Isabela. De verdade. — falei, olhando pra frente, sem encará-la. — Mas sempre que eu pensava em você... o que vinha não era ódio. Era dor.

Ela mordeu o lábio, os olhos marejados.

— Eu sei. Eu senti isso também. E o pior é que... mesmo depois de tudo, uma parte de mim ainda queria te proteger. Te poupar disso. Mas eu falhei. Em tudo.

— Você me destruiu. Vocês dois. Eu nunca mais consegui confiar em ninguém. — minha voz saiu baixa, quase como um sussurro.

— Eu não vou tentar justificar. Nem explicar. Só queria que você soubesse que... eu carrego isso todos os dias. Desde que aconteceu. — ela respirou fundo, como se cada palavra exigisse esforço. — Fabiano... ele tava quebrado. E eu também. Eu me perdi.

Ficamos em silêncio. A garrafa já estava vazia.

— Ele te amava — ela disse, quase num sussurro. — Nunca deixou de te amar. Nem por um segundo.

Eu fechei os olhos. Aquilo doeu.

— Eu queria conseguir perdoar. Queria mesmo. Só... não sei se sou capaz.

— Eu entendo.

O silêncio que se seguiu não foi desconfortável. Foi denso. Como se, por alguns minutos, tudo o que havíamos carregado por anos estivesse suspenso ali, entre nós dois, sem peso. Só presença.

Ali, naquela casa vazia, cercado por móveis cobertos por lençóis e lembranças cobertas por mágoa, senti que algo dentro de mim começava a ceder. Ainda longe do perdão. Mas talvez perto, pela primeira vez, de tentar entender.

O vinho já passava da segunda taça quando o silêncio entre nós mudou de peso. Já não era o silêncio do constrangimento, nem o da dor contida — era outro, denso de lembrança e desejo. Nossos olhos se encontraram e, naquele instante, algo antigo reacendeu. A mesma coisa que um dia nos uniu ainda estava lá, dormente, esperando um motivo para voltar à superfície.

Ela encostou a taça na mesa e disse, quase num sussurro:

— Eu não sei como a gente chegou até aqui.

— Nem eu — respondi, mas não me afastei quando ela se aproximou.

O toque dela na minha mão foi leve, mas me atravessou como um choque. Levantei a mão e encostei de leve no rosto dela. Ela fechou os olhos e se encostou na minha palma. A aproximação foi lenta, como se ainda estivéssemos testando os limites. O beijo veio carregado de tudo: mágoa, saudade, culpa, vontade. Um beijo longo, apertado, que logo perdeu a hesitação.

Ela me puxou pela camisa, os dedos trêmulos abrindo os botões com urgência. Eu a encostei na parede, a respiração dela descompassada no meu ouvido. Minhas mãos deslizaram por baixo da blusa, e logo ela estava nua da cintura pra cima. Os seios arfavam, sensíveis ao toque. Ela gemeu quando minha boca alcançou a pele quente.

— Eu nunca... deixei de lembrar — ela disse, quase engasgando, enquanto segurava meus ombros com força.

Levei a mão por baixo da saia. Ela já estava molhada. Me ajoelhei diante dela e a encarei por um instante, antes de passar a língua entre suas coxas e subir até sua buceta. Ela se segurou na maçaneta da porta, arfando.

— Porra… Isso..... — ela sussurrou, os olhos fechados.

Depois me puxou de volta, e nos beijamos de novo, com mais fome, com mais urgência. As roupas foram caindo pelo chão. A pele dela, que um dia foi meu abrigo, parecia ainda se lembrar de mim. Eu a deitei no sofá, e ela abriu as pernas devagar. Me ajoelhei sobre ela, e nossos corpos se tocaram como se nunca tivessem se separado.

Penetrei-a com calma, e ela arqueou o corpo, gemendo alto. Seus olhos grudados nos meus. Nossos movimentos eram lentos no começo, depois intensos. Ela arranhava minhas costas, puxava meu cabelo, gemia meu nome entre soluços. Eu apertava suas coxas, tomava seus seios com as mãos, e sussurrava coisas que nem sabia que ainda estavam dentro de mim.

— Me perdoa... — ela disse, com a voz quebrada.

— Eu não sei se consigo... — respondi, mas continuei dentro dela, como se os corpos tentassem resolver o que as palavras não conseguiam.

O prazer veio misturado ao peso do que poderíamos ter sido, mas não fomos. Ela tremeu sob mim, gozando, e me puxou forte contra si, até que eu também me desfizesse dentro dela, num gemido rouco que parecia um lamento.

Ficamos em silêncio depois, deitados um ao lado do outro, os corpos suados, os olhos perdidos no teto.

Nenhum de nós falou em amor.

Nenhum de nós falou em recomeço.

Só respiramos juntos por um tempo, como quem divide o peso de um luto antigo.

E naquele momento, confuso, íntimo, impossível de definir, a dor pareceu suportável — mas o futuro continuava uma incógnita.

Após aquela noite, a relação entre nós ficou estranha, um silêncio constrangedor pairava entre nós, quebrado apenas pela presença inocente de Daniel, que continuava a me adorar.

— Você vai voltar amanhã? — ele perguntava, enquanto me mostrava algum desenho novo ou queria ajuda para montar um quebra-cabeça.

— Se a mamãe deixar, volto sim — eu respondia, sorrindo. E ela apenas observava, sempre silenciosa nesses momentos, os olhos baixos.

Uma noite, depois de colocá-lo na cama, ficamos os dois na sala, o abajur aceso, o mesmo sofá onde tudo havia acontecido dias antes. Eu fingia mexer no celular. Ela, de braços cruzados, observava o escuro pela janela.

— A gente precisa conversar — ela disse, sem me olhar.

Eu larguei o celular no braço do sofá.

—Eu sei.

Houve um breve silêncio. Ela respirou fundo antes de continuar.

— Eu não esperava... aquilo. Juro. Não planejei nada. Mas também não me arrependo.

— Eu também não sei o que foi — respondi. — Mas foi real. Isso, pelo menos, eu sei.

Ela virou o rosto pra mim. Estava com os olhos vermelhos, como se já tivesse chorado antes mesmo de abrir a boca.

— Eu ainda sinto algo por você, Arthur. Achei que isso tivesse morrido… que a culpa, a dor, o tempo, tivessem apagado. Mas não. Só... adormeceu. E agora tá acordando, e eu não sei o que fazer com isso.

Fiquei em silêncio por um momento, tentando encontrar palavras que não soassem falsas ou apressadas. Então falei, com calma:

— Eu também sinto algo. Mas não é como antes. Não aquela coisa que cegava. É outra coisa agora… mais... pesada. Tem dor no meio, tem raiva, tem dúvida.

Ela assentiu, com os olhos marejando.

— Eu não quero que você me odeie pro resto da vida.

— Eu não odeio você, Isabela. Já tentei. Mas não odeio. Quando penso em você, o que sinto é... um aperto. Um vazio estranho. E, ultimamente, também uma vontade. De entender. De... talvez perdoar.

Ela caminhou devagar até mim, sentou-se ao meu lado, sem encostar. Os dedos mexiam nervosamente no próprio joelho.

— Você acha que algum dia a gente conseguiria... tentar de novo?

Suspirei. A pergunta ficou no ar por um tempo. Então respondi, sem olhar diretamente pra ela:

— Eu não sei. Mas acho que a gente pode... continuar se falando. Ver no que dá. Um passo de cada vez.

Ela assentiu. Um sorriso tímido escapou no canto da boca.

— Um passo de cada vez — repetiu, baixinho.

Naquela noite, não houve beijo. Nem carícia. Só uma presença mútua. A ferida ainda estava aberta. Mas talvez, pela primeira vez, eu não quisesse mais vê-la sangrar.

O dilema era imenso, um abismo que se abria diante de nós. Como superar o passado? Como lidar com o fato de Isabela ter sido mulher do meu pai, era mãe do meu meio-irmão? O julgamento da sociedade, os olhares curiosos, os sussurros maldosos. Eu estava confuso, com o coração dividido entre o desejo de curar as feridas, de dar uma nova chance ao amor, e a necessidade de me proteger de mais dor, de mais decepções. Eu me via em uma encruzilhada, pesando os prós e os contras, tentando entender o que o meu coração realmente queria, o que era certo e o que era errado.

As feridas ainda doíam, mas talvez, apenas talvez, o amor pudesse ser a cura, a ponte para fora do abismo, a promessa de um futuro incerto, mas possível.

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Comentários

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Muito bom o conto,com muito mais carga dramática do que erótica. O pai imobilizado tava bem ativo pra quem sofrera uma perda locomotiva dos membros interiores,mas isso é secundário. O tal do Fabiano sofreu a vida toda e a relação entre o pai e a amada consumou sua via crucis. História carregada.

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Talvez um detalhe que eu precise deixar mais claro na história. Ele não perdeu o movimento dos membros inferiores, ele fraturou a quadril, a cadeira de rodas foi só durante a recuperação, durante algum tempo, obg pelo toque.

Aliás, me questiono se eu consegui deixar claro a passagem de tempo na história, foi uma coisa que me esforcei muito e não sei se gostei tanto do resultado

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Nossa isto está longe de um ser conto erótico, senti foi o mesmo que o autor. Choro angústia raiva. Credo.. kkkkk

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Eu tenho muita preguiça de escrever, mas gostei muito nessa dinâmica de desafios desse site. O objetivo desse desafio era um personagem que chegou no fundo do poço hahaha

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Esse conto e muito parecido com uma história de podcast do Não Inviabilize.

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Não só parecido,quando eu vi esse desafio do Fundo do Poço, lembrei na hora dessa história que me deixou bem impactado e tentei transformá-la num conto erótico

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Banho de Esponja, o nome do episódio do Não Inviabilize

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Muito bom tomara que tenha continuação, Até porque uma vez traidora assumida é dificil mudar.

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bem concordo com o paulo se ele ficar com ela o pesso quem vai caregar e ele eu torço pra ele seguir em frente.

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Foto de perfil de Paulo Taxista MG

Esse conto foi intenso essa traição não só quebrou o Arthur, mais deixou o Fabiano e a Isabela presos no maior erro da vida deles.

Pra mim o Arthur deve perdoar mais não deve mais se envolver com ela, pois isso vai ser pior para ele. Ele só deve se encontrar com o irmão, pois ela inocente em tudo que o Fabiano e a Isabela fizeram, se ficar com ela não vai ser feliz o suficiente, ele precisa seguir em frente.

Esse conto me fez lembrar de um relato do Reddit, onde a namorada do Op traiu ele com o pai, ele foi embora mudou até o sobrenome e foi viver a vida dele longe da cidade onde ele vivia, após ele ir embora eles foram ostracizados por todos da cidade.

Após algum tempo o pai dele morreu, e ele só ficou sabendo através de uma carta que ele deixou pra ele. Quem conta o relato e o sogro dele depois de ficar sabendo da história.

Ele depois pede conversar com ele, e após a conversa ele pede a filha dele em casamento ele aceita, mas pede pra ele fazer terapia antes.

Ps tentei achar o vídeo do relato mais eu não achei.

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Listas em que este conto está presente

Sogro
Todos os contos de sogro e nora.