Segredos do Coração - Superando o Passado. Parte 35.

Um conto erótico de Ménage Literário
Categoria: Heterossexual
Contém 9806 palavras
Data: 07/07/2025 13:53:25

Mari sentiu o coração bater mais forte, mas conteve a emoção. Passou a mão pelo braço, como se estivesse tentando conter a própria ansiedade.

— Almoço? — repetiu, como se ainda estivesse avaliando. — Tudo bem. Mas só almoço, Celo. Nada de conversas difíceis hoje, tá? Eu só quero … sei lá … acreditar que tudo vai ficar bem.

Do outro lado, Celo soltou um suspiro de alívio.

— É tudo que eu quero também.

Mari sorriu discretamente, sem que ele visse. Queria manter o controle. Precisava manter o controle.

— Você vem me buscar? — Mari pediu.

— Passo aí daqui a pouco.

— Vou me arrumar, então. Até daqui a pouco. — Respondeu Mari, antes de desligar.

Com o celular ainda na mão, Mari respirou fundo, se sentou no sofá e ficou alguns segundos em silêncio, olhando para o nada. Por dentro, a euforia dançava. Mas por fora, ela apenas murmurou para si mesma:

— Devagar, Mari. Só mais um passo. Só mais um.

Ela se levantou e foi se arrumar. Não era um encontro qualquer, mas também não podia parecer que esperava demais. Escolheu uma roupa discreta, mas bonita. Queria estar bem, sem parecer que tentou demais.

No fundo, sabia que estava tentando, não apenas para ele. Mas, principalmente, para ela mesma.

Continuando:

Parte 35: “O que há dentro do meu coração, eu tenho guardado pra te dar”

Mari girou diante do espelho pela terceira vez. A blusa de linho bege clara caía com suavidade sobre a calça de alfaiataria vinho, ajustada, que valorizava seu corpo com elegância. Um colar discreto, brincos pequenos, salto médio. A maquiagem estava impecável, porém leve: iluminador suave, batom “cor de boca”, delineado discreto. Os cabelos, presos num coque baixo, deixavam o pescoço à mostra. Havia ali mais do que vaidade, havia intenção.

Daniela passou pelo corredor, desacelerando ao vê-la. Sorriu, maliciosa.

— Assim, desse jeito, ele vai desmarcar o almoço e marcar um jantar à luz de velas.

Mari riu, fingindo desviar do comentário com um aceno.

— Boba. É só um almoço.

— Uhum … — Daniela cruzou os braços e encostou no batente da porta. — E eu vou à academia com jeans e salto.

Mari não respondeu. Pegou a bolsa, borrifou um pouco de perfume atrás das orelhas e respirou fundo.

O interfone tocou e Daniela desceu para receber o pai.

Minutos depois, Mari desceu as escadas com leveza, como quem flutua. Celo esperava ao pé da escada, usando uma camisa azul marinho dobrada nos cotovelos, calça jeans escura e sapatos casuais. Estava mais bonito do que ela se lembrava. Ou talvez fosse o coração saudoso influenciando sua visão.

Quando a viu, Celo simplesmente parou.

— Uau … — Foi tudo o que conseguiu dizer nos primeiros segundos.

Mari, sem graça, ajeitou a alça da bolsa no ombro.

— Achei que fosse um almoço comum, Celo.

— E é … — Ele respondeu, com um sorriso. — Mas quando você aparece assim … não tem nada de comum.

Celo fez uma pausa, deixando os olhos passearem de maneira respeitosa, admirando os detalhes.

— Quando você se cuida, Mari … nenhuma mulher nesse mundo tem uma chance contra você.

Mari tentou disfarçar o impacto daquelas palavras com um sorriso contido, lembrando que uma das reclamações de Celo, no passado, era sobre sua falta de vaidade, do cuidado de si mesma. O rubor denunciava o efeito.

Caminharam juntos até o carro e Celo abriu a porta com gentileza.

— Fique à vontade, minha senhora.

— Obrigada, meu cavalheiro. — Ela se divertiu, gostando da brincadeira.

No trajeto até o restaurante, o silêncio foi mais cúmplice do que os dois esperavam. De vez em quando, um olhava para o outro e sorria. Pequenos gestos, suspiros, lembranças.

— Nervosa? — Celo perguntou, parando no semáforo.

— Um pouco. — Mari confessou. — Parece nosso primeiro encontro.

— Talvez seja. — Ele murmurou. — Já que quero fazer tudo diferente dessa vez.

Ela apenas olhou para ele, como quem ouve, mas guarda a resposta para depois.

O rádio tocava baixinho uma do Djavan, “Um Amor Puro”, e o clima dentro do carro os envolvia como um cobertor em dia nublado.

“O que há dentro do meu coração

Eu tenho guardado pra te dar

E todas as horas que o tempo

Tem pra me conceder

São tuas até morrer

E a tua história, eu não sei

Mas me diga só o que for bom

Um amor tão puro que ainda nem sabe

A força que tem

É teu e de mais ninguém

Te adoro em tudo, tudo, tudo

Quero mais que tudo, tudo, tudo

Te amar sem limites

Viver uma grande história”

O carro estacionou em frente a uma fachada discreta, com detalhes em madeira escura, cortinas de linho e lanternas penduradas. Não havia placa grande, nem nome chamativo, apenas um discreto letreiro dourado em letras cursivas: “Rasoi”.

Mari franziu a testa com curiosidade.

— Rasoi? — Leu em voz alta. — Nunca ouvi falar ...

Celo deu a volta no carro e abriu a porta para ela, sorrindo.

— É novo. Culinária indiana moderna. Fusão de temperos tradicionais com técnicas contemporâneas.

— Indiana? — Mari arqueou a sobrancelha, surpresa. — Você odiava comida apimentada.

— Na verdade, eu odiava experimentar coisas novas. — Ele corrigiu, oferecendo o braço. — E olha onde isso nos trouxe.

Mari riu, rendida. Aquilo, de algum modo, era simbólico.

O ambiente era acolhedor, intimista. O cheiro dos temperos — cúrcuma, coentro, gengibre, cardamomo — se misturava ao som suave de sitares e luz amarelada. Velas pareciam flutuar em pequenas tigelas de cerâmica nas mesas. O garçom os levou a um reservado, junto a uma parede de pedras claras com plantas suspensas.

— Isso aqui ... — Mari olhava ao redor — É uma escolha inusitada.

— Inusitada, mas bom, não é? — Celo disse, já puxando a cadeira para ela. — A ideia é essa. Quero que a gente se acostume com o novo. Com o diferente. Nada de reviver os erros de antes.

— Então é isso? Um recomeço temperado? — Mari brincou, pegando o menu de couro fino.

— Exatamente. Com muito mais sabor. — Ele sorriu, sereno. — Lembra quando a gente namorava e você queria experimentar tudo? Vietnamita, tailandesa, etíope … Eu só queria rodízio de pizza.

Mari soltou uma risada genuína.

— É verdade. Você dizia que tempero demais era coisa de quem queria esconder a comida ruim.

— Pois é. E você dizia que sabor era uma aventura. Acho que finalmente entendi o que você queria dizer.

O garçom chegou, simpático, e Celo pediu sugestões. Mari ficou surpresa ao vê-lo confortável, interessado, até arriscando pronunciar os nomes dos pratos. Pediram Butter Chicken, um frango com molho de manteiga, tomates e especiarias suaves; Paneer Tikka, queijo grelhado com pimentões; Arroz jeera com cominho e um naan com alho e ghee.

Quando os pratos chegaram, Mari provou a primeira garfada e fechou os olhos.

— Nossa … isso é maravilhoso.

— E sem exagero na pimenta. — Celo comentou, servindo mais um pouco no prato dela. — Acho que, da mesma forma que essa comida, a gente só precisa encontrar o equilíbrio.

Ela o olhou por um instante, segurando o garfo no ar.

— Você parece diferente, Celo. Eu gosto desse “você”.

— Porque eu estou diferente. — Ele respondeu, tranquilo. — Por minha causa, vi você indo embora. E depois vi você quase não voltando. Eu precisei perder para entender o valor do que a gente tinha … mesmo que não fosse perfeito. Ao invés de trabalhar para consertar, eu te abandonei.

Mari baixou os olhos, emocionada, mas sorrindo com aquela confissão.

— Obrigada, Celo. Você não sabe o quanto é gratificante ouvir você dizer essas coisas, mesmo eu tendo uma “participação ativa” no que aconteceu.

Disposto a aliviar o clima tenso, emotivo, ele brincou:

— Se depender de mim, vai ter fogo e doçura. Um pouco de pimenta, mas muito mel. — Ele estendeu a mão por sobre a mesa, tocando os dedos dela.

— Você está dizendo todas as coisas certas … só espero que não seja um discurso ensaiado, para me amolecer …

— Eu não tenho pressa, Mari. — Celo disse. — Você me conhece como ninguém e posso te garantir que, dessa vez, não vou repetir receita fracassada. Nem uma pitada.

O resto do almoço ocorreu em clima de tranquilidade. Conversas sobre os filhos, sobre o trabalho de Celo, sobre a reforma do jazigo em andamento … tinham muito o que falar e sentiam saudade de ouvir um ao outro.

Quando saíram do restaurante, Mari achou que o passeio terminaria ali. Estava feliz, mas não queria dizer adeus. Já se preparava para se despedir com um sorriso, talvez até um beijo na boca, que fazia seu coração acelerar só em pensar, um gesto de ternura contida. Mas Celo, com aquele olhar de quem ainda tinha cartas na manga, a guiou até o carro com um ar misterioso.

— Para onde vamos agora? — Mari perguntou, esperançosa, ajeitando o cinto.

— Confia em mim. — Ele respondeu, ligando o carro com um sorrisinho malicioso no canto da boca.

Mari conteve o entusiasmo, não podia se deixar levar facilmente, ou explodiria de ansiedade. O dia estava sendo perfeito e as expectativas só cresciam. Ela brincou:

— Eu confiei, e olha onde fomos parar. Um restaurante indiano!

— E você amou. — Ele rebateu, provocando. — Agora me dá uma chance de terminar a tarde ainda melhor.

O carro parou no centro da cidade, em frente ao Cine Lumière, um cinema antigo restaurado há alguns anos. Na marquise, em letreiro retrô, letras douradas anunciavam:

"Mostra Clássicos Eternos – Hoje: Casablanca & E o Vento Levou".

Mari virou o rosto lentamente para ele, os olhos arregalados de surpresa e emoção.

— Você está brincando … é sério?

Celo apenas sorriu, desligando o carro.

— Eu lembro de tudo, Mari. De como você chorou quando descobriu que ninguém mais queria ver "filme velho". De como você dizia que essas histórias tinham alma.

— Casablanca é meu filme preferido! — Ela disse, ainda surpresa.

— E "E o Vento Levou", você assistia toda vez que estava triste. Dizia que a Scarlett te lembrava de você mesma. Teimosa, intensa e, claro ... dramática.

Mari sorriu, emocionada.

— Você está mesmo se superando, né? Obrigada. De verdade.

— Eu estou apenas lembrando quem você é, meu amor ... e lembrando você de quem eu sou. Ou, pelo menos, de quem eu quero voltar a ser.

A sessão foi em uma das salas restauradas, com poltronas largas de couro vinho, cortinas vermelhas nas laterais e uma tela que rangia ao descer. O cheiro era de pipoca com manteiga, e as paredes tinham cartazes emoldurados de clássicos: “Bonequinha de Luxo”, “Janela Indiscreta”, “Cantando na Chuva”.

Durante "Casablanca", Mari se emocionou. Celo a observava mais do que o filme. Quando a famosa frase ecoou na sala — “Nós sempre teremos Paris” — ela apertou de leve a mão dele no descanso da poltrona, sem nem perceber. Ele não retribuiu. Apenas deixou que ela apertasse, e aquilo já bastava.

Na pausa entre os filmes, foram à cafeteria do cinema. Celo pediu um café preto e um cappuccino com chocolate e avelã para Mari.

— Sabe o que mais me impressiona? — Mari disse, soprando a borda da xícara.

— Que eu consegui te convencer a ficar fora de casa num dia de semana?

— Que você lembra de tudo. Até do meu pedido de café. Você fez o mesmo lá na praia, no final de semana.

— Eu nunca esqueci, Mari. Eu só estava ... distraído demais com as coisas erradas.

Ela não respondeu. Mas o sorriso que ela lançou para ele por cima da borda da xícara dizia tudo.

"E o Vento Levou" foi ainda mais intenso. Mari suspirava com os vestidos, os cenários e os diálogos dramáticos. Celo se divertia observando as reações dela. Ela sussurrava algumas falas antes dos personagens, pois sabia de cor.

No final, quando Scarlett diz: "Afinal, amanhã é um novo dia", Mari se emocionou de novo. Foi Celo quem pegou a mão dela dessa vez, com delicadeza, entrelaçando os dedos, e ela não soltou.

Mari estava muito emocionada, e a volta para casa foi silenciosa, confortável. Um tipo de silêncio bom, daqueles que não precisam ser preenchidos. O rádio tocava baixo, uma versão instrumental de “La Vie en Rose”. Quando estacionaram, o céu já estava escuro e os postes da rua banhavam a fachada da casa de Mari com um tom âmbar suave.

Celo desligou o carro, mas não se apressou. Mari também ficou ali, olhando para a frente, com um sorriso bobo nos lábios.

— Obrigada por hoje. — Ela disse, virando-se para ele. — Foi ... especial.

— Eu queria te dar algo que fosse só nosso. Sem filhos, sem passado, sem promessas ... só a gente. De novo.

— E conseguiu. — Ela sorriu, ainda tímida.

Por um segundo, os olhares se cruzaram e ficaram ali, presos. A vontade era clara, mas o medo também. Mas dessa vez, Mari não desviou o olhar. Celo aproximou-se devagar, sem pressa, como quem se aproxima de um santuário. E então, os lábios se encontraram num beijo lento, delicado, repleto de saudade e ternura.

Não havia pressa. Não havia ansiedade. Era um reencontro silencioso de duas almas que se conheciam profundamente.

Mari deslizou os dedos pelo rosto dele com leveza. Celo pousou a mão em sua nuca, como se temesse que ela desaparecesse, se soltasse. O beijo não tinha a urgência da paixão descontrolada, mas o cuidado de quem carrega algo precioso demais para ser quebrado.

A intensidade foi aumentando aos poucos, os corpos se procurando, as mãos ganhando vontade própria … a rua estava vazia, ninguém para reclamar.

A mão de dele entrou ágil pela lateral da blusa, os lábios não se desgrudaram. Mari alisou a coxa dele, subindo devagar. A mão de Celo encontrou o fecho do sutiã, o abrindo sem dificuldade.

Mari o encarou, encorajando o ainda marido a continuar. Ela mesmo se livrou rapidamente da peça e sentiu o toque dele … a ponta dos dedos frias, fazendo sua pele se arrepiar. Sua mão já acariciava o pau, sentindo-o crescer, desejando pele com pele.

Mari abriu o zíper da calça e a desabotoou. Acariciou uma vez mais, sentindo a ereção já plena, potente. Celo apertava um dos seios com delicadeza, fazendo movimentos circulares nos bicos que enrijeciam …

Até que o celular de Celo vibrou no painel, assim como o de Mari na bolsa, emitindo um som agudo e específico. Um alerta do aplicativo de socorro que Diego criara, ainda na faculdade, para a família. O som que eles esperavam nunca precisar ouvir.

Celo afastou-se devagar, os olhos ainda grudados nos de Mari.

— Isso não é bom. — Ele disse, já pegando o telefone.

Mari concordou, o coração apertado. A mágica do momento tinha sido interrompida, mas o que sentiam, naquele momento, o pânico inicial, era mais urgente do que qualquer excitação.

O aplicativo de socorro da família não mentia: havia um chamado em casa, e era da Daniela.

— Ai, meu Deus, será que ela se machucou? — Mari entrou em pânico, saindo do carro rapidamente, abrindo o portão de casa como quem invadia um esconderijo inimigo.

Celo, preocupado, tentava abrir a porta antes mesmo da chave girar.

— Estamos aqui, filha. Fala com a gente. — Ele gritou, enquanto adentrava a sala como um raio.

Assim que entraram na sala, se depararam com uma cena digna de desenho animado. Seria trágico, se não fosse tão cômico. No canto mais imponente da sala, ocupando uma parede inteira do pé-direito duplo, havia a relíquia de Mari: uma antiga estante de madeira maciça, daquelas que só existem em bibliotecas, herdada da mãe. Reformada com esmero, ela guardava centenas de livros — muitos deles herdados também — e se estendia até quase o teto. Uma daquelas com escada corrediça, que deslizava sobre trilhos de ferro para alcançar os exemplares mais altos. Mari sempre disse que era sua joia, sua biblioteca particular.

E era justamente ali que Daniela estava pendurada, com metade do corpo torto na escada corrediça da estante, as duas pernas presas entre os degraus, o cabelo desgrenhado e o celular na mão.

— AI, GRAÇAS A DEUS! — Ela gritou assim que viu os pais. — ME TIRA DAQUI. EU TÔ FAZENDO PARTE DO MOBILIÁRIO HÁ MEIA HORA!

Mari levou a mão à boca, entre o alívio e o riso descontrolado.

— Dani?! O que ... o que foi que aconteceu?

— Eu só queria pegar Orgulho e Preconceito lá de cima! — gritou ela, indignada. — Mas ESCORREGUEI NA PORCARIA DO DEGRAU E FIQUEI TRAVADA IGUAL UM BONECO DE CERA!

Celo encostou na parede e começou a rir tanto que parecia que ia chorar.

— Mari ... isso ... isso é a coisa mais insana que eu já vi nessa casa. E olha que não falta história.

— MÃE … PAI … PAREM DE RIR E ME TIRA DESSA PORCARIA, EU TÔ COM FORMIGAMENTO NUMA NÁDEGA, JÁ. — Daniela exigiu, aos berros.

Mari chorava de tanto rir, mas tentou manter a compostura.

— Calma, filha ... Celo, ajuda ela antes que eu tenha um ataque de tanto rir e precise ser socorrida também.

Celo, ainda rindo, subiu dois degraus com cuidado e tentou soltar a perna da filha. Não conseguiu.

— Dani, você travou a panturrilha na trave de apoio. Vou ter que empurrar para frente e girar o pé. Como um balé moderno, mas com mais desespero.

— Só faz logo. Por favor! — Daniela se acalmou.

— Respira, filha. Confia no seu pai. — Disse ele, sem conseguir ainda parar de rir.

Com um puxão meio torto, um giro e um estalo que veio não se sabe de onde, Daniela foi libertada da escada e caiu direto nos braços do pai.

— Pronto. Livre, leve e completamente ... sem dignidade. — Ele não resistiu.

Mari também não deixou barato. Com o celular em mãos, ela provocou a filha.

— Tudo bem, eu gravei. Vai dar um reels perfeito do Instagram.

— A senhora não me trairia dessa forma … — Daniela não sabia onde enfiar a cara, envergonhada. — Nunca mais leio um clássico. Vou virar fã de podcasts.

Mari, ainda aos risos, pegou o livro que tinha caído no chão.

— Tá aqui o vilão da história: Orgulho e Preconceito. Quem diria que Jane Austen causaria uma catástrofe tão hilária.

Daniela se levantou, esticando as pernas como uma sobrevivente da guerra.

— Pelo menos o Diego pode ficar orgulhoso. O aplicativo dele funciona muito bem.

Celo e Mari se entreolharam e, como sempre, terminaram a situação com mais risadas do que sermões. Afinal, naquela casa, até o caos tinha um certo charme vintage.

Diego chegou em casa minutos depois, empurrando a porta semiaberta com a ponta do pé, já que os braços estavam cheios de sacolas do mercado. Mas parou no meio da sala ao ver Celo e Mari largados no sofá, rindo tanto que mal conseguiam respirar.

— O que tá acontecendo aqui? — Ele perguntou, largando tudo no chão, curioso.

Mari, ainda com os olhos marejados de tanto rir, estendeu o celular na direção do filho.

— Olha isso aqui. Sua irmã … sua irmã conseguiu se superar.

Curioso, Diego pegou o celular. No vídeo, Daniela aparecia presa entre os degraus da escada corrediça da estante, com as pernas completamente enroscadas e o rosto transtornado.

— Meu Deus! — Ele começou a rir alto também. — Como isso é possível? Parece uma yoga que deu errado!

— Yoga desmilinguida. — Celo acrescentou, rindo mais ainda.

Do corredor, a voz de Daniela ecoou, indignada e dolorida:

— Tá todo mundo rindo, mas alguém pode me ajudar a subir para o quarto? Tô com a coxa formigando ainda! Meu tornozelo tá inchando.

Mari respirou fundo, tentando parar de rir, e foi até a filha.

— Calma, dançarina das letras. Vamos subir antes que você vire meme.

Celo e Diego ficaram sozinhos na sala, ainda sorrindo. Mas o riso do pai foi perdendo força aos poucos, até dar lugar a uma expressão mais séria.

— Filho … — Ele começou mudando o tom — … preciso falar uma coisa contigo? E é bem sério.

Diego se ajeitou no sofá, percebendo que vinha algo pesado.

— Manda.

Celo olhou para o andar de cima, se certificando de que Mari estava longe o bastante.

— É o tal Jonas. Não sei explicar, mas minha intuição tá gritando. Tem alguma coisa errada com aquele cara. Ele é do tipo que sorri com os olhos frios, entende? Como se estivesse sempre jogando um jogo que só ele conhece.

Diego assentiu lentamente, prestando mais atenção.

— Engraçado você dizer isso, pai. Nunca fui com a cara dele. Nem sei explicar o motivo, mas ele me passa uma vibe meio ... sei lá, performática. Como se estivesse sempre interpretando.

Celo soltou um suspiro, aliviado por não estar sozinho naquela impressão.

— Pois é. Mas se eu falo isso em voz alta, parece só implicância. Ciúmes, sabe? Afinal, ele e sua mãe tiveram “um lance”. — Celo disse, fazendo aspas no ar com os dedos.

Diego virou o rosto, analisando o pai com paciência.

— Então ... você e a mãe ... estão se acertando?

Celo abriu um sorriso que não precisava de explicação. Era sereno, esperançoso. Quente.

— Eita … — Diego disse, sorrindo também. — Já é. O amor venceu.

Celo deu um tapinha no ombro do filho, e os dois riram juntos de novo. Mas não mais da Daniela, mas da vida que, aos poucos, parecia estar voltando aos trilhos.

O riso entre pai e filho já havia cessado. Celo se encostou melhor no sofá, com um olhar mais fechado, mais tático. Ele pigarreou antes de perguntar, com a voz mais baixa:

— E aquele novo sistema, Diego? O que estamos desenvolvendo para a seguradora … o que faz o rastreio de histórico financeiro e análise de risco de clientes. Você terminou?

Diego ergueu uma sobrancelha, curioso com a mudança repentina de assunto, e puxou o notebook da mochila.

— Tá aqui. A versão funcional tá rodando. Ainda falta ajustar umas rotinas e refinar os filtros de busca, mas já dá pra usar num teste.

Celo fez um gesto discreto com a cabeça, falando mais baixo.

— Quero que use esse programa para mim. Um teste real.

— Real? Como assim?

Celo se inclinou para a frente, falando próximo ao ouvido do filho.

— Pesquisa esse cara, Diego. O Jonas. Quero saber quem ele é, de onde veio, o que esconde. Como eu disse, meu instinto tá gritando, e não vou ignorar isso. Ainda mais com aquele André ao lado dele. Pode ter coisa grande por trás. Ou não. Tomara que não. Mas eu preciso saber.

Diego fechou o notebook devagar, pensativo.

— Você sabe que isso aí é uma bela violação de privacidade, né? Tecnicamente, é crime. Podemos ter problemas se alguém descobrir ...

Celo o encarou, firme.

— A responsabilidade é minha. Tá no meu CNPJ, é o meu nome em jogo. Eu assumo a bronca. Se eu estiver sendo paranoico, ótimo. Mas prefiro correr esse risco, a deixar minha família e meus amigos vulneráveis.

Celo, o patrão, ordenou:

— Pode fazer, Diego. E me avisa quando tiver alguma coisa.

Diego se levantou, com o notebook em mãos, e fez uma saudação informal, batendo continência de brincadeira.

— Entendido, patrão. Me dá uns dias. Se tiver alguma sujeira, eu encontro.

Celo assentiu, o olhar fixo, sério. Aquilo podia ser apenas implicância. Ou podia ser o início de uma bomba prestes a explodir. E ele não estava disposto a esperar para ver.

Mari desceu as escadas devagar, mais tranquila após a confusão. Diego já havia saído, e a sala estava em silêncio, apenas ela e Celo. Os olhos se encontraram no instante em que ela pisou no último degrau. Sem dizer uma palavra, ela caminhou até ele e o beijou. Um beijo doce, envolvente, carregado de tudo que haviam segurado até aquele momento.

— Eu queria muito continuar o que a gente tinha começado … — Disse Mari, com os lábios quase colados aos dele. — Mas a Dani não está bem. Tem um hematoma grande na coxa e outro nas costas. Agora que a adrenalina passou, os músculos vão começar a doer ...

Celo a interrompeu com um beijo suave e um abraço apertado, afagando os cabelos dela com carinho.

— Eu entendo, meu amor. Cuida da nossa menina arteira. Temos todo o tempo do mundo. — E brincou, mas com total intenção de acalmá-la. — Eu não vou a lugar nenhum. Ao menos, não para longe de você.

Mari sorriu, encostando a testa na dele. Trocaram mais alguns beijos, leves, apaixonados. Então, ela o acompanhou até a porta, descendo com ele até o carro. Pararam ali, sob a luz potente do poste em frente à casa.

— Isso tá acontecendo mesmo? — Perguntou Mari, sorrindo com malícia nos olhos. — A gente tá aqui, juntos? Por que você precisa ir embora?

Celo segurou o rosto dela entre as mãos e a beijou mais uma vez. Devagar, firme.

— Tá acontecendo sim. E dessa vez é pra sempre. — Ele acariciou o rosto dela com o polegar. — Todas as minhas coisas importantes estão naquele apartamento. E amanhã, eu viajo a trabalho. É um bate e volta, rápido, volto à noite. Mas preciso organizar os últimos detalhes da apresentação.

Mari suspirou, sem conseguir esconder a mistura de saudade antecipada e contentamento. Após mais alguns beijos demorados, Celo entrou no carro. Mari permaneceu no portão, observando enquanto ele dava partida e se afastava.

Só quando o carro virou a esquina, ela respirou fundo, ainda com o sorriso no rosto, e voltou para dentro. Era hora de cuidar da filha … e do próprio coração, que agora batia com mais esperança.

{…}

A sala de reuniões, ampla e envidraçada, ainda ecoava o burburinho da discussão acalorada, mas profissional, que acontecera minutos antes. As telas já estavam apagadas, as garrafas de água pela metade, e as anotações espalhadas sobre a mesa de madeira escura. Paul, Jonas, André, Giba e alguns membros da equipe recém-saídos pareciam respirar um pouco mais aliviados com o fim da rodada estratégica de discussões daquela manhã intensa.

Paul ajeitava os punhos da camisa social enquanto trocava algumas palavras com Giba sobre o cronograma de importação dos insumos europeus. André, mais calado, digitava algo no celular. Jonas, que não disfarçava o tédio, girava sua caneta entre os dedos, até soltar, com uma pitada de desdém na voz:

— E esse tal de Celo ... Ele é tudo isso mesmo? Ou só mais um daqueles gênios superestimados da área?

Giba ergueu os olhos, mas preferiu o silêncio. Paul, no entanto, respondeu com firmeza, sem alterar o tom:

— Eu não trabalho com “mais ou menos”. Se o nome dele está no projeto, é porque ele é o melhor. E digo mais: nunca vi ninguém tão comprometido com integridade e inovação quanto o Celo. Quando se trata de segurança digital, ele não é só um prestador de serviço. Ele é garantia de que ninguém vai colocar as mãos no que é nosso.

Jonas arqueou as sobrancelhas, fingindo surpresa, e levantou as mãos num gesto conciliador:

— Tudo bem, tudo bem ... não está mais aqui quem falou. Só quis entender melhor o perfil do cara.

Paul relaxou, mas não tirou os olhos de Jonas por alguns segundos. O clima permaneceu tenso por mais um momento até a porta se abrir suavemente. Anna entrou com a graça de quem conhece bem o ambiente. Usava um vestido azul-marinho que contrastava com seus olhos claros. Os cabelos, presos num coque simples, só realçavam o rosto luminoso. Ela se aproximou do marido com um sorriso e deu um beijo leve no rosto dele.

— Vim te roubar, senhor aniversariante-em-breve. Precisamos decidir sobre a sua festa. Sábado já tá batendo à porta. — Disse ela, risonha, voltando-se aos demais com um aceno simpático. — Giba, André, Jonas ... bom ver vocês.

— Sempre um prazer, Anna. — Respondeu André com educação.

Jonas apenas acenou, escondendo bem o olhar avaliador que percorreu o corpo de Anna por mais tempo do que o necessário. A lembrança das palavras de Cora ecoava em sua mente como uma música indecente: “Todos nós somos liberais”. Aquilo o fazia olhar para aquela mulher com outros olhos. Olhos perigosos.

Anna voltou-se para Paul, entrelaçando o braço no dele com naturalidade:

— Podemos?

— Claro, meu amor. — Paul respondeu, dando um último aceno para os demais. — Continuamos depois, pessoal.

Assim que os dois deixaram a sala, seguidos por Giba, Jonas soltou um suspiro quase imperceptível. André o cutucou com o cotovelo, rindo:

— Que mulher gostosa …

Jonas forçou um sorriso, mas não respondeu. Sua mente estava longe ... e cheia de imagens que não deveriam estar ali.

{…}

O restaurante italiano da esquina já era quase uma extensão da rotina de Paul e Anna. Em dias úteis, quando ela passava na empresa para buscá-lo, era ali que o casal se permitia uma pausa no meio do turbilhão cotidiano. O lugar era aconchegante, com mesas de madeira rústica, toalha quadriculada, música instrumental suave e o aroma inconfundível de manjericão e parmesão, no ar.

Anna escolheu seu prato habitual: penne ao molho pesto, com um toque extra de nozes. Paul, como sempre, optou pelo espaguete à carbonara. Nada de reinvenções, apenas a receita clássica, com gema cremosa, pancetta crocante e pimenta-do-reino no ponto certo.

Entre uma garfada e outra, Paul respirou fundo, repousou os talheres ao lado do prato e olhou para a esposa com um meio sorriso.

— Acho que eu quero algo simples no sábado, amor. — Começou ele. — Nada de festa grande, nem lugar alugado. Só uma reunião em casa, com os mais chegados. Coisa íntima, sabe?

Anna ergueu os olhos do prato, com uma expressão leve e afetuosa.

— E quem são esses mais chegados? O pessoal de sempre, Mais Celo e Mari. — Perguntou, casualmente

Paul confirmou.

— Bem por aí. E também, Jonas e André. Agora que viramos sócios, não ia pegar bem os deixar de fora.

Anna concordou, mas sua pergunta seguinte veio com naturalidade:

— Sobre Celo e Mari … eles estão se acertando …

Paul coçou a nuca, hesitante. Aquela era uma situação complicada.

— Então ... é aí que tá. Não sei se todos ficariam bem no mesmo ambiente. Tudo ainda é muito recente ... — Ele fez uma careta sutil. — Pode ser desconfortável. Ou até pior. Mas Mari e Celo vem antes do Jonas, então … não sei o que fazer.

Anna pousou o garfo, limpou a boca com o guardanapo e olhou firme para ele.

— A gente convida. — Disse com serenidade. — E avisa. Deixa claro que vai ser uma reunião com todo mundo. Se quiserem vir, que venham. Se não, tudo certo. Mas não cabe a nós decidir por eles.

Paul observou a esposa por um instante, admirando a calma com que ela lidava com coisas que ele costumava complicar. Soltou um suspiro e deu um leve sorriso.

— Você sempre tem razão, né?

— Só nas segundas, quartas e sextas — Ela respondeu com humor, rindo, pegando um pedaço de pão italiano e mergulhando no azeite.

O resto do almoço seguiu em harmonia. Conversas leves, mãos que se tocavam sobre a mesa e olhares cúmplices. Entre garfadas e sorrisos, o casal selava, sem alarde, mais uma daquelas pequenas alianças silenciosas que sustentam os amores maduros.

Após o almoço tranquilo, Paul e Anna caminharam de volta até a empresa. O sol da tarde aquecia levemente a calçada, e eles seguiram de mãos dadas, como um casal que já sabia ler os silêncios um do outro. No estacionamento da sede, em frente ao carro de Anna, Paul se despediu da esposa com um beijo carinhoso e um sorriso.

— Boa sorte com os preparativos, chefe da festa. — Disse ele, piscando.

— Deixa comigo. — Ela respondeu, já entrando no carro.

Anna voltou para casa em ritmo leve, mas com a mente acelerada. Sabia que, para que tudo corresse bem, precisava resolver os detalhes logo. Pegou o celular e ligou para o buffet de sempre, comandado por uma antiga amiga, dessas que sabem o gosto dos clientes de olhos fechados.

— Aquele menu clássico: brusquetas de entrada, massa ao molho branco e ao sugo, risoto de limão-siciliano ... e, claro, mini cannolis de sobremesa — Ela listou. — E vinho, muito vinho, que harmonizem com os pratos.

Com tudo encaminhado, Anna respirou fundo. Agora vinha a parte mais delicada: os convites. Um por um, com paciência.

Depois de falar com os amigos mais próximos, Fabi, Chris e Giba e não ter conseguido contato com Cora, ligou para Jonas e André, deixando Celo e Mari por último, como se guardasse a parte mais sensível para o fim.

Discou o número de Celo e esperou.

— Oi, Anna — Ele atendeu, cordialmente.

— Celo, querido. Tô ligando pra te fazer um convite. Paul quer fazer algo simples pro aniversário dele, só os amigos mais próximos, lá em casa. Vai ser nesse sábado.

— Festa de aniversário, é? — Ele perguntou, surpreso.

— Isso mesmo. A gente gostaria muito que você viesse. E, claro, o convite vale também para a Mari — Disse com naturalidade, e então respirou antes de continuar. — Mas preciso ser honesta: Jonas vai estar lá. Achei melhor te avisar antes, pra que nada seja surpresa. Ainda assim, acho que uma coisa não precisa se sobrepor à outra. O Paul ficaria realmente feliz com a sua presença.

Houve uma breve pausa do outro lado da linha. Anna respeitou o silêncio.

— Entendo. Obrigado por avisar ... Eu vou falar com a Mari mais tarde e a gente decide juntos. Te dou uma resposta até o fim do dia, pode ser?

— Claro — Anna respondeu, com suavidade. — Sem pressão nenhuma, Celo.

— Obrigado pelo convite, Anna. De verdade.

— Imagina. Um beijo.

— Outro.

Anna desligou. Suspirou. Sabia que ele precisava de tempo. Em seguida, buscou o nome de Mari na lista de contatos e fez a nova ligação.

— Oi, Anna! — Atendeu Mari, com voz um pouco mais suave.

— Oi, querida. Tô te ligando pelo mesmo motivo que liguei para o Celo, agora há pouco. Paul quer comemorar o aniversário em casa, algo simples, só os amigos mais próximos. Vai ser no sábado.

— Que bom, amiga. — disse Mari, gentil.

— Já falei com o Celo ... e acho importante te avisar também: o Jonas vai estar presente. Acho justo dizer.

Houve um pequeno silêncio do outro lado, então Mari perguntou com curiosidade:

— E o que o Celo te respondeu?

— Disse que vai conversar com você primeiro, e decidir juntos se vem ou não. Ele foi muito respeitoso.

Mari sorriu discretamente, sentindo um pequeno calor no peito.

— Que bom ouvir isso ... Ele já está voltando a pensar e agir como marido. É bom sentir esse cuidado de novo.

— Eu imagino … — disse Anna, com empatia.

— Então, farei o mesmo: falo com ele e confirmo ainda hoje, pode ser? — Mari seguiu o enredo definido por Celo.

— Pode, amiga, claro. Vai ser ótimo ver vocês, se decidirem vir. E eu espero que venham mesmo.

— Obrigada, Anna. De coração.

— Beijo, Mari.

— Beijo.

Anna desligou, sentindo um misto de alívio e expectativa. Sabia que, por mais que os caminhos ainda estivessem em construção, cada gesto como aquele aproximava o que antes parecia irremediavelmente partido.

{…}

Celo estava no escritório, o celular sobre a mesa. Tinha terminado uma ligação urgente de trabalho e pelo tempo decorrido, imaginava que Anna já tivesse falado com Mari. Sabia que precisava falar logo com ela, mas também sabia que cada ligação entre eles carregava algo a mais, um peso, uma esperança, uma memória.

Respirou fundo, pegou o celular e discou. Ela atendeu rápido, como se já estivesse esperando.

— Oi, Celo.

— Oi, amor. Tudo bem?

— Tudo, e você?

— Melhor agora. Falei com a Anna mais cedo ... sobre o aniversário do Paul.

— Ela me ligou também. — Respondeu Mari, tentando manter a voz calma. — Disse que vocês conversaram.

— Sim ... — Ele hesitou por um instante, mas foi direto. — Jonas vai estar lá. Então ... queria te perguntar: isso te incomoda? Tem algum problema a gente ir?

Mari não demorou a responder.

— Nenhum problema. Sinceramente.

— Mesmo? — Celo insistiu, para ter certeza.

— Claro que não.

— Então ... — Disse Celo em um tom leve, mas provocativo. — ... por que não vamos juntos? Como casal, sabe …

Mari silenciou por meio segundo. Aquilo foi inesperado, mas não no mau sentido. Um convite direto, sem rodeios, carregado de significado. Ela sorriu, mesmo sem que ele visse.

— Juntos, para mim seria ótimo. — Disse, só para confirmar que ouvira bem. — Combinado, então. Você me pega aqui e a gente vai. Diego disse que as coisas estão agitadas por aí, no escritório. Não vamos conseguir nos ver antes do sábado, né? Acho que precisamos pensar nessa distância, não tá dando certo.

Celo fechou os olhos por um instante e sorriu, mesmo que ela também não pudesse vê-lo.

— Amor … eu quero fazer direito, do jeito certo. Quero que você tenha a certeza de que eu sou o homem que você merece. Você me pediu para lutar por você, provar que não vou mais embora … Essa distância, está com os dias contados, eu garanto.

— Obrigada por você dizer isso … por estar mostrando que a gente ainda é um só. Eu ainda tenho medo … medo das coisas se complicarem. — Mari murmurou, mas mantendo o coração esperançoso.

— A gente já passou do ponto de complicar, Mari. Agora é só ... viver o que dá pra viver com verdade.

— E com leveza. — Mari completou.

— Isso. Te pego sábado, então? — Celo começou a se despedir.

— Estarei pronta e ansiosa para te ver. — Mari respondeu.

— Até lá, meu amor. — Celo se despediu primeiro.

— Até, meu amor. — Mari fez o mesmo.

Desligaram. E, por alguns segundos, os dois sorriram, cada um no seu canto, sentindo que, apesar das rachaduras, ainda havia espaço para construir, ou melhor, reformar, algo que ainda parecia se manter sólido.

{…}

A casa ainda estava silenciosa naquele início de sábado. Paul lia o jornal na varanda dos fundos, mais por hábito do que por interesse. Giba, ainda hospedado ali desde o desentendimento com Cora, circulava entre a sala e a cozinha, oferecendo ajuda em silêncio, carregando caixas e abrindo espaço para a equipe do buffet que chegaria em pouco tempo. Anna, por sua vez, organizava mentalmente como iria supervisionar cada detalhe da festa: taças, toalhas, arranjos, iluminação ... e as ausências.

Faltava algo. Ou melhor, alguém.

— Quer que eu comece a pendurar as luzes? — Perguntou Giba, tentando parecer útil.

— Ainda é cedo, homem. — Respondeu Anna, gentil, mas distante. — Vamos esperar o pessoal do buffet chegar.

Foi então que a campainha tocou. Chris e Fabi entraram, ainda não arrumados, mas trazendo presentes.

— Cadê a bagunça? Ainda não abriu uma gelada? — Brincou Chris, entrando direto.

— Só mais tarde. — Respondeu Paul, rindo, se levantando para receber os amigos.

Fabi abraçou Anna com força.

— Pronta para essa noite?

— Pronta! — Respondeu Anna, embora a expressão no rosto não acompanhasse a empolgação. Fabi notou na hora.

— Que foi?

Anna respirou fundo.

— É o silêncio. A falta que ela faz ... — Disse, olhando discretamente para Giba, que, de cabeça baixa, ajeitava algumas cadeiras no canto. — Cora deveria estar aqui.

Fabi não respondeu de imediato. Ao lado de Chris, colocou os presentes sobre a mesa e ajeitou o cabelo. Foi até Anna e falou com firmeza:

— Já que você decidiu perdoar ... já que escolheu trazer a Cora de volta pro lado certo ... então vamos atrás dela. Vamos trazê-la, nem que seja à força.

Anna levantou os olhos, surpresa. Paul, ao lado, fingia não ouvir, mas acompanhava com atenção. Giba, parado ao lado da janela, também ergueu o olhar, como se quisesse, mas não ousasse dizer nada.

— Você tá falando sério? — Perguntou Anna.

— Tô. A festa é só à noite. O buffet nem chegou ainda. Dá tempo. Vamos agora.

Anna hesitou apenas o tempo de um suspiro. Então, com a segurança de quem já amou muito — se decepcionou e, ainda assim ama — pegou a bolsa.

— Vamos.

Fabi virou-se para Chris, que já vinha com as chaves do carro na mão.

— Vão nessa. Eu, Giba e o Paul seguramos as pontas por aqui. — Garantiu ele, num tom leve.

Giba observava calado, mas com um nó no peito. Queria ir, mas sabia que não podia. Aquela reconciliação precisava ser, primeiro, entre elas.

Não demoraram a chegar e como tinham liberação na portaria do condomínio, entraram direto. A porta da casa de Cora estava fechada, mas tanto Anna quanto Fabi sabiam onde encontrar a chave reserva. A campainha não funcionava. Anna deu duas batidinhas leves, destrancou e empurrou com cuidado. Encontrou o cenário esperado, triste: luz baixa, cortinas fechadas, copos espalhados, e Cora sentada no chão da sala, vestindo um moletom velho e com os olhos fundos, marcados por noites mal dormidas. Ela sequer fingiu surpresa ao ver as duas.

— Eu sabia que uma hora vocês iam aparecer.

Anna foi a primeira a falar:

— Eu disse que não ia desistir de você, não disse?

Cora riu, sem humor, nervosa, e os olhos se encheram d’água. Fabi não perdeu tempo. Foi direto até ela.

— Se a Anna disse, tá dito. Agora, deixa de ser idiota, mulher. A gente te ama. Só isso.

Cora cobriu os olhos com as mãos por um instante. Quando baixou, já chorava. Não era desespero, era vergonha.

— Eu ... eu não sei nem por onde começar.

Anna estendeu a mão, sem hesitar.

— Começa lavando esse rosto, pegando uma roupa. Vai se arrumar lá em casa. A gente precisa de você hoje.

Fabi, mais séria, completou:

— Mas você sabe que ainda precisa pedir desculpas para uma pessoa que você magoou demais, né?

Cora assentiu, com um nó na garganta.

— Você tá falando da Mari, né?

— É. E não é por nós, é por você. — Continuou Fabi. — Pela mulher que você costumava ser. E ainda pode voltar a ser.

Anna olhou para as duas e propôs:

— A casa da Mari fica no caminho. Que tal passarmos por lá antes? Está disposta?

Cora respirou fundo, limpou o rosto com as costas da mão e se levantou devagar.

— Vocês têm razão. Mari foi a pessoa que eu mais machuquei. E ... eu quero mudar isso. Vamos.

A atmosfera no apartamento de Cora ainda era densa, como se o ar estivesse preso, pesado. Mas a presença de Anna e Fabi começava a dissolver aquele nevoeiro. Cora se levantou devagar, ainda cambaleante, e enquanto vasculhava o armário em busca de algo digno de vestir, Anna a observava com um carinho firme. Quando Cora saiu do quarto já trocada, com sapatos e com um vestido de festa nas mãos, Anna falou com delicadeza, mas sem rodeios:

— Cora ... conta a verdade pro Giba também.

Cora parou, os olhos buscando chão, parede, qualquer coisa que não fosse o rosto de Anna ou Fabi.

— Eu não sei se ele conseguiria me perdoar ...

— Ele ama você — Anna insistiu. — E você sabe disso.

Fabi se aproximou, encostando-se no batente da porta.

— O Giba é simples. Ele ama com entrega. Só precisa saber que você ainda é sincera com ele.

Anna deu mais um passo, com os olhos úmidos de empatia:

— Ele também está sofrendo. Você acha que ele tá bem, mas não tá. Fica calado, trancado no quarto quando não tá trabalhando. Evita até conversar comigo e com o Paul. Ele sente sua falta.

Cora apertou a roupa contra o peito e respirou fundo, os olhos marejando de novo, mas agora por outro motivo. Havia ali, no meio do caos, um calor novo. Um fio de esperança.

Anna tocou suavemente o braço da amiga e disse, como quem abençoa:

— Seja honesta. Pede perdão. E deixa o amor de vocês fazer o resto.

Cora fechou os olhos por um segundo. Quando os abriu, estava diferente. Mais firme. Mais inteira.

— Eu vou falar com a Mari. E com o Giba também. Vamos?

— Assim que eu gosto. — Fabi sorriu, orgulhosa.

Anna olhou para a amiga com ternura:

— Partiu, Mari!

Cora sorriu de verdade. O apoio sem cobranças, fazia bem para ela. Aquela não era apenas uma ida para a festa. Era um retorno. A um lar, a si mesma, às pessoas que ainda acreditavam nela.

Pouco depois de saírem do apartamento de Cora, o carro de Fabi parou em frente à casa de Mari. Não havia sido planejado, nem anunciado. Era como precisava ser: direto, real. Cora olhava pela janela, nervosa, os dedos entrelaçados no colo. Anna e Fabi trocaram um olhar silencioso de apoio.

Anna apertou o botão do interfone.

— Alô?

— Mari? — Disse Anna. — Sou eu, a Anna.

Fabi se inclinou para falar também:

— E eu também, a Fabi.

Uma breve pausa. Depois, o portão eletrônico começou a se abrir.

Cora sentiu o coração disparar. As pernas pareciam de borracha. Mari as esperava na porta da sala, braços cruzados, testa franzida. Assim que viu quem completava o trio, sua expressão mudou. Não para surpresa, mas para indignação.

— Você tá de sacanagem comigo, Anna? O que isso significa, Fabi? Vocês sabem … eu contei …

Antes que Anna respondesse, foi Cora quem deu um passo à frente. A voz saiu trêmula:

— Mari ... Eu vim pedir desculpas. Não. — Ela corrigiu-se. — Eu vim pedir o seu perdão.

Mari manteve o olhar fixo, em silêncio. Cora continuou lutando contra as lágrimas:

— Antes de tudo, quero que você saiba que o Celo me rejeitou completamente. Sem hesitar. E ele estava certo.

Ela respirou fundo.

— Eu usei a informação que você compartilhou com a gente … algo íntimo, seu … para premeditar uma situação que acabou interferindo na sua tentativa de se reaproximar do seu marido. Só agora, depois de perder o meu … é que eu consigo enxergar o quão cruel, o quão canalha, eu fui com você.

As lágrimas escaparam. Ela não as limpou de imediato. Deixou cair.

— Eu entendo se você não quiser mais falar comigo. Se não me quiser mais na sua vida. Mas eu precisava vir aqui. Precisava, do fundo do meu coração, te pedir perdão.

Cora olhou nos olhos de Mari, buscando sinceridade em cada sílaba.

— Você é capaz de encontrar uma forma de me perdoar, Mari? Eu juro, aqui na frente da Anna e da Fabi, que vou dar o meu melhor pra reconquistar a confiança que eu quebrei.

Mari ficou em silêncio por alguns segundos. Avaliava não só as palavras, mas a energia, o tom, os olhos da antiga amiga. Ainda havia dor, e mágoa, em seu peito. Muita mágoa. Mas também havia uma vontade de não carregar aquilo para sempre.

— Olha, Cora ... — Começou Mari, com voz firme. — Não vai ser do dia pra noite. Nem vai ser fácil. Mas ...

Fez uma pausa.

— Eu vou tentar. E isso é a única coisa que eu posso prometer no momento. — Completou Mari.

Cora assentiu, aliviada, como se tivesse tirado uma tonelada das costas.

— Eu entendo. E, sinceramente, não posso pedir mais do que isso.

Fabi sorriu, emocionada. Anna se aproximou, puxando Mari para um abraço apertado, seguida por Fabi e, por fim, Cora, que apenas tocou o braço da amiga, em respeito ao tempo que ela ainda precisava.

— Nos vemos mais tarde, Mari — Disse Fabi. — Você vai, né?

Mari respondeu:

— Vamos, sim. Eu e o Celo. Já confirmamos presença. — Mari encarava Cora ao falar, avaliando sua reação.

Mas Cora permaneceu em silêncio, sem demonstrar nada de negativo. Anna sorriu, já se afastando, puxando as amigas.

— Só viemos aqui pra isso. Eu ainda tenho uma festa inteira pra organizar. Não posso me atrasar.

As três saíram, deixando Mari parada na porta, com os braços cruzados, mas com um leve sorriso nos lábios. Ela balançou a cabeça, rindo sozinha.

— Essas mulheres vão me matar do coração ainda.

Quando chegaram à casa de Anna, a movimentação já começava. A equipe do buffet organizava as mesas, o cheiro do molho de tomate e ervas invadia a cozinha, e Paul dava instruções simples ao som de uma playlist suave. Chris e Giba estavam rindo de algo bobo na varanda.

Mas quando viram Cora entrar com Anna e Fabi, o riso cessou.

— Gente … — Disse Anna, chamando a atenção dos três. — … a Cora tem algo a dizer.

Cora respirou fundo. Estava limpa, arrumada, com o cabelo preso num coque simples e o rosto sem maquiagem. Mas havia dignidade no olhar.

Ela caminhou até o centro do quintal. Um por um, olhou nos olhos de cada amigo. Quando viu Giba, seu peito quase falhou em conter o peso. Ainda assim, ela se manteve firme.

— Eu preciso pedir perdão. A todos vocês. — Sua voz soava embargada. — Eu me deixei levar pela inveja, pela comparação, por sentimentos que me envenenaram. Anna … você sempre foi minha amiga, minha parceira, minha cúmplice. E mesmo assim eu te traí com palavras, com atitudes, com omissões.

As lágrimas vinham sem que ela as controlasse.

— Fabi, Chris, Paul … Eu também falhei com vocês. Como amiga. Como mulher. Como ser humano.

Ela então virou-se para Giba. E, sem hesitar, ajoelhou-se diante do marido.

— E com você … eu falhei como esposa. Como companheira. Com tudo que eu prometi ser no dia em que a gente se casou. Não vim aqui me vitimizar. Vim dizer que estou arrependida. E que eu não vou desperdiçar essa chance. Eu tô pronta pra responder tudo o que você quiser saber, Giba. Agora ou quando você quiser. Só … me dá essa chance de mostrar quem eu ainda posso ser … de continuar sendo sua esposa.

O silêncio tomou conta do local por alguns segundos. Giba a olhava fixamente. Havia dor, mas também amor. Ele respirou fundo, se agachou na frente da esposa e a abraçou com força. Um abraço que dizia tudo o que as palavras ainda não conseguiam.

— Não hoje, Cora. Hoje é o dia do Paul. A gente conversa melhor em casa … amanhã.

Ela assentiu, com os olhos lavados e o coração aliviado, mas de repente, se tocou:

— Em casa … amanhã … você vai voltar comigo?

Giba a encarou, firme, mas com um leve sorriso.

— Isso é só uma trégua, dona Cora. A gente ainda tem muito o que conversar.

— Eu sei. Eu sei, meu amor. E estarei pronta. Promete responder a qualquer pergunta. Sem mais mentiras.

Anna se aproximou e segurou a mão da amiga, emocionada. Fabi sorriu, assim como Paul, sabendo que, para além das festas, os verdadeiros recomeços estavam ali mesmo, naquele pequeno grande gesto.

{…}

De volta à manhã daquele sábado:

O escritório estava silencioso, quebrado apenas pelo som dos dedos de Diego digitando no teclado, finalizando os últimos detalhes de um relatório. Os poucos funcionários já tinham saído e a luz do sol filtrava-se pelas persianas meio fechadas, criando linhas douradas sobre a mesa de madeira escura.

Diego abriu o arquivo do notebook, conferiu os dados uma última vez e o imprimiu. Caminhou até o pai e colocou o relatório sobre a mesa com um ar sério.

— Tá aí, pai. O programa concluiu a análise. Tudo o que conseguimos levantar sobre ele está neste relatório.

Celo fechou seu notebook lentamente e pegou as páginas com atenção. Começou a ler em silêncio, os olhos cada vez mais concentrados conforme avançava pelas linhas. Franziu a testa. Virou uma página. Depois outra. E outra.

O silêncio se prolongou por alguns minutos.

— E então? — Perguntou Diego, cruzando os braços. — É grave?

Celo não respondeu de imediato. Relia uma seção do relatório com mais calma, como se quisesse confirmar se estava entendendo direito.

— Essas coincidências … os nomes, os registros paralelos, as transações de terceiros. É estranho demais.

Celo respirou fundo e fechou o relatório devagar, apoiando as mãos sobre ele.

— Eu ainda não sei o que fazer com isso, filho. — Disse, olhando para o papel como se ele escondesse mais do que revelasse. — São informações preocupantes. Muito preocupantes. Mas preciso pensar com calma antes de tomar qualquer atitude.

Diego concordou com um aceno de cabeça, respeitando o tempo do pai.

— Só ... toma cuidado, tá? Essa história está estranha demais para ser ignorada.

Celo olhou para o filho, com um peso nos olhos que não era comum nele.

— Eu sei. E obrigado por me ajudar com isso. A gente precisa ir com calma. E com inteligência.

O clima entre os dois ficou tenso por um instante. O mistério permanecia não dito, mas pesava no ar como uma tempestade prestes a se formar. Havia algo naquela história que não encaixava. Em Jonas. E Celo sabia: cedo ou tarde, aquilo viria à tona.

Depois do almoço, no escritório ainda silencioso, Celo encostou-se na cadeira e cruzou os braços atrás da cabeça. Observava Diego, concentrado, revisando os últimos detalhes do sistema. Os dados sobre Jonas ainda ecoavam em sua mente, mas ele decidiu deixá-los de lado. Por enquanto.

— Pode ir, filho. — Disse, rompendo o silêncio. — O serviço tá mais que adiantado. E você merece um descanso.

Diego sorriu, fechando o notebook.

— Valeu. Vou acampar com o pessoal, ok? Só volto amanhã à noite. Vou ficar meio fora de área, o sinal de celular por lá é horrível.

Diego resolveu provocar:

— Vou em casa ainda. Quer que eu dê algum recado à mamãe?

— Vai com Deus, e aproveite seu passeio. — Respondeu Celo. — Sua mãe e eu vamos nos encontrar hoje, não precisa ficar dando uma de cupido.

— Relaxa, pai. Estava brincando, tirando uma com você. — Disse Diego, rindo. — E ... cuidado com esse Jonas, tá?

Celo assentiu, sério, mas com um meio sorriso.

— Tô sempre alerta.

Uma hora depois, após revisar novamente o arquivo entregue por Diego, Celo voltou para seu apartamento, colocou uma playlist suave para tocar e começou a empacotar algumas coisas. Fotos de família, livros, objetos pessoais. Fazia aquilo devagar, quase como um ritual. No fundo, sabia que estava se preparando. Voltaria para casa. Mari tinha deixado escapar no último encontro: “Por que você precisa ir embora?” E no último telefonema: “Acho que precisamos pensar nessa distância, não tá dando certo”. Aquilo ficou ressoando na cabeça dele desde então. Era um sinal. Um dos bons.

Pegou o celular e ligou. Mari atendeu na segunda chamada, a voz receptiva.

— Oi, Celo.

— Boa tarde, meu amor.

Mari sorriu ao ouvi-lo, mas ainda processava a visita inesperada daquele sábado.

— Você não vai acreditar no que aconteceu hoje ... A Anna apareceu aqui, com a Fabi e ... com a Cora.

Celo sentou-se devagar no sofá.

— É mesmo? O que elas queriam?

— Foi. E ... Cora me pediu desculpas. Contou tudo. Exatamente como você disse. Você não mentiu pra mim.

— Eu nunca mentiria, Mari.

— Eu sei ... — Disse ela, com a voz mais doce. — E obrigada por ser honesto, mesmo com tudo …

Houve uma pausa breve, em que ambos só ouviam a respiração um do outro. Celo então retomou, com um tom mais leve:

— Você está bem? Digo, com a visita da Cora?

Mari pensou por um instante, e respondeu:

— Eu não quero mais ficar remoendo essas coisas. Ela pareceu honesta, realmente arrependida. Eu quero seguir em frente, sem âncoras me puxando. Sem rancores e mágoas que atrasam a vida da gente.

Celo conhecia muito bem aquela doce e gentil, Mari. Não tinha nada a acrescentar.

— Então, que horas eu passo pra te buscar hoje?

Mari respondeu rápido, como se a resposta já estivesse ensaiada:

— Às dezenove e trinta, ué. A hora que a Anna disse. Eu vou estar pronta.

Celo sorriu, mas seu tom agora trazia uma malícia brincalhona:

— E o que você acha de, depois da festa do Paul, a gente dar uma escapada romântica ... só nós dois?

Mari riu, tentando disfarçar o rubor que sentia até na ponta das orelhas.

— Eu adoraria. — Sua voz ficou mais baixa, quase um sussurro. — Precisamos terminar a “conversa” que começamos no carro.

O riso de Celo veio leve, cúmplice.

— Ah, minha Mari ... Mal posso esperar.

— Nem eu, meu amor.

— Então, até logo.

— Até …

Os dois desligaram, com sorrisos no rosto e o coração aquecido. A noite prometia mais do que uma simples festa: prometia recomeços.

{…}

A água quente do chuveiro caía em cascata sobre o corpo de Paul, formando uma névoa densa que embaçava o box de vidro. Ele fechou os olhos, deixando a pressão da água massagear seus ombros tensos, enquanto o som do líquido batendo no chão ecoava como um mantra relaxante.

Mas a tranquilidade foi interrompida quando sentiu as mãos suaves de Anna deslizando por suas costas, seguindo o caminho da água. Ele não precisou abrir os olhos para saber que ela estava ali, nua, pronta para surpreendê-lo.

— Você está lindo assim, molhado e relaxado. — Ela sussurrou, a voz rouca e carregada de intenção.

Paul sentiu um arrepio percorrer sua espinha quando os lábios dela tocaram sua nuca, seguidos pela língua quente que traçou um caminho até seu ombro. Ele se virou lentamente, encontrando os olhos dela, azuis, e cheios de desejo. A água escorria pelos cabelos loiros da esposa, grudando-os em seu rosto, enquanto ela se ajoelhava diante dele, sem quebrar o contato visual.

— Anna … — Paul começou, mas as palavras morreram em sua garganta quando ela envolveu seu membro já rígido com uma das mãos, acariciando-o com firmeza.

Ele soltou um gemido baixo, suas mãos buscando a parede do box para se manter equilibrado. Anna sorriu, maliciosa, antes de inclinar a cabeça e levar a cabeça do pau à boca. A sensação foi eletrizante. A língua dela explorou cada centímetro, lambendo e sugando com uma mistura de delicadeza e voracidade que fez Paul perder o fôlego.

— Por Deus, Anna … isso é gostoso demais. — Ele gemeu, seus dedos se enrolando nos cabelos molhados dela enquanto ela mergulhava mais fundo, engolindo-o até a garganta.

A pressão quente e úmida da boca dela era intensa, e ele sentiu suas pernas tremendo sob o peso do prazer. Anna sabia exatamente como movimentar a língua, como usar os lábios para criar uma sucção perfeita que o levava à beira do êxtase. Ela alternava entre movimentos lentos e profundos e rápidas lambidas na ponta, mantendo-o em um estado constante de tensão deliciosa.

Paul tentou falar, mas só conseguiu emitir sons roucos e desconexos. Sua mente estava nebulosa, focada apenas na sensação incrível da boca de Anna engolindo a pica. Ele sentiu o calor se acumulando em seu ventre, uma onda de prazer que ameaçava explodir a qualquer momento.

— Anna, eu vou … — Ele alertou, mas ela não parou.

Pelo contrário, ela aumentou o ritmo, sugando com mais força enquanto suas mãos massageavam suas coxas.

Quando ele finalmente explodiu, foi com um gemido gutural que ecoou pelo banheiro.

— Caralho, mulher! Como você consegue melhorar ainda mais, cada vez que faz isso?

Anna engoliu cada gota, os olhos fechados em êxtase enquanto se deliciava com o sabor do marido.

Paul estava ofegante, suas pernas fracas e seu coração acelerado. Ele olhou para baixo, vendo Anna ainda ajoelhada, com um sorriso satisfeito nos lábios.

— Você é incrível. Até demais. — Ele murmurou, ajudando-a a se levantar.

Mas antes que ele pudesse puxá-la para um beijo ou tentar retribuir o favor, Anna colocou uma mão em seu peito, segurando-o gentilmente.

— Não seja impaciente. — Ela disse, seu sorriso se transformando em uma expressão travessa. — O presente principal está guardado para mais tarde, depois da festa.

Paul arqueou uma sobrancelha, confuso, mas intrigado.

— Presente principal? O que você está planejando?

Anna apenas riu, um som suave e sedutor que fez seu coração acelerar novamente.

— Você vai ter que esperar para descobrir. — Ela respondeu, passando por ele para sair do chuveiro.

Paul ficou parado, observando-a enquanto ela se secava com uma toalha, sua mente girando com possibilidades. Ele sabia que Anna adorava surpreendê-lo, e a ideia de que algo ainda mais intenso estava por vir o deixou ansioso.

— E vamos logo com esse banho. Nossos convidados vão começar a chegar em meia hora. — Ela enrolou a toalha no corpo e saiu.

Paul ficou sozinho no chuveiro, a água ainda caindo sobre seu corpo, mas sua mente já estava longe dali, imaginando o que Anna poderia estar planejando. Ele sabia que ela nunca decepcionava, e a antecipação só aumentava seu desejo. Enquanto ele fechava os olhos e deixava a água lavar o resto da tensão de seu corpo, mal podia esperar pela noite que estava por vir.

Mal sabia ele que aquela noite guardava surpresas inimagináveis. Muito além da promessa da esposa.

Continua …

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Comentários

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Essas meninas são demais rs .

Cada capítulo tenho que tomar remédios contra pressão.

Eu torço demais para o casal principal se dê bem , mas sei que precisam passar com algumas turbulências.

Acredito que Celo achou alguma coisa contra o Jonas, vamos esperar o próximo capítulo.

Parabéns Meninas

Beijo 💋 do Doda

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Eita que essa festa vai ser de arromba e pelo visto pode sair muitas bombas,faíscas e reviravoltas.

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Ese atraso no sexo entre o Celo e a Mari, pode durar mais alguns capítulos... Sei não, essa festa tá prometendo... alguma.coisa pode desandar lá... ou não...😂 E outra, o Jonas vai provocar o Celo, vamos ver se o Marcelo cai nessas provocações... A Cora, para mim, ainda está sob observação. Da noite pro dia de bruxa à fada...? Sei não...

A verdade é que as meninas estão de parabéns com o conto. ⭐️⭐️⭐️ Publiquem outro capítulo ainda está semana.🌹

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Que o Paul só leve a mal um pouquinho, mas queria a Anna como minha cara metade, ela só tem um defeito, loura... Tenho uma predileção natural para morenas. Rs.

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É fácil resolver esse probleminha kkk. É só pedir ela para pintar o cabelo kkk

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Excelente com esses suspenses história eletrizante

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"Casablanca" e "E o vento levou" na mesma tarde? Celo provou com honras sua vontade de estar próximo de Mari... Quase seis horas de filmes não é para qualquer um!

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Realmente, se ele queria provar alguma coisa … depois de 6 horas, acho que provou !!!

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E a Dani, sem querer, quebrou mais que o clima dos pais !!! Rsrsrs

Sinais, tem que ter atenção com os sinais .

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