O internato - Capítulo 22

Um conto erótico de Bernardo, Daniel e Theo
Categoria: Gay
Contém 2851 palavras
Data: 05/07/2025 23:02:24
Assuntos: Gay, Amor

Capitulo 22 - Ecos da Ausência

...

Bernardo

Ao abrir a porta do quarto, dei de cara com Théo guardando algumas roupas na cômoda já abarrotada. Seus movimentos estavam mecânicos, e seu olhar distante, bem diferente do garoto confiante que eu costumava conhecer. Havia algo melancólico em seu semblante.

— Você se incomoda se eu usar aquela gaveta vazia? — ele perguntou, e até sua voz soava estranhamente abalada.

— Pode ficar com ela inteira, porque amanhã mesmo vou pedir transferência de quarto — respondi, jogando meu corpo na cama.

— Eu entendo — ele murmurou, parecendo resignado. — Mas você sabe que não precisa fazer isso.

Olhei para ele incrédulo.

— Tá brincando comigo? — levantei o tronco — Nossa amizade acabou no momento em que você me ameaçou! Mal consigo te encarar.

— Me desculpa — ele disse, e aquilo me pegou de surpresa — Eu jamais deveria ter feito aquilo. Devia ter apagado o vídeo no momento em que o recebi. E mais do que isso: eu deveria ter apoiado desde o começo você e o meu irmão.

— Quem é você e o que fez com o Théo? — ironizei, soltando um riso sarcástico.

— Tô falando sério — ele me encarou com sinceridade no olhar — Fui um idiota, um péssimo amigo. Mas quero consertar isso.

Seus olhos azuis não deixavam dúvidas: ele estava falando a verdade. Mas o problema é que eu conheço bem o quanto é difícil mudar de verdade. Leva tempo. Recaídas acontecem. Mesmo depois de tudo o que Théo já tinha feito e dito, eu ainda tentei manter nossa amizade, pensando que era só ciúme de irmão. Mas quando ele usou meu maior trauma contra mim… aquilo eu não conseguia esquecer. Minha confiança foi quebrada. Até com o Daniel ela demorou a se reconstruir. E diferente dele, eu não era de simplesmente perdoar e seguir em frente.

— A gaveta é sua — respondi, me levantando para ir direto ao banho.

No dia seguinte, fui até a direção pedir minha transferência. O novo diretor me questionou sobre o motivo, e fui direto: disse que minha convivência com meu colega de quarto estava prejudicando a ambos. Ele sugeriu que conversássemos e tentássemos resolver, mas eu disse que já havíamos tentado e que isso não deu certo. Ele então propôs me colocar no quarto do Nick, o que eu recusei imediatamente — afinal, Nick era namorado do Théo, e isso só complicaria ainda mais a situação. No fim, ele concordou em me realocar para um quarto individual, no quarto andar.

Quando saí da diretoria, Giovana estava me esperando do lado de fora.

— E aí? — ela perguntou, abraçando o fichário cor-de-rosa como se fosse um bicho de pelúcia.

— Tudo certo. Vou mudar de quarto. — mostrei o papel com o número e as instruções para pegar a chave na administração.

— Quer ajuda com as malas? — ela se ofereceu com aquele jeito prestativo — Sinto que você está precisando conversar.

E ela estava certa. Eu precisava, mais do que nunca, colocar tudo pra fora. Fomos para a aula de filosofia e, depois dela, teríamos um tempo livre. Normalmente, eu passava esse intervalo com Giovana, Théo, Nick, Fábio e Alice. Antes disso, Patrick também fazia parte do grupo, mas depois de tudo o que soubemos, nos afastamos completamente dele. Hoje, ele mal fala com alguém, passa o tempo com uns garotos nerds da sala.

Durante esse intervalo, peguei a chave na administração e voltei ao quarto para buscar as malas, que já estavam prontas desde a noite anterior. Giovana me ajudou a levá-las e a guardar minhas coisas no novo espaço.

— Quando quiser falar, tô aqui pra te ouvir — ela disse enquanto dobrava uma camisa florida e colocava na gaveta. — Você sabe que sou boa nisso.

— Eu sei — murmurei, sem energia — O problema é que nem consigo pensar no que fiz, muito menos falar em voz alta. Foi nojento.

— Tem a ver com o Daniel, né? — ela perguntou, séria.

Hesitei. Confiei no Théo e fui traído. Mas com Giovana… ela sempre foi verdadeira. Não havia motivo algum para ela querer meu mal.

— Sempre é — confessei, com um sorriso triste. — Parece que minha vida inteira se resume a ele e eu.

— Não tudo, mas ele é, com certeza, uma parte importante — disse, sentando-se na cama e dando leves tapinhas no espaço ao lado.

Sentei também. Bastou isso para desabar em lágrimas.

— Eu fiz algo que, se o Daniel descobrir, nunca vai me perdoar — falei entre soluços — Eu o traí com o Nick.

Esperei que ela me julgasse ou simplesmente se afastasse. Mas Giovana não fez nada disso. Apenas me olhou, serena, como se aquilo não fosse nenhuma grande surpresa.

— Eu imaginei que fosse algo assim — ela disse, revelando alguma surpresa — Mas, pra ser sincera, achei que fosse traição da parte do Daniel. Não esperava isso de você.

— Isso é porque você não me conheceu no ano passado — falei, ainda chorando. Então contei tudo: sobre o Bernardo impulsivo, viciado em sexo e em ser desejado. Contei do vídeo, da chantagem do Théo, e como acabei cedendo ao Nick.

Giovana ouviu tudo em silêncio, embora suas expressões variassem conforme eu relatava. O mais curioso era que ela não se chocava. Parecia escutar como quem escuta alguém contar que comprou pão na padaria. Era calma demais.

— Você acha que ainda é essa pessoa? — ela perguntou com uma doçura desconcertante.

— Às vezes sim — respondi sinceramente — Pelo menos, fui essa pessoa quando traí o Daniel.

— Eu acredito nisso — ela apertou minha mão com carinho — Mas também vejo o garoto incrível que tá bem aqui na minha frente. As duas versões são você, Bernardo. Claro que você não é só aquele garoto do passado… mas também não é o santo que quer ser. Você erra, você acerta. Isso é ser humano. Não tô dizendo que trair foi certo, mas não adianta jogar essa culpa numa “outra versão” sua. Foi você quem fez.

— Eu sei — murmurei, olhando para nossas mãos — Mas é muito mais fácil culpar um Bernardo imaginário do que aceitar que a culpa é toda minha.

— É duro, eu sei. Mas você não pode mais fugir das consequências dos seus atos. Assumir é o primeiro passo.

— Eu não culpo ninguém… — tentei me defender.

— Culpou seus pais. Culpou a sociedade. Sempre teve alguém pra responsabilizar — ela retrucou com firmeza. — Me diz, por que você agia daquele jeito?

— Porque eu não queria me importar com o que os outros achavam de mim — respondi, finalmente entendendo. — Porque se me aceitassem como eu sou, eu não ia sofrer. Cresci ouvindo que ser como eu sou era errado. Que a gente era escória. Tudo que fiz… foi por raiva.

— E é sempre culpa de alguém, percebe? — ela apontou — Nenhum pai sonha em ter um filho gay. Eles ensinam o que acham certo… tentam proteger à maneira deles.

— E você acha isso justo? — rebati, magoado — Sabe o quanto uma criança se sente quebrada ouvindo que é errada? O quanto isso destrói a cabeça da gente? Sabia que o índice de suicídio entre garotos gays é absurdamente maior?

— É claro que não acho certo. E não tenho ideia do que isso significa de verdade — ela admitiu — Mas seu pai acabou te aceitando. E sua mãe…

— Minha mãe tá internada num hospital psiquiátrico! — explodi, sentindo o peito doer — Isso te parece aceitação?

— Com certeza ela já tinha problemas antes. Mas o que quero dizer é que você se agarra a isso pra justificar tudo — ela respondeu com calma — Inclusive essa traição. Chegou ao ponto de criar uma versão paralela sua pra jogar a culpa. Mas a verdade é que você quis transar com o Nick.

— Eu quis. E gostei muito — confessei com dor, como se as palavras me rasgassem por dentro.

— Era isso que você precisava admitir — ela disse, serena — Se sente melhor agora?

— Não. Parece que tomei um soco no estômago.

— Vai melhorar quando você contar pro Daniel — ela afirmou. — Ele pode entender. Mas mesmo que não entenda, é o caminho pra tentar reconquistar a confiança que você mesmo destruiu.

— Ele nunca mais vai confiar em mim — sussurrei, chorando.

— Confiança se perde rápido, mas pode ser recuperada. Só que o primeiro passo é contar. E tem que ser você. Antes que ele descubra por outra pessoa.

...

Daniel

– Que situação estranha – comentou Samuel depois que contei a ele sobre meu pai naquela manhã. Tínhamos acabado de sair da aula de educação física e estávamos no vestiário tomando banho. Os outros garotos ainda ficavam um pouco constrangidos em ficarem nus perto de nós, mas a gente fingia que não notava, embora preferíssemos esperar até que a maioria já tivesse ido embora para entrar no chuveiro.

– Eu também fiquei sem chão – falei enquanto desligava o chuveiro e pegava minha toalha – Ainda tô tentando entender tudo.

– É muita barra, cara – Léo disse, se intrometendo na conversa enquanto amarrava o tênis no banco – Sempre achei seu pai totalmente fora de qualquer suspeita.

– Eu também – Samuel concordou. – Mas pelo menos agora vocês têm uma explicação... Pode ser o começo para encerrar esse capítulo de vez.

– Pra mim até que sim, mas o problema é o Théo – respondi, me sentando para vestir o uniforme. – Ele tá tão preso nisso tudo que não consegue dar um passo pra frente.

– Já tentou conversar com ele sobre isso? – Samuel perguntou, saindo do chuveiro também. – Você sempre foi o único que ele escutava.

– Não dessa vez – falei com um suspiro pesado. – Ele passou o final de semana inteiro trancado no quarto, sem falar com ninguém além do Nick. Mas acho que o namorado dele não foi de muita ajuda.

– Se quiser, eu posso tentar falar com ele – Samuel ofereceu. – Vai que ele me escuta.

– Duvido, considerando o passado entre vocês dois – falei com um sorriso contido. – Mas tentar não custa.

Nos vestimos e nos preparávamos para voltar à aula de português, quando Samuel disse que tinha esquecido o livro no dormitório e me pediu para acompanhá-lo. Achei meio estranho, porque tinha certeza de que o vi colocando o livro na mochila mais cedo, mas resolvi não questionar. Léo até se ofereceu para ir junto, mas Samuel desconversou e pediu para ele ficar e anotar a matéria, prometendo que depois repassaria tudo. Léo achou esquisito também, mas não insistiu.

Seguimos em silêncio até o quarto. Assim que entramos, Samuel fechou a porta atrás de si e falou:

– Você podia ter me ligado quando soube de tudo aquilo – disse com um tom meio ressentido. – Eu entendo você não ligar pro Léo, porque apesar de ele ser um ótimo amigo, ele é meio desligado. Mas pra mim? O que tá acontecendo, Daniel? A gente sempre foi muito próximo. Eu sempre fui a primeira pessoa com quem você desabafava… agora parece que eu fiquei pra escanteio.

– Não é nada com você, Samuel – falei, tentando acalmar a situação. – Eu só não tava bem pra conversar com ninguém naquele momento.

Ele me olhou nos olhos como se buscasse alguma mentira escondida, mas quando viu que eu estava sendo sincero, acabou relaxando.

– Desculpa, Dan. É que ultimamente eu tenho me sentido deixado de lado – ele confessou. – A gente quase não conversa mais, e parece que você vive grudado no Bernardo.

– Tá com ciúmes do Be, é isso? – perguntei, achando engraçado.

– Acho que tô sim – ele admitiu, meio corado.

Me aproximei, e ele desviou o olhar, fixando os olhos no chão. Segurei seu queixo com delicadeza e o fiz me encarar.

– O Bernardo é meu namorado, mas você sempre vai ser meu melhor amigo. E eu nunca, nunca vou te deixar de lado.

– Eu sei disso – ele respondeu, visivelmente envergonhado pela forma como reagiu.

– Vamos pra aula? – sugeri com um sorriso.

...

Théo

Aquela noite prometia ser longa. Eu soube disso logo após o jantar. Estávamos todos juntos à mesa, rindo e trocando piadas como se nenhum de nós tivesse qualquer tipo de problema. Compartilhamos histórias do dia e até Daniel contou a bizarríssima situação dos góticos na cabana do zelador. Isso acabou gerando uma discussão animada sobre o quão estranhos eles pareciam, enquanto Nick e Giovana tentavam defendê-los — com pouco sucesso. Bernardo, por sua vez, participava mais como ouvinte. Isso por si só não chamaria atenção, se não fosse pelo jeito como o garoto gótico da nossa turma (acho que o nome dele é Lorenzo) trocava olhares intensos com o meu cunhado. Não eram olhares de interesse romântico nem sexuais, mas sim algo mais sombrio — como se estivessem se estudando. Havia algo ali que me incomodava profundamente.

Por minha parte, estava quieto. Era uma semana difícil — a conversa com meu pai tinha mexido demais comigo, e o Nick... Desde que foi até minha casa me ver chorando descontrolado, ele ficou estranho. Mais distante. Talvez aquilo tenha assustado ele.

Depois do jantar, voltamos para os dormitórios. Aquele era o momento em que, normalmente, eu entrava no quarto com o Bernardo ali ao lado, mas dessa vez ele seguiu direto para o andar de cima. E eu fiquei para trás, sozinho. Abri a porta e encontrei o quarto vazio. Vazio mesmo. Sem os tênis dele perto da cama, sem livros na cômoda, sem o iPad em cima da escrivaninha. As roupas tinham sumido da gaveta. Olhei em volta e senti um baque no peito. Tudo parecia maior, silencioso e sem cor.

Uma tristeza me invadiu quando comecei a lembrar dos momentos que passamos juntos ali: das conversas até tarde, das vezes em que fiz prancha no cabelo dele e ameacei pintar com tinta azul, do nosso selinho na noite da festa de boas-vindas. Lembrei até do quanto eu brigava com ele por desligar o ar-condicionado no meio da madrugada, do canto baixinho quando usava os fones e fazia a lição, do perfume de rosas que ele deixava no banheiro. Cada detalhe, cada lembrança... tudo voltava como uma sequência de cenas rápidas, como se minha mente quisesse me punir. Porque eu sabia: eu o afastei.

Acariciei o lençol da cama dele, buscando algum conforto, alguma presença que pudesse aliviar a dor. Uma lágrima escapou, e eu a limpei rapidamente. No fundo, sempre soube que terminaria sozinho. Meu irmão agora tinha a vida dele com alguém que o amava. Nick, meu namorado, mal me deu um beijo de boa-noite e desapareceu com a desculpa de que estava cansado. E meu melhor amigo? Foi embora porque não me suportava mais. Eu empurrei todos para longe.

Fui para o banho e deixei a água quente escorrer pelo meu corpo, tentando silenciar tudo por dentro. E por um momento, consegui. Comecei até a pensar em coisas banais — tipo os professores — e foi então que, ao sair do banheiro, falei sem pensar:

— Be, você viu como o professor...

Mas ele não estava lá. E a ausência dele me atingiu como um soco. Me vesti em silêncio e deitei. O quarto agora me sufocava.

Não lembro exatamente quando dormi, só sei que acordei com o som do celular. Me virei instintivamente para a cama dele, como se ainda houvesse uma chance de tudo aquilo ter sido um pesadelo. Mas estava igual à noite anterior: vazia. Intocada.

Me arrumei sem vontade, mas sabia que precisava continuar. No refeitório, ele estava lá, sentado, aguardando os outros. Acenei de longe e ele retribuiu. Fui buscar meu café — um misto quente, uma pera e um copo de iogurte — e me sentei de frente para ele.

— Tá tudo bem com você? — perguntei com um nó na garganta.

— Bem — respondeu, dando de ombros — Dormi como uma pedra. Fazia tempo que eu não tinha uma noite tão tranquila. E você?

Queria acreditar que ele estava mentindo, mas seu rosto tranquilo dizia o contrário.

— Também — menti baixinho.

Ficamos em silêncio, com aquele clima estranho pairando no ar. Era esquisito falar com Bernardo agora que ele estava em outro quarto. E ainda pior era ter que mentir.

— Senti sua falta — admiti.

Ele olhou nos meus olhos, prestes a dizer algo, quando Daniel chegou com Samuel.

— Aí está o melhor namorado do mundo — Daniel disse antes de sentar e dar um beijo apaixonado no Bernardo.

— Oi, amor — Nick apareceu do nada e sentou-se ao meu lado. Me assustei porque nem percebi quando ele chegou. Esperei por um beijo, um carinho, qualquer coisa. Mas não veio.

— Vai comer essa pera? Já tinha acabado lá quando fui pegar — ele disse, sorrindo.

Entreguei a fruta, engolindo a frustração. Ele a pegou e deu uma mordida, como se estivesse tudo ótimo. Samuel, sentado do outro lado, apenas me lançou um olhar compreensivo. A gente sempre se entendeu sem precisar dizer nada. E ali, a conversa foi toda no olhar:

“Não adianta fingir. Eu sei que você não tá bem.”

“Eu vou ficar, tá?”

“Não vou deixar pra lá.”

“Eu sei disso.”

“Então mais tarde a gente conversa.”

“Ok. Ok. Ok.” — revirei os olhos e mordi meu sanduíche.

Com o tempo, o resto do grupo se juntou à mesa. O refeitório enchia, o burburinho das conversas subia. Olhei de novo para Bernardo e percebi que ele trocava olhares com Lorenzo, que estava a duas mesas dali com o grupo de góticos. Era um tipo de troca de olhares difícil de explicar. Não parecia flerte. Era algo... denso. Talvez ligado ao que rolou na cabana do zelador? Não sei. Mas tinha algo naquele clima que me deixava inquietoContinua...

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Comentários

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Nossa que clima pesado emh... estou aqui esperando pra ver o que vai acontecer.

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