03___ COM “Y”

Um conto erótico de Thomas Britto
Categoria: Heterossexual
Contém 2003 palavras
Data: 21/07/2025 17:17:18
Última revisão: 21/07/2025 18:17:59
Assuntos: Heterossexual

03___ COM “Y”

Bya acordou cedo com uma sensação estranha no corpo.

Uma mistura de leveza com ansiedade.

Como se algo estivesse mudando, mas ela ainda não tivesse entendido.

Mandou uma daquelas mensagens prontas de "bom dia", com emoji de sol e coração.

Ela achava fofa — pensava que ele também fosse gostar.

Mas Diogo não respondeu.

Enquanto esfregava o chão da cozinha, sentia o peso da discussão com a tia e o celular fazendo lembrança — quieto — no bolso do short ordinário.

Ela limpava aquele chão com força, como quem se pune por ter feito algo de errado.

Ela sabia que ele treinava de manhã. Talvez a demora fosse só isso.

Quando o relógio marcou 11h28, ele finalmente respondeu:

Logo tô indo pra casa estudar. Tenho prova à noite. Bom dia.

Ela não queria parecer ansiosa, mas já estava. E muito.

Tentou continuar a conversa com leveza, com medo de que ele sumisse.

— Ah, verdade. Estudar é importante mesmo.

Pensei em ir pra cidade hoje, passar na academia, dar um oi, mas minha tia não precisou. Então fiquei por aqui mesmo.

— Ah, beleza. Vou indo nessa que ainda tenho que resolver uma parada antes de ir pra casa.

Parada? Nem disse o que era...

Ela relia a mensagem, tentando achar alguma intenção escondida.

Mas nada...

Mais tarde, ela precisou ir ao açougue do bairro, virando duas esquinas adiante e muitas outras ruas pra lá. Difícil de achar... Era pequeno, dentro da garagem de uma casa... o chão meio grudento, parede feia com uns remendos de azulejo azul, e a luz branca irritante.

O homem atrás do balcão parecia um estranho qualquer. Uns 45 anos, corpo normal, meio entroncado, avental velho e manchado grudado ao peito, barba por fazer, rosto inchado e cansado da vida. Um tipo comum, desleixado, fácil de esquecer.

Mas, quando ela entrou, ele a olhou como quem reconhece carne nova no pedaço. O olhar reparou nela com lentidão — não era grosso, era cru. Como se quisesse experimentar o gosto.

E aquilo fez o estômago dela revirar.

O cheiro da carne crua subia das vitrines abertas, misturado com sangue velho, mosquitos zumbindo. Era tudo nojento demais, bem diferente do carro de Diogo.

Ele não sorriu. Só a encarou, como se já soubesse o que vinha. Como se fosse natural olhar daquele jeito.

Mediu o corpo dela com os olhos, da camiseta branca até as pernas. Não foi rápido. Nem sutil.

E aquilo a deixou sem saber se voltava ou fingia que não sentiu.

Ele chegou ao balcão e sorriu — um sorriso torto, sem vergonha de existir.

— Nova por aqui? — perguntou, enxugando a mão num pano grosso, sem parar de encará-la.

— Tô morando com minha tia. Valdirene. Lá na casa do Osmar.

Ele assentiu devagar, ainda olhando, sem fazer ideia de quem era essa gente. Depois encostou os dois braços sobre o balcão e perguntou, com a voz mais baixa:

— E o nome da moça?

Nervosa como estava, respondeu rápido antes de pensar:

— Bya. Mas com Y.

O olhar dele foi de surpresa e a boca se abriu num meio sorriso meio debochado, como se aquilo tivesse autorizado alguma coisa.

— Com Y, é? Diferente. Fica mais... moderno — disse, olhando direto pros seios dela, — e combina com você.

Ela engoliu seco.

Era só um nome, mas do jeito que ele repetiu, parecia que tinha escutado outra coisa.

Como se ele tivesse ganho algum tipo de intimidade que ela não ofereceu.

Sentiu vergonha na hora, mas o corpo dela respondia com um arrepio estranho na coluna.

— Então... a Bya com Y veio buscar o quê hoje? Tem frango, carne... e uma linguiça caseira, especial. Se quiser experimentar...

A pausa depois da palavra “linguiça” ficou no ar como se tivesse peso.

Sentiu o rosto arder. Não era só raiva. Era raiva misturada com outra coisa — algo que brotava sem permissão entre as pernas.

Um calor que parecia não combinar com aquele lugar imundo, mas que vinha mesmo assim.

Sentiu a calcinha molhar. Sentiu vergonha na hora.

Queria sumir dali.

— Carne moída e coxão duro. Meio quilo de cada — disse, desviando o olhar.

O som da faca sendo afiada atrás do balcão, parecia fazer eco dentro dela.

Ela não sabia o que sentir.

E se fosse o Diogo dizendo aquilo... será que teria gostado?

Pagou.

E, na hora de entregar o pacote, ele segurou de leve a ponta dos dedos dela mais do que precisava e falou baixinho:

— Se quiser alguma outra carne especial... eu arranjo pra você.

Saiu do açougue atordoada, como se estivesse suando por dentro.

Devia ser por causa daquele calor infernal, das sacolas batendo nas pernas, dos olhos meio fechados pela claridade que borravam o chão.

Estava tão tensa que nem reparava na calçada esburacada.

Como se fosse castigo. Tropeçou e caiu. De joelhos. Com a sacola voando longe.

Ainda estava se levantando quando viu, meio de ponta-cabeça, um carro passando devagar.

Fiat Bravo preto.

Vidros escuros.

Placa começando com DFP. Ou era OPF?

O coração acelerou.

Era ele?

Será que ele tinha perguntado pra Clara onde ela morava?

Será que passou aqui pra me ver?

Chegou em casa com o joelho ardendo e os pensamentos embaralhados.

Entrou no quarto, trancou a porta e mandou mensagem:

Oi… tá tudo bem com você? Qual a placa do seu carro mesmo?

Treze minutos depois ele respondeu:

Ué, por quê?

Acho que vi seu carro passando aqui na rua agorinha. Começava com DFP, acho...

Ahnnn… então você tá me stalkeando agora, é?

Será que não era um outro carro igual ao meu andando por aí, Bya com Y?

Ela sorriu fraco com a resposta... quase como idiota.

Mas não queria mentir.

Então contou logo:

Não, é que foi sem querer. Eu tava voltando do açougue.

Eu saí meio estranha, até caí na calçada... Esquece, vai...

Estranha como?

O açougueiro foi meio debochado, sei lá...

Quando ele perguntou meu nome, eu falei sem pensar...

Saiu: Bya. Com Y.

Depois fez uns comentários, parecia safado.

Demorou uns segundos.

Depois veio a resposta:

É mesmo? E você falou mesmo que era a Bya com Y?

Que bom que você tá levando isso a sério.

E, pelo jeito, já tá fazendo sucesso então.

Se o cara ficou assim só por causa do nome, então foi uma ideia boa.

Pode ser — respondeu como quem tenta se convencer.

Se eu fosse o açougueiro e visse você falando seu nome assim…

Bom, acho que eu também ia te fazer um elogio. Relaxa. Faz parte.

Ela leu aquilo com a respiração presa.

Era pra se sentir lisonjeada? Ou culpada?

Isso mexia com ela de um jeito confuso.

Se eu sugeri, é porque tem um motivo.

Você ainda vai entender tudo.

Depois de alguns segundos em silêncio, ela digitou:

E eu ainda tropecei vindo pra casa, acredita?

Caí de joelhos.

Tava tão nervosa que nem vi o buraco na calçada.

Caramba, Bya, parece que você ficou mexida mesmo com isso...

Se machucou?

Ralei o joelho. Nada demais.

E você foi lá vestida como?

Normal, do jeito que você me viu aquele dia... uma camiseta branca simples.

Hmmm…

Então, mas por que será você ficou nervosa com o cara?

Sei lá, o jeito que ele me olhava, a sensação dele ficar me reparando...

Não sei explicar, eu não tava fazendo nada...

Você não precisa entender tudo agora.

Mas presta atenção porque essas coisas vão começar a acontecer mais.

Não dá pra você tropeçar e cair toda vez que um cara te elogiar.

Relaxa, garota.

Você tá mudando.

E isso chama atenção mesmo, os caras notam.

Ela não respondeu logo.

Sentia o coração bater entre as pernas.

Mas também sentia uma angústia difícil de nomear.

De repente, era como se ela estivesse se expondo demais, sem fazer esforço.

Pensou em encerrar a conversa, mas não queria parecer fria.

Então soltou:

Minha tia tá me chamando aqui.

Preciso ajudar com umas coisas.

Era mentira.

Mas era mais fácil do que continuar se abrindo.

A resposta dele veio em tom neutro:

Beleza.

Tenho que sair também. Já vou pra facul.

Não quero perder a hora por sua causa de novo.

Ela tentou manter o clima leve:

Então vê se não vai demorar muito no banho de novo, hein… senão vai acabar jogando a culpa em mim...

Ele respondeu rápido, como se já tivesse essa frase pronta na ponta dos dedos:

Fica tranquila. Hoje não vou pôr a culpa em você.

Nem vou perder hora… já dei uma aliviada quando voltei do treino.

Peguei pra ver uns filminhos no celular… hehe.

Fui, garota… te cuida, Bya com Y.

Ela ficou olhando pra tela.

“Já dei uma aliviada hoje?” “Filminhos?”

Jantou em silêncio.

Nem sentiu o gosto da comida.

Relia as mensagens e só conseguia sentir vergonha de si mesma.

Parecia óbvio agora.

Ela tinha corrido atrás da própria humilhação.

Com a própria mão.

Ele era um cara mais velho. Experiente. Sabia das coisas.

Talvez ela fosse só uma distração.

Mas, mesmo se fosse… o corpo dela não queria saber.

Depois de arrumar a cozinha, deitou na cama.

A casa estava em paz — a prima tinha saído com o namorado.

Estava sozinha.

Mas inquieta.

E a esperança querendo uma desculpa.

Abriu o telefone.

Não devia.

Mas mandou a mensagem:

Oi… tudo bem? Como foi a prova?

Será que você podia me mandar uma foto sua?

No seu contato não aparece pra mim…

Um erro.

Ela sentiu na hora.

Ficou ali, olhando a mensagem.

Nada de resposta.

Quase uma hora depois.

Nada.

Resolveu apagar.

Mas era tarde.

Ele já tinha visualizado.

E só quase às dez e meia da noite, ele respondeu:

Foto, minha? Pra quê? Tomara que você goste...

Mas juízo aí, hein.

E nem pensa em postar essa foto.

Tô indo dormir, Bya com Y.

A foto chegou logo depois.

Diogo, de frente para aquele carro.

Lindo como ela imaginava.

Cintura pra cima.

Camisa do São Paulo.

Óculos escuros.

Peito largo, braço forte saindo pela manga da camiseta, leve sorriso.

Parecia tão à vontade com a própria beleza que nem precisava fazer charme.

A pose era relaxada, mas com o corpo marcando presença.

“Pena que ele tava de óculos… queria tanto ver os olhos dele de novo…”

Ficou imaginando como seriam os beijos.

A mão dele no cabelo dela, segurando firme.

O cheiro do banco de couro quente.

O som da voz dele a chamando de Bya.

Com Y.

O calor voltou de repente.

Uma onda quente que subiu pelas coxas e apertou o peito.

Correu pro banheiro.

Era o segundo banho do dia.

Mas não entrou direto.

Ficou ali, ainda com a toalha no ombro, encarando a foto dele aberta na tela.

Se encostou na parede fria do azulejo e deixou a toalha cair.

Desceu a mão devagar.

Primeiro por fora, como quem pede licença.

Mas o calor já molhava os dedos.

Na cabeça, era tudo uma confusão.

O som da faca afiando, o ronco do motor do carro, aquele sorriso torto, o cheiro da carne crua, o perfume dele com couro quente — tudo se misturava.

As frases voltavam misturadas como se fossem de uma mesma voz:

“Você tá mudando, garota...”

“Se quiser uma carne especial eu arranjo...”

“Confia em mim, eu também te faria um elogio desse”

O gozo veio desesperado.

Rápido, quente, involuntário.

Ela tentou se conter, mas o corpo sacudiu sozinho, trêmulo e tenso.

Quase gemeu alto — mordeu os lábios pra não fazer barulho.

Sentiu o coração disparar.

E, no fundo, uma pontada estranha de humilhação.

Por ter gozado sozinha pensando essas coisas.

Finalmente se sentiu relaxada o suficiente pra conseguir dormir.

O peito ainda subia e descia, ofegante.

Secou-se devagar, com a toalha ainda úmida.

Mais uma vez, deitada na cama, fez uma oração baixinho.

Juntou as mãos com o cheiro dele ainda no dedo.

E sussurrou:

— Desculpa por hoje, Senhor.

Eu só queria ser feliz.

Mas, se ele gostar de mim de verdade…

Me dá um sinal.

E adormeceu assim.

Com a culpa molhada entre as coxas.

E a esperança presa entre os dedos.

Como quem dorme esperando ser perdoada.

Ou tocada de novo.

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