02___ PONTOS PERDIDOS

Um conto erótico de Thomas Britto
Categoria: Heterossexual
Contém 1184 palavras
Data: 21/07/2025 08:47:18
Assuntos: Heterossexual

02___ PONTOS PERDIDOS

Bya ainda sentia a calcinha molhada enquanto caminhava até o ponto.

Tinha a boca amarga da cerveja e sentia o calor do couro grudado nas pernas.

Os carros passavam com pressa, fazendo o vento quente da tarde bater no rosto, mas não refrescava.

Nada refrescava. O corpo ainda estava aceso, em alerta.

A mente girava, inquieta...

O ônibus chegou, lotado.

Ao subir, havia muita gente, muitos pensamentos pelo caminho.

Ela entrou na guerra do empurra-empurra e acabou perdendo os últimos lugares para sentar, ficando de pé, mais ou menos espremida entre dois corpos.

Não era comum não haver lugar para sentar naquele horário, pensou.

O calor ali dentro era muito diferente do carro de Diogo.

Ali, a realidade era outra... ali era vida real, nua e crua.

Suor sem desodorante, cansaço sem charme, sacola de mercado no chão, criança e gente chata.

Gente normal como ela — que ela conhecia tão bem...

Mas, mesmo no desconforto, as lembranças vinham como em provocação.

Seu corpo afundado no banco de couro quente. O som grave da sua voz.

O jeito como ele dirigia, com o colo aberto e a perna flexionada.

O olhar lento e aquela voz prevendo coisas sem aviso:

— Você vai se acostumar.

Ela riu por dentro...

Será que era sobre eles?

Ele tinha planos para ela?

Agora, sozinha no ônibus cheio, a conversa parecia fazer muito sentido.

— Você tem cara de Bya, com “Y”. Coisa de mulher que tá começando a se entender.

Ela queria acreditar, queria demais.

As lembranças vinham feito um filme de ônibus desgovernado...rápidas, embaralhadas, sem sequência, quase hipnóticas.

— Será que nem um beijo seu eu vou ganhar?

Ela sorria sozinha, que nem uma tonta, sem perceber o redor.

Só percebeu mesmo quando olhou pela janela e viu uma esquina muito errada.

— Merda...

Tinha passado. Perdeu o seu ponto. Literalmente.

Desceu três pontos adiante, depois de apertar o botão com pressa.

Começou a andar rápido pelas ruas silenciosas do bairro, sentindo o estômago começar a virar. Achava que era fome.

O álcool ainda a deixava relaxada, mas ao parar em frente à casa da tia, sentiu o clima pesar... seu corpo tenso — como se a realidade a estivesse esperando na porta pra estragar tudo.

A casa era bem simples, apertada entre várias casas de bairro idênticas e mal acabadas.

O portão emperrava logo na entrada, avisando todo mundo que alguém havia chegado... Do lado de fora, o piso era grosso, as paredes ainda no tijolo vermelho e o jardinzinho estava mais para mato.

A entrada pelo corredor lateral dava direto na cozinha, que era junto com a sala.

Ali, o cheiro de óleo frito e alho tomava conta do ar.

E lá estava a tia parada, na porta, de cara fechada.

— Já não basta não ajudar com o almoço, ainda chega essa hora? — reclamou logo, sem nem perguntar onde ela tinha estado.

Bya mal abriu a boca:

— Calma, tia, eu tava na academia e depois perdi a hora…

Clara, a prima, já tinha voltado do estágio e lavava a louça com gosto da provocação. Não perdeu tempo e logo soltou:

— Aham... sei. O cara da academia te levou pra tomar cerveja, que eu sei...

O companheiro da tia, esparramado no sofá, via a TV num volume alto demais, e soltou sem tirar os olhos da tela:

— Cerveja? É assim que começa, ouviu, Valdirene... Menina de bairro bebendo cerveja com homem no meio do dia? Esse mundo tá perdido mesmo. Na igreja com a gente ela nunca vai... Que futuro cê acha que vai ter aqui, Beatriz?

A tia bufou alto, cruzando os braços:

— Tô morrendo de vergonha disso, Maria Beatriz. É isso que você faz quando sai de casa? É isso? Você quer voltar pra Brotas?

— Isso pega mal pra mim, onde já se viu... E se os vizinhos ficam sabendo?

— Não é bem assim não, tia... Eu tomei refrigerante só...

Clara provocou com um sorriso:

— E aí... vai me ajudar aqui ou vai ficar aí plantada feito princesa da Disney?

Bya abaixou a cabeça, pegou um pano e começou a secar a louça e limpar a mesa.

Ela sabia que ia se sentir mal depois... Ia se sentir culpada. Sem saber por quê.

Culpa por ter se sentido feliz pela primeira vez com alguém longe daquela casa.

Parece que, pela primeira vez, alguém de fora tinha visto nela alguma coisa especial.

O resto do dia... foi melhor nem dizer...

Passou devagar. Muito devagar.

No banheiro, durante o banho, a água fria escorria devagar.

A água fria parecia um choque necessário.

Ela lavava o corpo, mas não conseguia tirar ele da cabeça.

A lembrança das conversas dele e da briga em casa voltavam inteiras:

O jeito como ele falava. O corpo dele no carro.

O som no fundo. O beijo que ela achou tão romântico.

Mas que não foi...

A noite também demorou a chegar.

Mais tarde, no quarto, ela deitou de lado com o ventilador girando devagar em cima de uma cadeira velha.

Clara apagou a luz.

O escuro chegou.

Mas o corpo de Bya seguia aceso.

Pegou o celular — não aguentava mais não agir — e digitou:

Oi... Queria te agradecer pelo passeio hoje. Gostei do seu convite. Como cê tá?

Esperou.

O coração batendo como se o mundo dependesse da resposta.

Quase quarenta minutos depois, o celular vibrou:

Tô na aula ainda. Cheguei atrasado na faculdade por sua culpa, inclusive.

Ela travou. Sentiu o rosto esquentar. Quase morta.

“Por quê culpa minha?” — estava digitando, quando chegou outra mensagem:

KKKK relaxa, garota. É que quando eu cheguei, demorei mais que o normal no banho por sua causa... tava precisando descarregar a tensão, dar uma aliviada... sabe como é.

E continuou:

Mas foi da hora sim. Curti também. Eu tô meio liso esse fim de mês, mas outra hora te levo passear.

Ela leu devagar.

“Dar uma aliviada...”

Ele tinha pensado nela. Depois.

Encostou o celular no peito.

Respirou fundo. Aliviada.

Quase feliz com o gesto.

O ventilador girava no escuro.

E o corpo dela... continuava elétrico.

Ela tinha que fazer alguma coisa pra se acalmar de vez.

Se virou de lado.

A ponta dos dedos roçou os seios por baixo da camiseta fina.

O toque era lento. Como o beijo dele.

A outra mão desceu pela barriga.

Escorregou entre as pernas.

Abrindo devagar.

Quase sem querer.

Mas querendo tudo.

Fazia meses que não se sentia assim.

Tão nervosa a ponto de explodir.

Tão viva.

Se imaginou de novo naquele carro quente.

Seu cheiro. A boca dele.

Aquele corpo quente ao lado dela, a tatuagem no ombro.

A forma como segurou suas mãos enquanto a beijava.

E quando finalmente se permitiu, o corpo tremeu.

Forte. Quente. Molhado.

O primeiro desde que tinha vindo morar com a tia.

Depois do alívio, ali mesmo, no silêncio escuro, veio o peso.

A culpa. Fechou os olhos.

Juntou as mãos e rezou baixinho:

— Desculpa por hoje, meu Senhor...

Eu só queria ser feliz.

Mas se ele gostar de mim de verdade…

Me dá um sinal.

E adormeceu assim.

Com a culpa molhada entre as coxas.

E a esperança presa no travesseiro.

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