Poder e Cobiça.

Um conto erótico de Lukinha
Categoria: Heterossexual
Contém 5199 palavras
Data: 09/06/2025 14:36:59
Última revisão: 09/06/2025 16:57:48

Apesar de ser tratado como um deles, meu pai sempre deixou bem claro que eu não pertencia àquele mundo. Cresci correndo entre os currais, com cheiro de esterco e leite fresco nas narinas, dormia na casa simples dos peões, dividindo beliche com meu pai, o capataz da fazenda Santa Gertrudes.

Meu mundo sempre teve cerca, e não era de arame. Era feita de classe, de sobrenome, de onde se sentava à mesa e de quem chamava quem de “senhor”.

Ainda assim, cresci junto com os filhos do patrão. Três ao todo: o Pedro, o Otávio e a Clara.

Clara era a mais velha. Tinha um jeito doce, mas firme. Sempre me olhava como quem já sabia demais pro meu próprio bem. Ela me ensinou a ler antes de qualquer professor, me defendia quando alguém da cidade me chamava de “filho de empregado”, e por algum motivo que meu pai dizia ser problema, gostava de passar tempo demais comigo. Dizia, quando ainda éramos pingos de gente, que um dia seria minha esposa.

Pedro era o caçula, meio estabanado. Me seguia pra todo canto, queria aprender a laçar, a montar, a brigar. Era o mais distante, mas o que mais me admirava em silêncio. Miúdo, mas valente.

Otávio era o do meio, e foi meu melhor amigo por muito tempo. Dormia em rede comigo quando a gente fazia acampamento no mato, dividia segredo de infância e, junto comigo, roubava doce da cozinha. A gente era unha e carne. Até que a gente deixou de ser menino.

Foi quando eu comecei a mudar, e a receber elogios, que ele começou a se afastar. Primeiro, foram os silêncios. Depois, os olhares atravessados. A gente ainda andava junto, mas não era mais a mesma coisa. Eu sentia o incômodo dele cada vez que alguma menina da cidade puxava assunto comigo na escola ou depois da missa de domingo. Era como se minha beleza, que até então não significava nada, tivesse se tornado uma ameaça. Um erro de fábrica no sistema que nos mantinha separados.

Meu pai via isso de longe. Sempre viu. E nunca deixou de me lembrar:

— Você pode brincar com os filhos do patrão, mas não esquece quem você é. E, mais importante, quem você não é.

Na época, doía ouvir aquilo. Mas hoje, olhando pra trás, ele só queria me preparar pro mundo como ele é. Porque, nessa terra, a beleza pode abrir portas, mas é o dinheiro que tem todas as chaves.

Eu sempre chamei atenção, principalmente a partir dos quinze anos, quando meu corpo mudou. Os músculos ganharam definição e os traços do rosto ficaram mais másculos. Minha pele é morena de sol, queimada de verdade, dos dias no campo. Braço forte de quem levanta saco de ração, não peso de academia. Cabelo liso, preto, cortado sem capricho, mas no rosto certo tudo encaixa.

Meus olhos são castanho escuros, meio fechados, e já ouvi dizer que pareço sempre desconfiado, talvez porque eu seja mesmo. Nunca fui de falar muito. Mas quando falo, olho firme. Nunca precisei mais do que isso pra fazer mulher tremer o queixo.

Já o Otávio ... ah, o Otávio era o outro lado da moeda. Filho do patrão, criado em lençol limpo e leite fervido. Magrelo, cheio de pose, vivia com um livro debaixo do braço e palavra difícil na boca. Metido a sabido, sempre tentando provar que era mais inteligente que todo mundo. As orelhas grandes pareciam querer sair correndo do rosto dele. O nariz fino, em gancho, meio aquilino, e o cabelo sempre brilhando de tanto óleo.

Para mim, nada daquilo importava. Quem era bonito, quem não era. Eu o admirava, principalmente, sua inteligência. Ele era meu amigo. Meu melhor e insubstituível amigo. Até deixar de ser.

A primeira vez que me interessei por uma garota, também foi quando minha amizade com Otávio acabou de vez. Foi na quermesse da igreja, num daqueles fins de tarde em que a poeira da estrada se mistura com cheiro de pipoca doce e som de sanfona. Ela era nova na cidade. Filha do dentista que tinha acabado de se mudar do sul, uma loirinha linda, de corpinho esbelto, e de longe já dava pra ver que ela não conhecia as regras daquele lugar.

Tava sentada no banco da praça, com um vestido azul claro que balançava com o vento, quando nossos olhos se cruzaram. Ela sorriu. Aquele sorriso fácil, curioso, de quem ainda não tinha sido contaminada pelo “quem é filho de quem”.

A gente passou a noite toda conversando, rindo de coisa besta, trocando segredos como quem troca promessas. No fim da festa, ela me puxou pelo braço:

— Amanhã, no coreto, às quatro?

Ela me deu um beijo na bochecha e saiu em disparada, corada. Balancei a cabeça, com o coração disparando no peito como cavalo bravo.

Só que no outro dia, quando cheguei no coreto, não tinha ninguém esperando. Nem sombra do “vestido azul”.

Voltei pra fazenda com o estômago revirando, tentando entender. Foi só no domingo seguinte que a resposta veio, quando a vi descendo da caminhonete importada do patrão, com Otávio ao lado. Ele tinha aquele sorriso de quem já sabia que eu ia olhar, e que queria que eu visse.

Ela passou por mim com um aceno tímido, sem parar. E ele, com a voz cheia de vitória, soltou:

— Tem gente que sonha alto demais, né?

Aquilo me atravessou como um coice no peito. Meu pai, que viu a cena de longe, só murmurou:

— Tá aí uma lição, meu filho. Enquanto você anda descalço pela vida, tem gente que compra o caminho com sola de couro e nome no cartório.

Daquele dia em diante, Otávio e eu já não éramos mais os mesmos. O “Vem cá, Tavinho …” deixou de existir, dando lugar ao “Sim, Senhor.” Ele fazia questão de deixar bem claro quem era quem. A amizade virou disputa muda. E eu comecei a entender que o mundo que me cercava era bonito, mas não era meu. Eu era o figurante de uma história escrita por outros, e que, se um dia eu quisesse ser mais do que isso, ia ter que rasgar algumas páginas.

Depois que perdi a primeira vez, ou melhor, depois que me tiraram a vitória com dinheiro, carro e promessa de futuro, passei umas semanas feito bicho arredio. Mal falava, mal comia. Até meu pai notou que eu andava com o olhar mais distante do que de costume.

Foi naquela época que comecei a reparar diferente na Silvinha, filha do Zé Canabrava, o peão mais velho da fazenda.

Silvinha sempre foi espevitada. Dois anos mais velha que eu, corpo curvado cedo pelo trabalho e pela natureza. Boca carnuda, olhos espertos, cabelo liso que ela vivia trançando pra não deixar solto no calor do campo. Tinha o tipo de riso que fazia o dia parecer menos seco.

Ela me via calado, carrancudo, e vinha com provocação:

— Vai morrer de amores por moça de laço de fita, João? Aqui no mato é com nó de corda e mão na enxada.

Eu sorria, encabulado, mas não respondia. Até que uma tarde, ela me esperou na beira do açude menor, onde eu costumava lavar o suor do corpo depois do serviço ou buscava refúgio para ficar sozinho, pescando traíra com varinha de bambú. Era um lugar de pouco movimento, longe da agitação principal da fazenda.

— Vem cá. — Disse ela, com a mão na cintura e o sol baixando atrás — Quero ver se esse corpo aí é só bonito ou se sabe usar o que tem.

Não teve conversa. Só calor. Eu estava pronto para perder o cabaço.

A roupa foi saindo aos poucos, como se o mundo ali não existisse mais. A água fria do açude contrastando com o fogo que ela jogava no meu peito com a língua. Eu não sabia de muita coisa, mas segui o instinto, e ela ria, me guiava, me mordia de leve.

— Tá com medo, João? — Ela riu, um riso que ecoava no ar e fazia meu coração bater mais rápido. — Ou tá só esperando que eu vá até você?

— Silvinha … — Comecei, mas as palavras se perderam quando ela colocou a mão no meu peito.

— Cala a boca, João. — Ela falou baixo, quase um sussurro, mas era como se tivesse gritado. — Hoje você vai aprender uma coisa ou duas.

Eu olhei pra ela, tentando entender o que estava acontecendo. Mas não havia tempo pra pensar. Ela se aproximou mais, e eu senti o rosto dela quase encostar no meu. O coração parecia querer sair do peito.

— Você já beijou alguém? — Ela perguntou, mas não precisava esperar a resposta.

Ela sabia que não. Todo mundo sabia. Eu era o João, o calado, o que ficava olhando pra moças de longe, sem nunca chegar perto.

— Não … — Admiti, e ela sorriu, como se aquela fosse a resposta que ela mais queria ouvir.

— Então hoje vai ser um dia de “primeiras vezes”. — Ela passou a mão pelo meu rosto, e eu senti um arrepio percorrer toda a minha espinha. — Mas vamos devagar, João. Não quero te assustar.

Eu não sabia o que esperar, só sabia que não queria que aquilo acabasse. Ela se aproximou mais, e eu fechei os olhos, preparado pra sentir os lábios dela nos meus. Mas veio um leve sopro no meu pescoço, seguido de um risinho.

— Não é assim, João. — Ela falou, e eu abri os olhos, confuso. Ela estava olhando para mim com aquele olhar que eu já conhecia, mas que agora parecia mais intenso. — Você tem que sentir. Não adianta fechar os olhos e esperar que aconteça. Tem que estar aqui, comigo.

Eu engoli de novo, tentando me concentrar no momento. Ela passou a mão pelo meu rosto de novo, e eu senti o toque dela como se fosse a primeira vez. Era quente, suave, mas ao mesmo tempo firme. Como se ela soubesse exatamente o que estava fazendo.

— Pronto. — Ela falou, e então, finalmente, nossos lábios se encontraram.

O beijo começou devagar, como se ela estivesse me ensinando cada movimento. Eu segui o ritmo dela, sentindo o calor dos lábios dela nos meus. Era como se o mundo tivesse parado, e só existíssemos nós dois ali, na beira do açude.

Quando ela se afastou, eu senti uma pontada, mas ela estava sorrindo, como se soubesse exatamente o que eu estava sentindo.

— Como foi? — Ela perguntou, e eu tive que pensar na resposta.

— Bom … — Foi o que consegui dizer, e ela riu de novo.

— Só bom? — Ela levantou uma sobrancelha, e eu me senti um bobo. — Então vamos tentar de novo. Dessa vez, você tem que me surpreender.

Eu olhei pra ela, tentando entender o que ela queria dizer. Mas antes que eu pudesse responder, ela se aproximou de novo, e dessa vez o beijo foi mais intenso. Eu senti a língua dela mexendo com a minha, e foi como se algo dentro de mim tivesse despertado.

Ela se afastou de novo, e dessa vez eu não disse nada. Só olhei pra ela, sentindo o coração acelerado e a respiração mais rápida.

Silvinha desceu beijando meu peito, a barriga… sua mão segurou firme o meu pau duro, latejando de tesão.

— Segura a onda … não vai me fazer perder tempo e gozar rápido.

Ela abocanhou a pica com gosto, mamando como uma bezerrinha sedenta. Tentei resistir, me concentrar, mas a sensação de prazer era tão intensa que o pau ejaculou em um minuto, dentro daquela boca macia.

Fiquei muito envergonhado, queria sumir, mas Silvinha sorveu até a última gota, olhando para mim com os olhinhos brilhando de desejo.

— Hummm … que Delícia … docinha. Bem diferente daqueles peões cachaceiros.

Ela percebeu meu rosto abatido e me acalmou.

— Relaxa … é sua primeira vez. Tá tudo normal. Nós só estamos começando.

A safada nem pediu licença, começando a punhetar o pau que cresceu novamente em instantes. Ela me fez deitar no chão e montou sobre mim, apontando a pica para a entrada da xoxota e descendo de uma vez.

— Que pau gostoso, João … tá me alargando.

Silvinha começou a rebolar, subindo e descendo, esfregando o grelo com a própria mão e gemendo alucinada.

— Como eu tava precisando disso … Ahhhh … que pau grosso … Ahhhh.

Ela fez tudo sozinha, quicando e gemendo, cada vez mais rápido, e tudo aconteceu num instante para mim.

— Tô gozando, João … que loucura … Ahhhh … você agora é meu, João …

Gozei no embalo, e quando ela sentiu o calor da porra, saiu de cima mim brava.

— Tá maluco, João? Avisa que vai gozar, seu puto.

Eu não estava entendendo nada e ela ali, resmungando.

— A culpa é minha, claro, acabei me empolgando. Tô fora de filho.

Mas logo ela se deitou ao meu lado, voltando a beijar minha boca e sossegando novamente.

Ali, deitado na margem, com o cheiro do mato e da pele misturados, eu aprendi o que era prazer. Não o da conquista ou do amor doce, mas o prazer bruto, urgente, que não pede licença nem espera promessa.

Com a perna jogada sobre a minha, ela soltou, rindo:

— Agora entendeu por que mulher de cidade não serve pra você?

Talvez não fosse aquilo. Talvez eu só precisasse mesmo aprender o sabor da carne antes de me confundir com o sabor do sentimento.

Naquele dia, deixei de ser menino e virei homem.

Depois daquela tarde no açude, achei que tinha encontrado alguma coisa em Silvinha. Não amor, talvez nem carinho, mas um certo tipo de alívio. Um jeito de existir sem pensar no que eu tinha perdido.

Nos dias seguintes, ela me olhava diferente. Um riso nos olhos, um balançar de quadril mais firme quando passava perto. Me cutucava quando ninguém via, e eu respondia com olhar cúmplice. Tinha começado um jogo, um segredo entre dois corpos cheios de vontade.

Até que um dia, voltando mais cedo do pasto, passei perto do açude, por puro hábito, queria ficar sozinho com meus pensamentos, estava caminhando. O sol ainda alto. O cheiro de barro e capim fresco no ar.

Foi ali que vi. Ela estava lá, Silvinha, nua até a alma, rindo alto como se o mundo fosse só prazer. Mas o corpo que ela montava, com a água batendo nas coxas e as mãos agarrando firme, não era o meu. Era o do Otávio.

O mesmo que um dia foi meu melhor amigo. Que cresceu comigo nos terreiros da fazenda, dividindo frutinhas do mato e queda de bicicleta. O mesmo que me virou o rosto quando a puberdade chegou e viu que eu começava a chamar mais atenção que ele. O mesmo que tomou a recém-chegada de mim com meia dúzia de presentes e um sobrenome.

Ali estava ele de novo. E daquela vez não foi só inveja ou frustração. Foi traição. Foi tapa sem mão.

Eles não me viram. Fiquei escondido entre o mato e a vergonha, com o coração batendo forte no ouvido, o peito fervendo. O riso dela, o gemido abafado, a mão dele marcando a cintura, tudo soava como deboche.

Não chorei. Não gritei. Não quebrei nada. Só apertei os punhos até a dor física tentar abafar a outra, mais funda.

Naquela noite, meu pai me olhou por um tempo mais longo. Tinha olhos de quem já sabia.

— Aprendeu, João? — Perguntou, enquanto afiava a faca na pedra.

— Aprendi, sim, senhor.

— Então escuta bem: pra gente que nasce fora do salão, tudo tem que ser conquistado com o dobro de esforço. E mesmo assim, eles vêm e tomam, só porque podem.

Eu baixei a cabeça, o olhar triste, inconformado. O barulho da faca contra a pedra cortava o silêncio feito navalha. E naquela hora, aprendi o que ninguém ensina: quando o mundo te lembra que você não pertence, o que sobra é endurecer. E olhar pra frente com o coração calejado.

Ali, naquela noite, comecei a virar um outro homem.

Dois dias depois daquela cena no açude, fui atrás dela. Não consegui segurar. O sangue ainda fervia. O gosto do desprezo queimava na garganta, e eu precisava entender, ou pelo menos jogar na cara.

Achei Silvinha perto do curral, sentada na sombra de um caminhão, enrolando fumo com uma calma que dava raiva. O cabelo preso num coque malfeito, as pernas cruzadas, o olhar sem peso.

— O que foi? — Ela perguntou antes mesmo de eu abrir a boca, sem tirar os olhos do fumo.

— Eu vi. No açude. Você e o Otávio. — Falei com a voz engasgada de tudo que vinha guardando.

Ela deu uma risada curta, seca, sem culpa.

— Ué, e daí?

— E daí? — Repeti, como se ela tivesse cuspido no meu orgulho. — Você tava comigo dois dias antes, Silvinha. No mesmo lugar.

Ela largou o fumo no colo, me encarou pela primeira vez. Sem dó. Sem desculpa.

— Olha aqui, João. Eu gostei de ficar contigo, gostei mesmo. Mas não te prometi nada, não. Tu que botou coração onde era só calor. Eu sou bicho solto, meu bem. Não sirvo pra prender nem pra ser presa.

Tentei disfarçar a dor com raiva. Cruzei os braços, firme.

— E o Otávio? Foi por causa do dinheiro, né?

Ela gargalhou. Gargalhou de verdade, como se eu tivesse contado piada.

— Dinheiro? João, se fosse por isso, eu já tava debaixo do filho do prefeito, que vive atrás de mim, ou do dono da madeireira. Foi só tesão, rapaz. Gosto do teu corpo, gosto do dele também. E se aparecer outro que eu gostar, vou pegar do mesmo jeito. Não tenho dono. Não sou dessas que fica esperando carta de amor no travesseiro.

Silêncio. Frio e cruel.

Ela voltou a enrolar o fumo, como se a conversa tivesse acabado. Mas antes que eu me virasse pra ir embora, ela falou de novo, sem olhar pra mim:

— Se tu quer uma mulher só tua, procura na igreja. Eu sou do mato, sou do vento. Nasci pra me dividir, não pra me guardar.

Saí dali com um gosto amargo na boca. Não era só o que ela disse, era o jeito. A liberdade dela me feriu mais do que a traição. Porque eu vi, ali, que o mundo não ia me tratar com delicadeza. Nem as mulheres. Nem os amigos. Nem a vida.

Foi quando comecei a entender: beleza atrai, mas não segura ninguém. Sentimento, sem espaço pra crescer, vira peso. E querer demais, ali naquele lugar, é o primeiro passo pra perder.

Acordei com o peito apertado na manhã seguinte. Ainda sentia a voz dela martelando na minha cabeça: “Nasci pra me dividir, não pra me guardar”. Passei a noite remoendo tudo aquilo. A imagem dela com Otávio no açude voltava toda hora, queimando por dentro.

Fui pro curral com a cabeça quente e o corpo cansado. Não queria olhar na cara dela. Muito menos trocar palavra. Mas Silvinha … Silvinha era um incêndio que não respeitava cerca.

Ela chegou como se nada tivesse acontecido. Um vestido velho grudado no corpo molhado de sereno, o cabelo solto, o sorriso largado. Parecia até que tinha prazer em me provocar.

— Tá bravinho ainda? — Sussurrou no meu ouvido, enquanto eu prendia uma das vacas no tronco.

Fingi que não ouvi. Continuei na minha, concentrado no que tinha que fazer. Mas ela se aproximou mais. Senti o calor do seu corpo colado no meu.

— Sei que tá com raiva, João … deixa eu te compensar.

Respirei fundo. Fechei os olhos. Meu corpo já tava respondendo sem eu querer. Era raiva, era desejo, era tudo misturado.

— Para com isso, Silvinha. — Murmurei, tentando manter a compostura. — Ontem tu ...

— Ontem eu fui eu, ué. — Ela enfiou a mão por baixo da minha camisa, subindo devagar. — E hoje também sou. Tu pode fingir o que quiser, mas teu corpo não mente pra mim.

Tentei resistir. Juro por tudo que tentei. Mas bastou ela me puxar pela mão, me arrastar pelos fundos do curral, até um monte de capim seco escondido entre as tábuas, que meu juízo desandou.

Ali, entre os cheiros do mato e do gado, ela me tomou de novo. Como da primeira vez, mas com mais fúria, mais fome, como se ela quisesse marcar território mesmo dizendo que não tinha dono. A pele dela era fogo, e meu corpo virou lenha.

Ela abriu meu zíper e puxou o pau para fora. Nada de me chupar, apenas o vestido levantado, calcinha de lado e pau pra dentro. Estoquei firme naquela buceta vadia, querendo mais do que dar prazer, deixar marcada.

Ela se desvencilhou de mim, virou de costas, apoiou na cerca do curral e empinou a bunda.

— Mete esse pauzão bem fundo.

Eu apenas obedeci, cravando a pica com força, num movimento único, profundo e comecei a bombar.

A safada gemia, me provocava, e alimentava meu ego.

— Se serve de consolo, seu pau é o dobro do dele. E muito … muito mais grosso.

Aí que não resisti mais, tirando o pau de dentro dela e gozando em jatos grossos, fartos, nas costas e na bunda.

Quando tudo passou, ficamos ofegantes por um tempo, cada um ajeitando a roupa em silêncio. E foi aí que ela soltou, com aquele mesmo sorriso debochado de sempre:

— Assim que é bom. Deu vontade, a gente faz. Nada de grude, viu? Vai se acostumando.

Fiquei ali parado, suando frio, sem saber se ria, chorava ou chutava uma cerca. Eu não queria me apegar. Mas já tava ferrado. Não era amor o que eu sentia, era orgulho ferido, ego rasgado … e uma vontade doida de ser mais do que só um corpo.

Só que ali, naquele momento, entendi que com ela não tinha laço, não tinha promessa. Silvinha era vento, e eu? Eu era só mais um galho balançando.

Aquele ano passou rápido. Silvinha metia comigo, com Otávio, e todos os peões solteiros da fazenda. Ela era uma força da natureza, um espírito livre, inquebrável, pronta para matar sua sede na fonte mais próxima.

Aprendi rápido a separar o sentimento da safadeza e comecei a me divertir em outras praças. Não era difícil arrumar uma transa rápida, uma putinha disponível, uma coroa mal comida.

Os filhos do patrão foram embora no ano seguinte, no fim do verão. Clara para estudar Direito em Belo Horizonte, Otávio para cursinhos, se preparando para vestibular. Ele sempre sonhou com Agronomia em Viçosa e Pedro ... foi atrás dos irmãos, acompanhando o pai que começava a se meter com política e passava cada vez menos tempo na fazenda.

A fazenda ficou mais silenciosa sem eles, mas eu não reclamei. Pela primeira vez, eu podia andar pelos corredores da Santa Gertrudes sem sentir que estava ocupando espaço demais. E foi nesse silêncio que eu comecei a crescer de verdade.

Eu sou o João Carlos. Mas por muito tempo, eu era só “o filho do capataz”. Depois da partida dos herdeiros, esse rótulo começou a encolher. E eu comecei a ocupar o corpo que vinha se formando em silêncio, talhado no cabo da enxada, nos sacos de ração de cinquenta quilos carregados no ombro e nos dias de sol batendo duro nas costas.

Meus ombros ficaram largos, a pele dourada do trabalho e os olhos — que puxei da minha mãe, que Deus levou cedo — ficaram ainda mais vivos naquele rosto marcado de sol. O cabelo, sempre bagunçado, agora caía de um jeito que as meninas da cidade chamavam de “charme bruto”.

Eu já entendia muito bem o porquê dos olhares no armazém, dos bilhetinhos escondidos entre os pães da padaria, dos sorrisos alongados no portão da escola. Sem os filhos do patrão por perto, eu tinha deixado de ser sombra. Eu já era “sol” que brilhava sozinho.

As moças da cidade começaram a me notar ainda mais. E não era só por causa da beleza, era o jeito de andar, seguro. A voz baixa, pausada. O respeito que eu mostrava com as palavras e a firmeza que eu carregava no olhar. Era homem feito antes dos vinte, sem frescura nem rodeio.

Claro que isso não passou despercebido pelos pais das tais moças. Alguns me cumprimentavam de longe, outros nem isso. Mas as filhas ... essas pareciam cada vez mais dispostas a desobedecer.

E foi aí que comecei a entender o que meu pai sempre dizia: “Filho, beleza é faca de dois gumes. Serve pra abrir porta... e pra cortar o que não devia”.

Mas eu só tinha a faca. E agora, a chave tava longe demais pra abrir as portas certas.

Tudo começou com um pedido bobo: levar a dona Helena, a “patroa”, até o salão da Cidinha, na cidade.

— O motorista faltou, João. E seu pai tá ocupado com o gado no pasto novo … — Disse ela, com aquele sorriso que parecia doce, mas deixava um rastro quente demais no ar.

Não era a primeira vez que eu notava o jeito que ela me olhava. Nem o modo como alisava o pescoço quando eu passava, ou deixava a mão pousar no meu braço um segundo a mais do que o necessário. Mas sempre achei que fosse coisa da minha cabeça. Até aquele dia.

No caminho, ela falou de tudo. Do marido ausente, a falta dos filhos, a política, a solidão, as festas que não frequentava mais. Me perguntou se eu tinha namorada, se as moças da cidade ainda usavam perfume doce ou se já tinham virado “moderninhas”. Ria das próprias piadas e me olhava pelo retrovisor como quem queria mais do que resposta.

No fim da tarde, antes de descer do carro, soltou uma dessas frases que carregam veneno doce:

— Você virou um homem muito bonito, João. Ah, se eu tivesse uns vinte anos a menos …

Aquilo ficou martelando na cabeça como prego torto. No dia seguinte, ela pediu pra eu ajudar com as compras. No outro, com os vasos da varanda. Depois, me chamou pra arrumar um interruptor no quarto dela.

Fui ficando esperto. E mais calado. Meu pai percebeu antes mesmo que eu aceitasse o que tava acontecendo. Me chamou no curral, com os bois bufando e o calor subindo do chão, e falou com os olhos estreitos de quem já tinha visto esse filme antes:

— João, olha pra mim. Aquela mulher é cobra criada. E onde tem mulher entediada e homem bonito, o diabo anda de mãos dadas. Se você cruzar esse caminho, não vai sobrar nem seu nome na poeira. Entendeu?

Assenti, mudo. E jurei pra mim mesmo que ia manter distância. Só que ela ... ela parecia gostar do jogo.

E pra piorar, o patrão andava mais em Brasília do que na fazenda. Quase não vinha mais, ela ia de vez em quando, mas dizia detestar a soberba do povo de lá.

O homem tava fazendo discurso em evento, reunião com deputado, almoço com senador. Virou "excelência" de uma hora pra outra, e a casa grande foi ficando grande demais só para uma mulher como a dona Helena.

Dona Helena era o tipo de mulher que fazia até o vento parar quando passava. Tinha seus quarenta e tantos, talvez mais, mas ninguém arriscava a idade com certeza. E quem arriscava, errava para menos. Sempre elegante, mesmo no calor do sertão, usava vestidos leves que dançavam no corpo como se tivessem sido feitos só para ela. Pele clara, cuidada, cheirosa. Dava pra sentir o perfume antes dela chegar.

O cabelo era loiro, tingido, daqueles que brilham no sol, e caía nos ombros com uma naturalidade irritante. Tinha o olhar de quem já tinha visto muita coisa, mas ainda brincava com o mundo. Sabia o poder que tinha e não escondia. Os lábios carnudos, sempre com um leve sorriso no canto, pareciam prometer coisa demais pra um coração despreparado. E o corpo ... ah, o corpo dela não deixava ninguém passar ileso. Curvas firmes, andar lento, quadril que falava antes da boca.

Apesar de ser mulher do patrão, era presença viva. Onde ela entrava, as outras murchavam. E eu, que cresci vendo aquela mulher pela casa, lavada de perfume e mistério, aprendi cedo que tinha coisa no mundo que era bonita demais pra se tocar.

Mas mesmo sabendo disso, às vezes, quando ela encostava a mão no meu braço ou me olhava demoradamente por cima da taça de vinho, era difícil lembrar o que era certo e o que era perigoso.

Era só questão de tempo até o jogo deixar de ser jogo.

Era pra ser só mais uma entrega. Dona Helena pediu que eu levasse umas caixas até o quarto dela. Roupas novas que tinham chegado da capital. A casa grande estava vazia, como quase sempre desde que o patrão tinha se metido com política e os filhos tinham mudado. Silêncio de tumba, cortado só pelo rangido dos tacos sob meus passos.

Entrei no quarto com as caixas empilhadas nos braços. Ela me esperava sentada na penteadeira, de camisola fina, quase transparente, o cabelo solto caindo pelo ombro, a taça de vinho na mão e o rádio antigo tocando baixinho um modão qualquer.

— Deixa ali, João … — Ela disse, sem olhar diretamente, mas com aquele tom que fazia meu sangue esquentar nos ouvidos.

Coloquei as caixas no canto e me virei para sair, mas ela falou de novo:

— Você tem fugido de mim.

— Eu só tô respeitando, dona Helena. — Respondi, olhando pro chão.

Ela riu, divertida.

— Respeito bonito esse, mas olha como você treme quando eu chego perto …

E chegou perto demais.

A mão dela encostou no meu peito, subiu devagar pela camisa suada do campo. Aquele perfume doce, enjoado e quente, subiu pelo meu nariz como uma isca venenosa. Eu devia ter saído. Devia ter dito “não”. Mas eu fiquei. Por um segundo, fiquei.

Foi o tempo exato para o meu pai empurrar a porta com força, o rosto vermelho e o olhar cheio de fogo.

— QUE DIABOS TÁ ACONTECENDO AQUI?

Ela se afastou num salto, mas não o bastante.

— Seu Antônio! Não é o que parece, eu ...

— Pelo amor de Deus, dona Helena! — Ele cuspiu as palavras. — Se o patrão fica sabendo de um troço desse, meu João tá na vala.

Ele encarou em seguida, os olhos brilhando de decepção e medo.

— E você? Criado com vergonha na cara, ensinamento de berço e se deixando levar? Tu quer morrer cedo, João?

Eu abri a boca, mas não saiu nada. O gosto da vergonha era amargo demais.

— Se eu te pego um segundo depois, tu já tava marcado pra morrer. Tu acha que aquele homem vai deixar barato? Tu acha que a dona Helena vai te proteger? Vai nada! Vai dizer que você forçou, que você entrou no quarto dela sem ser chamado. E sabe em quem o povo vai acreditar? Nela.

Dona Helena ajeitou a camisola, o rosto ruborizado não de vergonha, mas de raiva.

— Você passou dos limites, Antônio.

— Limite? Quem passou foi a senhora. Se tiver juízo, fique longe do meu filho. E se eu souber que chamou ele de novo, eu mesmo conto pro seu marido. E você sabe como ele trata traição.

O silêncio que veio depois pesava como boi doente. Eu saí dali com o coração latejando e os olhos ardendo. Meu pai não disse mais nada. Mas naquele dia, eu entendi que o perigo mora dentro da casa grande. E que tem mulher que não ama ... só coleciona destruição.

O que eu ainda não tinha aprendido e, tanto eu como meu pai, iríamos aprender muito em breve, é que não se mexe com o ego de uma mulher entediada, carente e poderosa.

Continua …

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A história começa como? Com aquela surra de verdades que todos fingem não ver.

Ansioso pela continuação

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