A sala estava em silêncio, exceto pelo som do ar-condicionado e o estalar do gelo no copo de uísque que ele segurava. Felipe encarava Mariana como se visse uma mulher que não conhecia. Mas ele conhecia. Conhecia cada curva, cada gesto, cada riso e suspiro dela. Só não conhecia — ou talvez não aceitasse conhecer — aquele lado dela que se revelava com naturalidade: o lado que ria e se expunha com os amigos como se não houvesse fronteiras. Como se tudo fosse brincadeira.
— Você entende o que tá me dizendo? — ele perguntou, com a voz firme, mas baixa. Quase um sussurro carregado de tensão. — Que meter a mão no pau do Léo na piscina foi... uma “brincadeira”?
Ela se recostou no sofá, cruzando as pernas nuas devagar. Estavam em casa, sozinhos, depois de um jantar com os tais amigos. Mariana usava apenas uma camiseta comprida, sem calcinha, e isso não era coincidência. Ela sabia do efeito que causava. E usava isso como escudo. Ou como arma.
— Claro que foi. — Ela deu de ombros, como se falasse de uma partida de cartas. — A gente sempre teve essa intimidade. Crescemos juntos. E você já viu como é o Léo, ele vive de pau duro dentro da piscina. Eu só dei uma zoada.
— Zoada? Você masturbou o cara, Mariana.
Ela deu uma risada seca.
— Não, Felipe. Eu encostei. Ele que se aproveitou. E foi rápido. Você tava do lado.
— Eu vi. Eu vi tua mão dentro da sunga dele. E vi o sorriso dos outros dois. O Dani rindo e a Carol batendo palma. Aquilo não foi só “zoeira”. Você sabia o que tava fazendo.
Ela se inclinou, agora séria.
— Eu sabia, sim. E continuo achando que não foi traição. Foi liberdade. Você precisa parar de achar que o que não é contigo é automaticamente contra você.
Felipe bebeu mais um gole e bateu o copo na mesa. Os olhos dele ardiam. Parte raiva, parte tesão — um nó confuso que crescia no estômago.
— Então deixa eu entender... Você acha normal também deixar o Dani meter o dedo em você naquele jogo de verdade ou desafio?
Mariana ergueu as sobrancelhas.
— Aquilo foi um dedo. No meio da rodada. Diante de todo mundo. Em mim, por cima da calcinha. Era parte da brincadeira. E, sim, foi gostoso. Mas não teve nada de romântico ou sentimental ali. É só corpo, Felipe.
Ele riu sem humor.
— Você fala como se tivesse dado um gole numa cerveja. Mas tu gemeu. Eu lembro. Você gemeu e olhou pra ele de um jeito...
— Eu olhei pra você depois. — ela interrompeu — Porque eu queria ver sua reação. E sabe o que eu vi? Você de pau duro.
Silêncio.
Ele desviou o olhar, apertando os dedos contra os joelhos. Tinha ficado excitado, sim. Não dava pra negar. A imagem da esposa sendo tocada por outro homem ali, no meio dos amigos, tinha mexido com ele de formas confusas. Tinha tesão ali, sim. Mas também raiva. Ciúmes. Um medo estranho de perder o controle do que era "dele".
— E o boquete no carro? — ele perguntou de repente, mirando ela com dureza. — Vai dizer que foi outra “brincadeira” também?
Ela não desviou o olhar.
— Foi. A gente tava bêbado. Eu, Léo e Dani no banco de trás. A Carol dormindo no banco da frente. Léo tirou a pica pra fora, Dani começou a provocar... e eu fui na onda. Chupei, sim. Não terminei. Mas chupei. E isso não muda o que sinto por você.
Felipe se levantou, andou até a janela. Precisava de ar. O corpo vibrava. Queria gritar. Queria trepar. Queria entender.
— Você quer que eu aceite isso como parte de quem você é? — ele perguntou de costas.
— Eu quero que você aceite que meu corpo é meu. E que o desejo não é traição se não fere o amor que a gente construiu. Eu não estou me apaixonando por eles. Eu gozo, eu rio, eu me excito... Mas eu volto pra casa. Eu escolho você. Sempre.
Ele se virou. Os olhos dele estavam vermelhos.
— E se fosse o contrário? Se eu botasse o pau na boca da Carol? Se eu enfiar o dedo na buceta da Gabi numa rodada dessas?
Ela hesitou. Por um segundo. Mas depois respondeu:
— Eu teria ciúmes. Mas não te chamaria de traidor se fosse de verdade uma brincadeira. Eu saberia ver a diferença.
Ele se aproximou. Ficou diante dela, encarando-a. A camiseta subia nas coxas, revelando que ela estava molhada. Ele notou. E ela também.
— Você tá excitada falando disso? — ele perguntou.
— Eu tô excitada por estar sendo verdadeira com você. E por você estar me ouvindo, mesmo puto.
Ele baixou a cabeça, respirando fundo. Estava em conflito, sim. Mas também fascinado. Mariana não era uma mulher comum. E parte dele sabia disso desde o início.
— E se eu quisesse assistir? — ele murmurou. — Se, da próxima vez, eu quisesse estar lá... e ver.
Ela sorriu, mordeu o lábio inferior.
— Então a gente abre esse novo capítulo. Juntos.
Felipe estendeu a mão. Ela pegou.
A tensão não sumiu. Mas se transformou. Num novo desejo. Numa nova fronteira a ser explorada.