O internato - Capítulo 9

Um conto erótico de Bernardo, Daniel e Theo
Categoria: Gay
Contém 2241 palavras
Data: 27/05/2025 19:22:05
Assuntos: Gay, Amor

Capítulo 9 – A Verdade em Voz Alta

Bernardo

Pela janela do quarto, vi o Land Rover preto do meu pai passando pelo portão da escola. Tá na hora, pensei, com o coração disparado.

— Ele chegou — disse a Théo e Giovana, que não tinham saído de perto de mim desde que saí da sala do diretor. — Agora seja o que Deus quiser.

— Saiba que estamos aqui pra qualquer coisa — Giovana disse, colocando a mão no meu ombro.

— Isso mesmo — Théo concordou. — Se precisar de qualquer coisa, a gente te ajuda.

Dei um sorriso pra ambos e os abracei apertado. Peguei minha mochila e desci com Giovana, que se despediu de mim com um beijo na bochecha antes de ir para o dormitório feminino. Théo e Giovana queriam vir comigo, mas eu disse que não precisava. Isso era algo que eu precisava enfrentar sozinho.

Olhei para meu pai, que vestia o terno preto que usava no trabalho. Ele estava encostado no carro, braços cruzados, me esperando com uma expressão de poucos amigos. Respirei fundo e caminhei até ele, cada passo parecia durar uma eternidade.

— Entra no carro — a voz autoritária do meu pai me fez estremecer. Por um momento, quase desisti de contar pra ele. Mas era necessário.

— A gente precisa conversar — disse, com a voz quase sumindo.

— Já disse pra entrar no carro! — ordenou, com o tom de quem executa uma sentença.

Entrei pelo lado do carona e, para meu alívio, ele fez o mesmo pelo lado do motorista. Joguei minha mochila no banco de trás e olhei para meu pai, que encarava o prédio principal da escola, visivelmente frustrado.

— Me desculpa, pai — pedi com a voz fanhosa.

— Teu bisavô estudou aqui, assim como o irmão dele, teu avô, tuas tias-avós, eu e teus tios — começou, falando baixo, mas firme. — Nenhum de nós jamais foi suspenso. Sempre fomos alunos exemplares, nos formamos com honra. Teu primo Gregório foi o aluno do ano quando se formou há dois anos! Teu tio se vangloriou disso pra família inteira! E agora o meu filho é suspenso com uma semana de aula! — Ele olhou pra mim e pude ver o quanto eu o havia desapontado. — Que explicação tu tem pra isso?

— Não foi minha culpa — disse, olhando para o chão do carro, tentando esconder as lágrimas que queriam escapar. — Eu tava quieto no pátio quando essa guria, a Amanda, veio até mim e começou a me bater.

— Teu diretor me disse que tu ia partir pra cima dela no momento em que ele apareceu — meu pai alegou.

— Meu nariz tava sangrando, pai... eu fiquei com raiva — tentei me explicar.

— Então tu partiu pra cima dela? — ele parecia incrédulo. — Tu tem noção do que fez? Um homem nunca deve levantar a mão pra uma mulher, Bernardo! E tu ser gay não muda o fato de ser homem!

Olhei assustado pra ele. Desde quando ele sabia?

— Como o senhor sabe? — perguntei, sentindo meu corpo inteiro tremer.

— Ano passado peguei teu iPad achando que era o meu. Quando abri o Safari, ele foi direto pra um site pornô — contou, com naturalidade.

— E o senhor não ficou desapontado? — perguntei, quase sem voz.

— Com isso, não. Mas com o fato de tu ter sido suspenso? Tô muito chateado!

Não aguentei e desabei naquele momento. As lágrimas começaram a escorrer enquanto eu percebia que devia ter confiado no meu pai desde o começo. Apesar do jeito durão, ele me amava. Não se importava se eu era gay ou hétero. O que ele queria era que eu fosse alguém decente e bem-sucedido.

O abracei, o que o pegou de surpresa, mas depois do susto ele retribuiu, me envolvendo com firmeza.

— Eu te amo, pai — falei, sem pensar duas vezes. — Eu tive tanto medo do senhor me bater, me colocar de castigo, ou até me expulsar de casa...

— Eu nunca faria isso — disse com a voz mais branda. — Tu é meu filho e eu te amo de qualquer jeito. Não vou negar que levei um susto quando descobri, mas, no fundo, eu já esperava. Eu posso não falar muito, mas te amo mais do que tudo, guri.

— Obrigado, pai — disse, sentindo como se tirassem um fardo do tamanho do mundo das minhas costas. De repente, todo aquele medo parecia uma bobagem criada pela minha cabeça. Nunca corri risco real de agressão, ou de ser expulso.

— De nada — ele respondeu com um meio sorriso, mas logo retomou a expressão dura. — Mas tá de castigo por ter sido suspenso.

Daniel

– Falou com ele, Théo? – indaguei no momento exato em que ele abriu a porta do seu quarto.

– Não consegui – Théo abriu caminho para que eu entrasse no quarto, onde o Nick estava deitado na cama com o celular na mão. Acenei para o namorado do meu irmão, que retribuiu o gesto. – A Giovana tava aqui, e ele tava preocupado porque o pai dele foi chamado pelo diretor, e ele tinha que se assumir antes que o Cornélio o tirasse do armário.

– E o pai dele já chegou? – indaguei, sentindo um misto de preocupação e culpa, pois se eu não tivesse mentido para a Amanda, nada disso teria acontecido.

– Chegou – meu irmão respondeu, pegando uma latinha de Coca no frigobar e sentando-se ao lado do Nick. – Mas sabe o que eu não entendo? Ele faz tanta questão de se assumir pra todo mundo, diz que não quer esconder nada... Mas nunca te assumiria pra família. – Théo abriu a lata de Coca e tomou um gole. – O Bernardo é meu amigo, mas vou te dizer, é meio hipócrita da parte dele.

– Tu não sabe pelo que ele passa em casa – tentei defendê-lo, mas, vou te dizer, o Théo tinha um pouco de razão.

– Me desculpa, mano, mas meus pais nunca me deram atenção e me criticavam por tudo – Théo começou, com aquele jeito sincero que sempre teve. – Meu pai me batia pra “corrigir”. Minha mãe fingia – e ainda finge – que não vê e nem sabe de nada. Implorei pelo amor dos dois, mas nunca recebi mais que migalhas ou uma encenação pública de carinho da mãe! – Os olhos dele começaram a lacrimejar, e a voz falhou. – E mesmo sabendo que seria excomungado, eu criei coragem e contei que sou gay.

– Tá tudo bem, Théo – Nick envolveu meu irmão nos braços, tentando acalmá-lo, mas ele já tava entregue ao próprio desabafo.

– Fui agredido pelo meu pai e fui parar no hospital. E o que aconteceu? A mãe mentiu pro médico, dizendo que eu fui espancado na rua por causa do meu jeito. Fizemos até um boletim de ocorrência falso pra acobertar o homem que me bateu. Mas em nenhum momento isso me fez me arrepender de ter contado. Sabe por quê? – Ele respirou fundo. – Porque eu não queria viver mentindo. Queria poder andar de mãos dadas com meu namorado, beijar ele na rua sem medo de que alguém visse e fosse contar pros meus pais. Queria ser livre. E apesar de toda dor e sofrimento, hoje posso levar meu namorado em casa sem medo de apanhar ou de ser chutado pra fora.

– Eu sinto muito, Théo – disse, me sentindo mal por dentro com tudo aquilo.

– O Bernardo me falou da família dele – continuou Théo. – Pai juiz, mãe jornalista. Sempre teve tudo o que quis, inclusive o amor dos dois. O pai pode ser exigente, sim, mas ama ele. Ama de um jeito que o nosso pai nunca vai me amar. Não tô dizendo que é fácil se assumir, mas ele não vai passar nem metade do que eu passei. A real é que o Bernardo é covarde.

– Te acalma, Théo – Nick deitou a cabeça do meu irmão em seu ombro.

– Me desculpa – pedi, olhando para um Théo que eu não via há muito tempo. Um Théo fragilizado, carente de afeto. – Não quis comparar.

– Eu sei que não – Théo se afastou do Nick e enxugou os olhos. – Nem eu, mas essa situação me lembrou de mim.

Ele se levantou da cama e caminhou até o banheiro, mas eu me antecipei, me postei diante dele e o abracei apertado. Foi aí que ele desmoronou, como um castelo de areia levado pelo vento minuano.

– Por mais que nosso pai e nossa mãe não reconheçam o filho incrível que têm, saiba que ao menos é amado por mim e pela Fernanda – disse mais uma vez. – E a gente nunca vai te deixar sozinho.

– Eu sei que não – Théo choramingou. – Só me promete uma coisa.

– Qualquer coisa.

– Desiste do Bernardo – as palavras dele me atingiram como uma rasteira. – Ele não te merece, Daniel.

Eu não sabia o que dizer. Prometeria qualquer coisa pro Théo, mas aquilo tava além dos meus limites. Eu amava demais o Théo pra ver ele sofrer, mas também não conseguia conceber desistir de quem me fez enxergar quem eu era. Como eu abriria mão de alguém que atravessou minhas defesas e viu meu verdadeiro eu? De quem me libertou da mentira que eu vivia?

– Eu prometo – menti.– Eu prometo – menti.

Bernardo

– Vai pro teu quarto e só sai de lá quando a janta estiver pronta – disse minha mãe depois de me abraçar, me beijar e dizer que estava morrendo de saudades.

– Na verdade, Cristina – meu pai falou, colocando sua bolsa em cima do sofá – o Bernardo tem algo pra te contar.

Minha mãe me olhou curiosa, depois olhou pro meu pai. No carro, logo depois dele voltar da conversa com o diretor Cornélio, perguntei se ele já tinha contado pra minha mãe.

– Não – ele respondeu – Acho que isso tu mesmo tem que dizer. Ela desconfia, porque eu já sondei ela sobre o assunto, mas nunca cheguei a abrir o jogo.

Agradeci por isso. Realmente, era algo que eu precisava dizer com as minhas próprias palavras. Saber de algo assim pela boca dos outros seria muito mais difícil.

– Seja lá o que for, pode esperar até a hora da janta. Ele tá de castigo – minha mãe insistiu.

– Tu sabe que normalmente eu não me meto quando tu dá uma ordem, mas dessa vez é coisa séria – meu pai retrucou com firmeza.

– Senta, mãe – pedi quando ela me olhou, agora preocupada.

– Pelo amor de Deus, não me diga que foi expulso – ela implorou.

– Eu nem sei por onde começar – disse, me sentando. Pensei em contar de uma vez, sem rodeios, mas podia ser demais. – A senhora sabe que eu sempre fui meio diferente quando era piá – comecei a tamborilar os dedos na perna – Nunca curti brincar com os guris e sempre fui muito manhoso. Lembra da festa de aniversário da vovó?

– E como! Tu cantando, meu filho? – ela respondeu com um sorriso – Só não lembro a música...

– I Will Survive, meu pai disse, rindo com a lembrança.

– Isso! – minha mãe completou – Foi hilário! Tu colocou aquelas plumas cor-de-rosa em volta do pescoço e uns óculos dourados, subiu no palco e começou a cantar e dançar. Tu tinha uns nove anos.

– E lembra como o tio Jorge brigou comigo, dizendo que guri não dançava daquele jeito?

– Lembro – disse, e o sorriso desapareceu – Brigamos feio aquele dia, porque ele te fez chorar.

– Ele machucou meu braço quando me puxou do palco – completei. – E lembra daquela guria da escola que gostava de mim?

– Como esquecer da Bianca? – ela disse com um tom nostálgico – Vocês dançaram juntos na festa junina da escola, e depois disso a mãe dela vivia dizendo que ela tava encantada contigo.

– E lembra que eu dizia que achava ela nojenta? – perguntei.

Foi ali que ela começou a perceber pra onde eu queria chegar.

– Lembro – disse, agora sem o mesmo tom nostálgico.

– E lembra de como eu vivia atrás do meu primo Gregório quando ele e o tio Jorge vinham aqui? Que eu dizia que queria ser bonito como ele, que ele era demais?

– Lembro – respondeu, mais séria.

– Lembra que o Gregório me ligava todas as noites depois que o tio Jorge me levou pra Nova York, dois anos atrás?

– Sim.

– Isso tudo não te diz nada?

Minha mãe me olhou por um instante, ponderando se devia admitir ou esperar que eu falasse.

– Não – optou por esperar.

– Eu sou gay – dizer isso em voz alta, dentro de casa, com os dois me ouvindo, foi estranho. Criou um silêncio desconfortável. Não era como dizer no espelho, nem como contar pros amigos. Era diferente. Libertador.

– Eu sei – minha mãe disse depois de dez segundos de silêncio absoluto – Eu sempre soube, mas não queria acreditar.

Ela se levantou do sofá, foi até o bar, serviu-se de conhaque e deu um gole longo, como fazia sempre que estava nervosa. “Champanha é bebida de comemoração. Uísque ou conhaque é pra lamentar. E minha cara Mirian, eu tenho muito o que lamentar”, tinha dito uma vez pra empregada que lhe perguntou por que estava bebendo tanto.

Meu pai se aproximou, colocou a mão no meu ombro como um sinal de apoio. Pra mim, aquilo já era um baita gesto.

– A senhora ainda me ama? – perguntei, sem saber se queria mesmo ouvir a resposta.

Ela me olhou como se eu tivesse dito a maior bobagem do mundo.

– E por que eu deixaria de te amar? – ela largou o copo no bar e caminhou até mim – Tu é meu filho. E eu te amaria até se tu fosse azul com bolinhas amarelas.

Me levantei e a abracei. Ela me apertou com força, sem hesitar.

– Eu te amo, mãe – falei chorando feito criança.

– Também te amo, meu bebê – ela também chorava – Nada vai mudar entre nós. Eu ainda te amo. Incondicionalmente.

Continua...

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Comentários

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Uau, que lindo!! Tomara que as coisas sejam felizes pro Dani e pro Théo tbm. Adorei o capítulo. Ansioso pelos próximos. 😍✨

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Que lindos! Pena que nem todos tem essa sorte como Theo e Daniel. Esperando o próximo capítulo.

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Lindo a aceitação familiar. Ainda torço para que Daniel e Bernardo fiquem juntos.

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