Um Medo Consumidor

Da série Putinho Vermelho
Um conto erótico de Tiago Campos
Categoria: Homossexual
Contém 1296 palavras
Data: 21/05/2025 10:28:30

Depois daquele banho tumultuado, que pareceu lavar não somente a sujeira do corpo, mas também um pouco do peso da alma, vesti roupas quentinhas, buscando refúgio no conforto mais básico. Uma blusa de lã azul-marinho que minha querida avó havia tricotado com um ponto firme e amoroso, com a marca inconfundível das suas mãos habilidosas, me envolveu como um abraço. O cheiro familiar do seu perfume misturado ao aroma da lã me trouxe uma onda de segurança, e senti o conforto familiar me envolver por completo.

Saindo do quarto, fui guiado por uma fragrância divina que invadia cada canto da casa, dissipando qualquer sombra de melancolia. O cheiro de café fresco, com seu amargor reconfortante, misturado ao doce cítrico e inconfundível do bolo de laranja recém-saído do forno, pairava no ar, anunciando o aconchego sagrado da nossa cozinha. A cozinha, sempre o coração da casa, estava iluminada pela luz suave da lâmpada e o calor emanava do fogão desligado, um resquício do carinho que ela havia colocado ali.

Ela, Dona Adelaide, com seu avental de flores desbotadas e um sorriso que aquecia a alma, havia preparado um café delicioso, do jeitinho que eu gostava, forte e aromático, perfumando ainda mais o ambiente. E a mesa estava posta com tesouros: acompanhando o bolo fofinho e úmido, esperando para derreter na boca, estavam aqueles biscoitos de banana caseiros, crocantes por fora e macios por dentro, polvilhados com açúcar e canela, que eram a minha perdição desde a infância, evocando lembranças de tardes ensolaradas e risadas infantis.

Sentei-me à mesa de madeira desgastada, o lugar onde tantas histórias já haviam sido contadas e lágrimas secadas, e fechei os olhos por um instante, inalando profundamente o aroma reconfortante que prometia paz e pertencimento genuíno. Peguei um pedaço generoso do bolo de laranja, a casquinha levemente crocante e o interior macio e úmido, e o levei à boca. Os sabores explodiram na minha língua — a doçura equilibrada com o toque cítrico, a maciez da massa, uma sinfonia perfeita de conforto e memória afetiva.

Um suspiro profundo de pura satisfação escapou dos meus lábios. “Ah, vovó!”, comecei, com a voz embargada pela emoção genuína que me pegou de surpresa, misturada ao prazer da primeira garfada. “Isso… isso está simplesmente maravilhoso como sempre. Sinceramente, vó, ninguém neste mundo cozinha com a alma e o carinho que a senhora coloca em cada receita! É mágico.”

Um sorriso amplo e radiante, que alcançava até os cantinhos dos seus olhos, formando ruguinhas de felicidade, iluminou seu rosto enrugado, marcando as histórias de uma vida. Ela me olhou então, e naquele olhar havia uma profundidade de amor incondicional, aceitação plena e sabedoria tranquila que me desarmou completamente, fazendo com que qualquer resquício de preocupação desaparecesse.

“Você é a minha maior alegria, meu amor”, disse ela, a voz suave como um carinho, mas cheia de uma convicção que aquecia a alma e afastava a solidão. “Minha luz. Amo você mais do que tudo nessa vida, mais do que as palavras podem expressar. Ver você feliz é o que me faz seguir em frente.”

As palavras dela, proferidas com tanta sinceridade e amor, especialmente naquele momento de vulnerabilidade que a noite anterior havia despertado em mim com toda a sua força, combinadas com a atmosfera de amor puro, o cheiro de casa e a simples beleza daquele instante, fizeram meus olhos lacrimejar incontrolavelmente. As lágrimas escorreram silenciosamente e quentes pelo meu rosto enquanto eu me levantava abruptamente, incapaz de conter o ímpeto da emoção, e a abraçava novamente, um abraço apertado, demorado, cheio de gratidão pela sua existência, medo de um futuro sem ela, e um amor imenso que parecia transbordar.

Ela sentiu meu pranto silencioso e, afastando-me um pouco com a gentileza que só ela possuía, segurou meu rosto entre as mãos, suas palmas quentes e macias, com a pele fina e marcada pelo tempo, contra a minha pele úmida. “Por que essa sensibilidade toda hoje, meu amor?”, perguntou, a voz carregada de uma preocupação genuína que nunca falhava em me alcançar. “O que te aflige tanto assim, que te faz chorar? Compartilhe comigo, querido. Sua avó está aqui para ouvir.”

Naquele olhar e naquele toque, eu não consegui mentir novamente. A resistência que havia construído desmoronou diante da sua presença acolhedora. “Tenho medo, vozinha”, confessei, a voz embargada pelo choro que agora era mais audível. “Um medo que me consome às vezes, especialmente quando penso no futuro. Medo de te perder um dia… medo de ficar completamente sozinho neste mundo, sem a sua luz, sem o seu aconchego, sem o seu cheiro e o seu abraço.”

Ela sorriu novamente, um sorriso que era metade carinhoso, metade brincalhão, tentando dissipar um pouco da minha angústia com sua leveza habitual, mas com os olhos cheios de uma compreensão profunda. “Ah, tolinho”, disse, dando um leve aperto nas minhas bochechas, um gesto tão familiar. “Eu vou viver até uns cento e vinte anos, talvez cento e trinta, só para te atazanar mais um pouco, comer todos os seus biscoitos de banana e garantir que você aprenda a cozinhar direito para não morrer de fome!” Ela me puxou para mais perto, seu abraço era um escudo contra o mundo lá fora, um porto seguro. “Não se preocupe tanto, meu neto. Estarei aqui. Sempre estarei aqui, em algum lugar, velando por você. Você não está e nunca estará sozinho de verdade.”

Suas palavras eram um bálsamo para a minha alma aflita, um conforto que parecia preencher o vazio do medo, me ancorando no presente. Mas, mesmo aninhado em seus braços, sentindo o calor do seu corpo frágil e o bater do seu coração, a doce ilusão da eternidade cedeu lugar à verdade fria e inevitável da mortalidade que pairava no ar. Essa verdade era um lembrete silencioso e pungente da preciosidade daquele instante, da urgência de vivê-lo plenamente, de absorver cada segundo da sua presença, do seu amor, antes que o tempo, implacável, levasse embora o meu porto seguro.

Deitado na minha cama, o peso das cobertas confortáveis parecia somente acentuar o frio cortante da reflexão que me assaltava naquele silêncio noturno. Era um frio que vinha de dentro, um gelo da incerteza e do medo que eu carregava como um fardo invisível. Estava esgotado, completamente exausto de viver encolhido, com aquela constante e corrosiva apreensão me corroendo por dentro, minando cada vestígio de espontaneidade e alegria. Eu me sentia como uma vela que tremia a cada sopro de vento, prestes a se apagar.

Minha avozinha… ah, minha avozinha mais do que um porto seguro; ela era a própria âncora da minha existência, o alicerce sobre o qual minha frágil identidade se apoiava. Era o meu tudo, a fonte inesgotável de amor e proteção que me envolvia como um manto protetor. Mas a realidade, implacável e fria como o aço, martelava insistentemente em minha mente: um dia, inevitavelmente, ela não estaria mais aqui. Não haveria mais seu abraço para dissipar meus medos, sua voz calma para acalmar minhas tempestades internas. A segurança que ela me proporcionava era emprestada, e eu precisava urgentemente encontrar uma força, uma resiliência, um tipo de coragem que eu sentia que ainda não possuía, que talvez estivesse enterrada sob camadas de timidez e temor.

E, enquanto a noite se adensava, meus pensamentos voltaram-se, quase magneticamente, para aquela imagem proibida de Johnny. Não era somente uma imagem; era uma faísca, uma promessa silenciosa de algo diferente, algo eletrizante, que ele havia acendido nas profundezas mais secretas do meu ser. Aquela visão, aquela possibilidade, me impulsionou a uma conclusão inevitável e aterradora: eu precisava confrontar algo muito mais profundo e dissimulado do que meus medos cotidianos. Precisava encarar a minha própria natureza, os desejos que eu mantinha escondidos sob camadas espessas de conformidade social e uma hipocrisia que me sufocava.

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