Romeu e Julius - Amor em Framon - 01x04 - ADEUS FRAMON

Um conto erótico de Escritor Sincero
Categoria: Homossexual
Contém 5115 palavras
Data: 27/01/2015 21:57:49
Última revisão: 09/05/2025 03:57:08

O sol mal havia rompido as nuvens densas daquela manhã de outono quando os primeiros cavaleiros atravessaram os portões do castelo. Em seus rostos, o cansaço misturava-se à frustração. Nenhuma boa nova viria daquela patrulha. O Reino de Framon, ainda atordoado pelos dois ataques consecutivos de Cen, afundava num estado de inquietação coletiva. Os súditos exigiam respostas, exigiam ação. Mas as investigações da guarda real levavam sempre ao mesmo lugar: o vazio.

Na sala do trono, o Rei Nilo ouviu em silêncio o relatório do primeiro comandante. Nem sinal de Cen. Nem rastros de seus monstros. Nem uma pegada fora do comum nas bordas da floresta escura. Parecia que o inimigo havia se dissolvido no ar, deixando para trás apenas medo e incerteza. Apesar de manter a compostura, as mãos do rei tremiam sob o manto de ouro. Um novo embate com o feiticeiro seria insustentável. Framon não suportaria mais uma ferida.

Como se o peso da coroa já não fosse o bastante, o príncipe Mitty surgiu diante do pai, atravessando o salão com passos despreocupados.

— Pai, eu gostaria de um pedido... Gostaria de participar do Baile da Primavera em Alfrea — Disse, com um sorriso tímido. — No Reino dos Vinhos.

O silêncio foi imediato. Nilo levantou-se devagar do trono, os olhos estreitos como lâminas.

— Festa? — Repetiu, a voz carregada de incredulidade. — O nosso reino atravessa uma provação sem precedentes, e você quer ir a uma festa?

Antes que Mitty pudesse se justificar, a mão do rei cruzou o ar com um estalo seco, atingindo o rosto do príncipe.

— Pai... — Balbuciou Mitty, levando a mão à face. Era a primeira vez que sentia o peso da mão do pai, não como rei, mas como homem.

— Eu não sei o que fiz para ter um filho tão inconsequente. Para o seu quarto. Agora. — A ordem veio fria, sem espaço para contestação.

Quando Mitty deixou o salão em silêncio, o rei permaneceu imóvel, encarando o chão. Sua alma estava dividida entre a dor de pai e a responsabilidade de líder. O trono de Framon tornava-se cada dia mais solitário, mais gelado. A sombra de Cen era uma neblina espessa sobre seus pensamentos, e Nilo precisava agir antes que o pânico tomasse tudo.

A poucos quilômetros dali, na nobre mansão dos Mazzaro, os criados se agitavam pelos corredores, guiados por ordens urgentes e listas intermináveis. Lady Melody, apesar da tensão dos últimos dias, estava decidida a manter o tradicional Baile de Primavera. O reino precisava de alguma ilusão de normalidade. Enquanto decidia entre lavandas e azaleias para os arranjos centrais, sua mente voou até uma conversa recente com o marido.

— Ele não pode estar de volta. — Sussurrou ela, mordendo os lábios. As lágrimas já começavam a cair.

— Vamos precisar de você — Respondeu Celdo com firmeza, acariciando o rosto da esposa. — Melody, dessa vez eu não sou um garoto assustado. Eu sou um guerreiro. E vou te proteger.

— Isso que me assusta, Celdo. — Respondeu ela, se lançando em seus braços. — O resultado desse embate pode ser doloroso demais.

Um estalo repentino quebrou o momento. Um vaso se espatifou no chão, arrancando Melody de seus devaneios. Transtornada, pediu licença aos criados e subiu até o quarto principal. Trancou a porta com firmeza e seguiu até o guarda-roupa.

Entre vestidos, mantos e joias antigas, havia uma caixa de madeira escura, com uma tranca encantada. Com as mãos trêmulas, Melody abriu o compartimento e retirou uma esfera de cristal reluzente. Espalhou uma toalha vermelha sobre a mesa do centro e posicionou a bola com reverência. Depois, fechou as cortinas, mergulhando o quarto na penumbra.

Sentou-se. Respirou fundo. Esticou as mãos sobre a esfera. Pequenas partículas verdes começaram a surgir, flutuando ao redor como poeira encantada.

— Por favor... diga-me... o que o feiticeiro das trevas deseja? — Murmurou.

A esfera brilhou, e uma voz profunda, dissonante, ecoou do interior do cristal.

— Vingança.

— Contra quem? — Melody engoliu em seco.

— Framon. O Reino. — Respondeu a voz. O coração de Melody apertou.

— Diga-me o motivo. O que aconteceu com Cen?

— Dor. Desespero. Sofrimento.

— Existe uma maneira de pará-lo? — As mãos de Melody tremiam agora.

A resposta veio como um decreto:

— Não. A vingança acontecerá. De um jeito... ou de outro.

Às vezes, as respostas que se desejam não são aquelas que se precisam

Às vezes, as respostas que se desejam não são aquelas que se precisam. A bola de cristal brilhou com intensidade incomum, e Lady Melody teve uma visão. As imagens invadiram sua mente com força: ela se viu mais jovem, ainda uma feiticeira branca em formação, no auge de um dos momentos mais difíceis de sua vida — o último embate contra Cen.

Ao lado de Celdo e do então príncipe Nilo, Melody havia lutado bravamente pela libertação de Framon. A batalha foi sangrenta. Incontáveis vidas inocentes se perderam, mas juntos conseguiram deter, ainda que temporariamente, as atrocidades de Cen.

***

FRAMON — ANOS ATRÁS

— Eu vou acabar com a sua felicidade! — Bradou Cen, lançando uma bola de fogo na direção de Melody.

— Céus... — Murmurou ela, erguendo um escudo de luz a tempo de se proteger. — Qual o motivo para tanto rancor?

— Pergunte ao seu amado. — Respondeu Cen, retirando o capuz e revelando o rosto pálido e tomado de ódio. — Ele é o motivo de tudo isso.

— Não... isso tem que acabar. Cen, eu não queria chegar a esse ponto, mas você não me deixou escolha.

Em momentos de desespero, decisões extremas se impõem. De sua bolsa, Melody retirou uma caixa mágica: a Exclusion. Um artefato poderoso, capaz de conter o mal e selar os poderes de feiticeiros sombrios. No mesmo instante, Celdo surgiu, travando uma luta feroz contra Cen.

— Você acabou comigo, Celdo. — Rosnou o feiticeiro, antes de lançar uma magia que levou Celdo aos joelhos.

— Você foi quem cultivou toda essa escuridão. Eu não sou o culpado. — Respondeu Celdo, levantando-se com esforço e ferindo Cen com sua espada.

— Maldito!!! — Urrou Cen, agarrando Celdo pelo pescoço e o erguendo com brutalidade. — Eu posso até perder a guerra, mas vou levar você comigo!

— Não! Eu não vou permitir isso! — Declarou Melody, abrindo a caixa e entoando palavras antigas na língua das ninfas. — Exclusion, o espírito do feiticeiro Cen precisa pagar por todas as almas ceifadas. Faça sua justiça. Leve-o!

A caixa levitou e se abriu sozinha. Um vendaval se formou ao redor deles, puxando Cen com força crescente. O feiticeiro se debatia, tentando resistir, mas era em vão. Mesmo sendo arrastado, ele ainda segurava Celdo com firmeza.

Vendo a cena, Nilo não hesitou. De seu abrigo nos degraus da escadaria, disparou uma flecha certeira que atingiu Cen, enfraquecendo-o o suficiente para que Celdo se libertasse. Cambaleando, ele correu até Melody. Ventos ainda mais intensos começaram a levantar pedras e poeira. Nilo conseguiu se proteger sob a escadaria, enquanto Melody conjurava um encanto de proteção que os manteve a salvo.

— Malditos! Eu vou voltar! Eu prometo! Vou matar todos vocês! Eu prometo, Celdo... Seu coração vai sangrar igual ao meu! — Gritava Cen, enquanto era tragado pela força da Exclusion, até desaparecer completamente.

O silêncio que se seguiu parecia pesar mais do que os gritos. Melody, Celdo e Nilo sabiam: haviam vencido por ora. Mas a promessa de Cen ainda ecoava, sombria, como um aviso distante — e inevitável.

FRAMON - ATUALMENTE

O passado, para alguns, é uma sombra persistente. Para outros, é o futuro incerto que pesa como maldição. Na calada da noite, enquanto a mansão dormia sob o silêncio espesso da madrugada, Romeu e Julius encontravam refúgio no velho celeiro da família. O cheiro de feno, a madeira rangendo sob os pés, tudo ali era cúmplice do encontro furtivo. Entre risos abafados e carícias ternas, os dois jovens partilhavam mais do que afeto — dividiam um medo silencioso e um desejo crescente de descobrir qual seria o próximo passo naquela relação que desafiava todas as regras da casa, da vila e da época.

Naquele exato instante, na penumbra do quarto principal, Celdo despertou com um arrepio. Um riso infantil, quase etéreo, ecoou nos seus ouvidos. O patriarca ergueu-se de sobressalto, os olhos arregalados buscando sentido naquela sensação inquietante. A luz trêmula de uma vela mal consumida projetava sombras dançantes pelas paredes. Não havia ninguém ali — apenas ele, a cama bagunçada e a respiração tranquila da esposa adormecida.

Por um breve momento, pensou em acordá-la, mas algo mais forte o impeliu a investigar por conta própria

Por um breve momento, pensou em acordá-la, mas algo mais forte o impeliu a investigar por conta própria. O velho instinto de soldado, talvez. Pegou a vela e atravessou o corredor escuro. Na sala, o que viu fez seu coração falhar uma batida: um vulto esgueirava-se pela porta da frente. Seu corpo gelou. A ameaça de Cen ainda pairava, e Celdo sabia que não podia subestimar ninguém — nem fantasmas, nem traidores.

Quase sem pensar, arrancou a espada decorativa do suporte empoeirado sobre a lareira e saiu para o pátio. O frio da noite cortava a pele, mas seu sangue fervia. Olhou pela janela, até notar uma leve movimentação no celeiro. Os passos tornaram-se lentos, silenciosos. Aproximou-se da porta e, com extremo cuidado, empurrou-a.

Mal entrou, dois passos apenas, e o mundo desabou.

A espada escorregou de suas mãos, tilintando no chão. Seus olhos se arregalaram, marejados num instante. À frente, como um golpe que feria mais que qualquer lâmina, Romeu e Julius estavam unidos por um beijo, íntimo e verdadeiro.

Celdo não gritou. Não naquele primeiro segundo. A fúria emergiu como um vulcão em erupção. Avançou brutalmente, separando os dois com violência. Um tapa estalou no rosto de Julius, que tombou para trás. Romeu, atônito, tentou explicar-se, mas mal teve tempo de abrir a boca antes de ser atingido por um soco. Julius, cambaleante, colocou-se na frente, tentando proteger o amado — e foi esmurrado sem piedade.

Com força, o pai arrastou os dois para dentro da casa. As mãos tremiam, os olhos brilhavam de raiva e vergonha. "Sodomia", murmurava como se o próprio mundo tivesse lhe cuspido no rosto.

Os gritos romperam o silêncio da madrugada. Os membros da família acordaram em sobressalto. Bartolomeu, Melody e Catherine desceram correndo pelas escadas, tomados por pavor. Na sala, encontraram Celdo transtornado, arrastando Julius pelo braço. O jovem chorava, aos soluços, o rosto marcado pela violência. Romeu vinha logo atrás, cabisbaixo, o olhar perdido.

— O que está acontecendo?! — Gritou Malody, correndo até o filho mais novo. Abraçou-o, apavorada ao ver os hematomas em seu rosto. — Julius, meu Deus, o que houve?

— Teu filho, Melody! — Bradou Celdo, apontando com o dedo trêmulo.

— O que tem o Julius? — Ela perguntava, confusa, sem entender a origem do surto.

— Ele e Romeu! Aos beijos! No celeiro! — A voz de Celdo quebrou no fim da frase. — Isso que aconteceu!

E, como se ainda fosse necessário reafirmar sua indignação, ergueu a mão mais uma vez e estapeou o próprio filho diante de todos.

O silêncio que se seguiu pareceu eterno.

***

Se Julius pudesse definir aquela noite em uma palavra, seria humilhante. A dor de ser exposto não vinha apenas do escândalo em si, mas do fato de que fora seu próprio pai, Celdo Mazzaro, quem escancarara tudo diante da família. Com sangue nos olhos e a honra ferida, Celdo relatava a cena com fúria descontrolada — o filho e o empregado, Romeu, entregues a um beijo no celeiro.

As palavras que vieram a seguir não foram apenas duras; foram cruéis. "Maricas. Invertido. Depravado. Desgraçado." Cada insulto atingia Julius como um golpe, doendo mais que qualquer soco. Ele chorava, incapaz de entender como aquele homem que lhe deu a vida podia, ao mesmo tempo, destruir sua dignidade.

— Papai, por favor... — Murmurou Bartolomeu, tentando conter o pai. — Controle-se. Eu já sabia sobre o envolvimento deles.

Um silêncio cortante caiu sobre a sala. O choque da revelação congelou os olhares.

— Como assim?! — Gritou Celdo, agarrando Bartolomeu pelo pescoço. Um estalo seco ecoou no salão. — O primeiro tapa. — E por que não me contou?

— Porque não vejo mal nisso. — Respondeu Bartolomeu, com calma inquietante, mesmo ao receber mais três tapas. — Acho que não tem problema algum, meu pai.

Celdo parecia fora de si. Os olhos arregalados buscavam uma explicação lógica para aquilo que julgava aberração.

— Quer dizer que vocês se amam?

— Eu amo seu filho. — Romeu respondeu com firmeza. — E não importa o que aconteça, sempre vou amá-lo. O senhor mesmo me ensinou que devemos correr atrás dos nossos sonhos.

— Papai, em Costa Estrela, existem muitas pessoas do mesmo sexo que se casam... — Tentou argumentar Julius.

— Calaa a bocaaa!!! — Berrou Celdo, desferindo um tapa seco no rosto do filho. — Não fale uma besteira dessas!

— Chega, Celdo. Estamos todos com a cabeça quente. Precisamos refletir. — Interveio Lady Malody, mas as palavras não alcançavam o coração do marido.

Celdo pensava apenas na vergonha, nas consequências sociais, no escárnio dos amigos. Pior: no julgamento do Rei Nilo, que poderia tirá-lo dos cargos reais. Era mais fácil sentir raiva do que encarar o medo.

Num ato desesperado, Julius correu até Romeu e o abraçou. O gesto foi como um soco no estômago do patriarca. Sem hesitar, Celdo praticamente expulsou Romeu da mansão e arrastou o filho até o quarto. Bartolomeu quis agir, mas a mãe o conteve, pedindo calma.

— Que decepção, Julius. — Murmurou Celdo, chorando de raiva e mágoa enquanto trancava o filho no quarto. — Te criei para ser um homem íntegro.

— Eu sou um homem íntegro, pai... Por que está fazendo isso? — Perguntou Julius, ajoelhado e em prantos.

— Você é uma vergonha para a nossa família. — Disse o pai, antes de bater a porta com violência e girar a chave.

Mas Celdo ignorava um segredo da própria casa: passagens ocultas interligavam os aposentos. Catherine e Bartolomeu, após se certificarem de que o pai não voltaria, entraram no quarto pela parede escondida.

— Meu irmão... — Chorou Catherine, abraçando Julius com ternura.

— Você foi muito desatento. Como pôde ser tão descuidado? Logo aqui em casa... — Disse Bartolomeu, colocando a mão sobre o ombro do irmão e beijando sua cabeça.

— Eu amo o Romeu. De verdade. — Confessou Julius, buscando conforto nos únicos braços que lhe restavam. — O papai me chamou de aberração... maricas...

— Não importa o que te digam. — Afirmou Bartolomeu, segurando o queixo do irmão. — Você sempre será um Mazzaro. Sempre terá um espaço no meu coração. Não importa quantos tapas eu leve... Eu sempre vou te defender.

— Julius, o papai falou aquilo num momento de tensão. Amanhã vocês podem conversar com mais calma. Agora, tente relaxar. Eu falei com Romeu e garanti que cuidaria de você. — Completou Catherine, afagando os cabelos do caçula.

Na manhã seguinte, o ambiente estava carregado. O silêncio dominava o café da manhã. Julius mal levantava os olhos, os hematomas ainda marcavam seu rosto. Lady Melody tentava suavizar o clima, falando do baile que se aproximava.

— O príncipe Mitty me convidou... — Comentou Catherine, buscando algum respiro leve.

Bartolomeu riu da irmã, dizendo que ainda não sabia quem levaria. Mas nem isso animou Julius, que mantinha os olhos baixos, as emoções ainda à flor da pele.

— Melody — chamou Celdo ao se levantar. — Julius está proibido de sair de casa. Sem visitas. Entendido? Bartolomeu. Vamos.

Sem se despedir, o patriarca saiu, deixando o ambiente ainda mais pesado.

— Eu faço companhia para você. — Afirmou Catherine, apertando a mão do irmão, tentando transmitir força.

— Querida, acho nobre da sua parte... mas gostaria de conversar com seu irmão, por favor, sozinha. — Pediu Melody, percebendo a conexão entre os filhos.

— Com licença. Vou para a biblioteca. — Contou Catherine, saindo discretamente.

— Mãe... — Julius correu para abraçá-la. — Me desculpe.

— Meu amor... Tudo bem. Não estou te julgando. Só queria que tivesse sido honesto comigo.

— Estou preocupado com o Romeu...

— Eu conversei com seu pai. Ele vai dar uns dias de folga para Romeu. Não se preocupe, Julius. Seu pai não fará nada com ele. Isso, eu posso garantir.

A conversa com Melody foi difícil, mas necessária. Ela deixou claro que não abandonaria o filho. Ainda assim, regras precisavam ser estabelecidas para o convívio familiar. No fundo, ela compreendia a dor do caçula: amar alguém que o mundo ainda não aprendeu a aceitar.

Longe dali, nas geladas montanhas de Kinopla, um riso contido ecoou entre os penhascos. O feiticeiro Cen celebrou o avanço de seu plano sem precisar sujar as mãos. Com a magia das trevas, invocou um espírito antigo, capaz de envenenar os pensamentos de Celdo com dúvidas e ilusões.

— Plano brilhante... Agora é só esperar o dia do baile e darei a minha cartada final. Todos vão saber do que sou realmente capaz. — Murmurou Cen, fitando a imagem de Framon que dançava dentro de sua bola de cristal.

Enquanto isso, no reino de Framon, a palavra "honra" ainda tinha peso. Nos corredores do Centro de Treinamento, Celdo convocou Romeu para uma conversa. Apesar do nervosismo, o jovem cavaleiro foi ao encontro do mestre, determinado a lutar pelo que sentia.

Ao entrar na sala, Romeu avistou Bartolomeu junto à janela. Sentiu-se aliviado. Sentou-se diante de Celdo, que começou o diálogo com um pedido de desculpas pela agressividade da noite anterior.

— Romeu, há quanto tempo eu conheço você? — Indagou Celdo, evitando encará-lo.

— Desde sempre. O senhor e meu pai lutaram juntos por anos...

— E eu prometi protegê-lo. Por isso, o trouxe como um de meus cavaleiros. — Interrompeu Celdo, com firmeza.

— E eu agradeço por tudo, senhor.

— Então, por gratidão, peço que fique longe de Julius. Ele ainda é jovem, inexperiente...

— Não posso prometer isso. Julius habita meu coração...

— Chega! — Gritou Celdo, golpeando a mesa com força. — Está dispensado por alguns dias. Estou com raiva, com nojo. Se o rei não gostasse tanto de você, eu o mandaria de volta para sua terra.

— Já terminou? — Romeu se levantou, contendo a mágoa, mas sem abaixar a cabeça.

Enquanto recolhia seus pertences, Romeu rememorou os momentos com Julius. Não importava o que viesse: ele lutaria por aquele amor. Mal percebeu a presença de Bartolomeu no vestiário, que se aproximou em silêncio.

— Como Julius está? — Perguntou Romeu, segurando uma caixa com seus pertences.

— Por que não vai vê-lo? — Retrucou Bartolomeu, e logo se arrependeu das palavras.

— Você me ajudar?

— Não sei... Papai está uma fera.

— Bartolomeu, eu amo seu irmão. Me ajude, por favor. — Suplicou Romeu, com os olhos marejados.

— Tá bom. Hoje à tarde, mamãe vem ao castelo para ver os preparativos do baile. Vamos aproveitar. Vou deixar a Catherine de aviso. Deus nos ajude...

As gêmeas Clarissa e Cássia, que ignoravam as tensões familiares, tramaram um plano. Riram, choraram e até cogitaram fingir a morte de Julius, só para que ele ficasse com Romeu. Durante o chá da tarde, reuniram-se no jardim com o príncipe, debatendo um reencontro secreto.

— Gente, não sei o que fazer. Queria gritar... — Desabafou Julius.

— Com licença. — Anunciou Bartolomeu, entrando.

— Bartolomeu! — Exclamaram as gêmeas, levantando-se animadas.

— Boa tarde, meninas... irmãos — Disse ele, piscando discretamente para Clarissa. — Julius, tenho uma surpresa para você.

Romeu entrou. Julius correu para os braços dele, ignorando tudo ao redor. O reencontro foi silenciosamente observado pelas irmãs, que saíram do jardim, puxadas por Bartolomeu.

— Eu te amo, Romeu. — Declarou Julius, antes de beijá-lo.

— Eu também. Julius, você aceitaria fugir comigo para Costa Estrela? Posso trabalhar lá. Podemos ser felizes...

— Preciso pensar... Mas seria um sonho viver ao teu lado.

— No baile de primavera. Todos estarão no centro de convenções. É o momento ideal. — Sussurrou Romeu, tocando a testa de Julius com ternura.

— Ok, Romeu. Vamos fugir. Eu aceito...

Mas o instante de felicidade durou pouco. Celdo invadiu o jardim, gritando. Ignorou os apelos dos filhos e levou Julius à força. Pela primeira vez, o jovem resistiu. Tentou se libertar e quase revidou o tapa que levou.

— Está de castigo até eu decidir o contrário! E se alguém tentar ajudar... — Ameaçou Celdo, com o rosto vermelho de fúria.

Com ajuda das gêmeas, Romeu escapou do jardim e foi para a propriedade de sua família. Clarissa e Cássia prometeram vigiar Julius e pediram paciência.

Naquela noite, a tensão reinou na casa dos Mazzaro. Melody, magoada com a desobediência dos filhos, levou comida para Julius, que recusou. No dia seguinte, Romeu foi convocado ao Centro de Treinamento. O tenente lhe entregou uma carta com o selo do rei.

— Houve um sorteio. Uma missão de dois anos. E você foi um dos escolhidos.

Romeu sentiu o golpe. Sabia que aquilo era obra de Celdo, mas a honra o impedia de recusar. Leu a carta com o coração pesado.

— Isso é coisa do meu pai... — Lamentou Bartolomeu, com a voz embargada.

— Preciso falar com Julius. Ele precisa esperar por mim.

— Ele está trancado no sótão... Meu pai não vai permitir.

— Por favor... — Romeu segurou o ombro do amigo. — Em nome da nossa amizade.

— Cruzes, Romeu. Por que não se engraçou com a Catherine?

Mesmo contrariado, Bartolomeu assumiu o papel de pombo-correio. Contou tudo a Julius. O príncipe, ao saber da partida de Romeu, desmoronou. Recusou comida, assustou a mãe e implorou por uma chance de se despedir.

O tempo era curto. O navio partiria em poucas horas. E Julius só pensava em uma coisa: ver Romeu pela última vez.

Julius já não tinha forças para chorar. O rosto pálido e os olhos vazios indicavam que a dor, agora, era silenciosa. Sem tempo para lamentos, precisou ser prático. Com as mãos trêmulas e o coração em frangalhos, criou uma rota de fuga. No sótão, quebrou uma das janelas com um ferro enferrujado e, com dificuldade, escalou a parede externa da mansão. Cada passo era uma ameaça de queda, mas nada o faria desistir. Precisava ver Romeu.

Ao alcançar o jardim, foi surpreendido por uma figura conhecida, imóvel à sua espera. Malody.

— Julius... — A voz da mãe veio suave, mas carregada de tensão.

O rapaz parou. O peito arfava, mas a alma estava resoluta.

— Uma vez... eu ouvi alguém dizer que o amor de vocês era impossível — disse, com a voz embargada, tentando tocar o coração da mãe.

— O quê? — Melody arregalou os olhos.

— Sim, eu sei que você se casou com quinze anos. E o papai com dezessete. Mamãe... não existe amor errado. Por favor, eu nunca lhe pedi nada. Só dessa vez, por favor.

Ela ficou em silêncio. Por longos segundos, o vento sussurrou entre as folhas, como se o tempo tivesse parado. Então, com os olhos marejados, Melody suspirou.

— Filho... — Houve um instante de reflexão. Por fim, ela assentiu. — Ok. Vá. Rápido.

Sem esperar mais nada, Julius correu até os estábulos, selou um cavalo e galopou com fúria pelas ruas estreitas da cidade. No porto de Framon, o navio já içava as velas. Romeu estava a bordo. Recolhido na cabine, rezava, em silêncio, para ter ao menos uma última visão de seu amado.

Quando o capitão deu a ordem de partida, Romeu sentiu o coração pesar como chumbo.

— É isso... — Murmurou, caminhando até a proa. — Adeus, meu amor.

Mas o destino ainda escrevia em linhas tortas. Julius, ao chegar ao centro da cidade, foi informado por Bartolomeu de que o navio já deixava o porto. Desesperado, ele não desistiu. Galopou até a praia, e de longe avistou a embarcação cortando o mar.

— Romeuuu! — Gritou com todas as forças, enquanto chicoteava as rédeas. — Maldição!

No navio, Romeu mantinha os olhos perdidos no horizonte quando um marinheiro gritou:

— Senhor! Há alguém na praia, montado em um cavalo branco!

Romeu correu, pegou a luneta e, ao ver a figura amada, sorriu com os olhos cheios d'água.

— Não acredito...

— O rapaz é rápido. — Comentou o capitão, admirado.

— Capitão. — Romeu entregou-lhe a luneta.

— Sim?

— Infelizmente, não os acompanharei nesta jornada. Peço dispensa. — Anunciou Romeu para a surpresa do Capitão.

Antes que qualquer objeção pudesse ser feita, Romeu subiu no parapeito e se lançou ao mar.

Foram quinze minutos nadando em mar aberto. Mas para Romeu, aquilo era insignificante diante do amor que o guiava. Na praia, Julius o aguardava, ofegante, tomado pela emoção. Quando Romeu finalmente pisou na areia, foi amparado pelos braços do rapaz.

— Você está maluco? — Perguntou Julius, entre lágrimas.

— Eu te amo. — Foi tudo o que Romeu conseguiu dizer, ofegante, colado ao peito do amado.

Ambos estavam molhados. O pôr do sol refletia nos fios encharcados de Julius, fazendo seus olhos cintilarem. Romeu o encarou e, ao sentir a mão do outro repousar sobre seu peito, percebeu o coração pulsando como nunca.

— Eu te amo, Julius Mazzaro. — Declarou, antes de beijá-lo com fervor.

Algumas pessoas que caminhavam pela praia pararam, chocadas. Mas eles não se importaram. Naquele momento, o amor era a única lei. Mesmo que isso significasse o fim entre Julius e Celdo.

Com a ajuda de Clarissa e Cássia, Romeu encontrou abrigo até o dia do baile. Ele e Julius planejavam fugir para Costa Estrela, onde poderiam, enfim, viver como um casal. Enquanto isso, Julius fazia o possível para manter a aparência. Trancado em seu quarto, sob o castigo imposto por Celdo, separou algumas roupas e pertences.

Com carinho quase melancólico, guardou uma antiga pintura da família. Apesar da dor, ainda os amava — todos eles. Inclusive Celdo.

***

A noite caiu sobre Framon como uma cortina de veludo enfeitada por estrelas tímidas. O palácio real, resplandecente em luzes douradas, exalava luxo e expectativa. Os jardins exalavam perfume de lavanda e rosas selvagens, enquanto as fontes jorravam com um ritmo quase cerimonial. No grande salão, colunas de mármore reluziam sob a iluminação dos lustres de cristal. A realeza e a nobreza desfilaram pelo tapete carmesim com suas vestes de seda e joias cintilantes, como se participassem de um teatro divino.

Mas algo destoava da beleza encantadora daquela noite: a presença de dezenas de soldados da guarda-real, armados até os dentes. Suas lanças, escudos e olhos atentos diziam o que ninguém ousava comentar — o feiticeiro Cen poderia atacar.

Dentro da carruagem adornada com brasões dourados, Julius encarava o pai. O silêncio entre eles era denso como neblina. O jovem apertava os punhos sobre o colo, desconfortável, seu olhar fixo na janela como se buscasse uma rota de fuga na escuridão.

Celdo mantinha a postura rígida. Para ele, o baile era um jogo político, e o filho, uma peça relutante no tabuleiro. Julius sabia disso. E sabia também que seria durante aquela noite que o pai baixaria a guarda — a oportunidade perfeita para escapar.

Ao pararem diante dos portões do castelo, trombetas soaram.

— A família Mazzaro! — Bradou um lacaio.

Julius sentiu o estômago revirar. No mesmo instante, Celdo o puxou para um abraço teatral, um sorriso esculpido no rosto.

— Julius, meu filho, coloque um sorriso nesse rosto. — Pediu Melody, envolta em seda púrpura, sua voz suave tentando esconder o medo.

Antes de entrarem, Melody o conduziu a um canto sombrio do pátio interno. Seus olhos marejados refletiam o brilho da lua.

— Tenho orgulho de você, meu filho. — Sussurrou, tirando um pequeno colar de prata do bolso e colocando-o na mão de Julius. — Este colar tem magia. Quando sentir desespero, mostre-o à lua e peça ajuda à mãe natureza.

— Mãe... — Murmurou Julius, o coração apertado.

— Dias sombrios podem vir. Quero você preparado. — Ela tocou seu rosto com ternura, como se quisesse guardá-lo na memória.

Lá dentro, o salão se encherá de música e sorrisos. Catherine, em um vestido verde-esmeralda, era o centro dos olhares. Mitty a acompanhava com naturalidade. Já Bartolomeu, ao lado de Clarissa, tentava disfarçar o nervosismo, sem saber que a garota nutria por ele sentimentos antigos.

Então, a voz do rei se ergueu sobre a multidão:

— Queridos e queridas! Hoje é dia de celebrar! A primavera chegou, e com ela, a fartura!

Mas o destino interrompeu a festa.

Um raio cortou o céu com violência, seguido de um vento cruel que invadiu o salão como um grito. Uma fumaça roxa, espessa e sufocante, rastejou pelos mosaicos do chão.

Do centro da fumaça, surgiu Cen. Seu manto negro dançava no ar como se tivesse vontade própria, os olhos brilhando em um vermelho doentio.

— Vocês são patéticos. — Declarou, sua voz ecoando nas paredes como veneno.

Os guardas se armaram, mas não tiveram chance. Com um gesto, Cen lançou uma onda mágica. As paredes do salão ganharam vida, revelando uma imagem: o beijo entre Romeu e Julius. O salão mergulhou em silêncio. Murmúrios surgiram, rostos se viraram.

— Celdo, nos encontramos novamente! — Gritou Cen, elevando o nobre no ar como um boneco de pano. — Gostou da surpresa? O teu filho mais novo... tão sincero.

O escândalo era irreversível. Mitty desviou o olhar de Julius. Celdo rugiu de raiva, mas o som foi abafado pelo grito de Cen. Uma labareda gigante explodiu no chão, consumindo parte do salão. Os gritos de pânico ecoaram. Desesperado, Julius subiu em um dos pilares e pendurou-se no pai, os dois rodopiando no ar.

— Pai! O que eu faço? — Questionou o rapaz, abraçado ao pai.

— Julius, fuja. Leve seus irmãos. Salve sua vida. — Celdo apenas respondeu.

O poder de Cen vacilou e os dois caíram sobre uma mesa, o impacto os atordoando. Criaturas esqueléticas emergiram da fumaça. Romeu entrou, puxando Julius para levantar-se e entregou uma espada para o amado. Lutaram lado a lado, espadas contra ossos e magia. Mas estavam em menor número.

Enquanto isso, Cen voltou a erguer Celdo. Ele aproveitou para prender Melody e o rei Nilo em um campo de energia, como troféus. Bartolomeu tentou alcançá-los, mas uma barreira mágica o repeliu. Lágrimas brotaram em seus olhos quando ouviu a voz do pai:

— Leve seus irmãos, Bartolomeu. Salve o príncipe Mitty. Usem o colar... ele tem poder.

— Esse? — Julius mostrou o colar para o pai. — O colar mágico?

— Esse mesmo...

— Criaturas das trevas! — Cen apontou para eles. — Peguem essas crianças!.

— Julius! — Melody, presa na doma de energia, gritou. — A mãe natureza vai ajudar vocês! Ela vai ajudar vocês!

O grupo correu. O caos dominava o castelo. Encontraram uma carruagem abandonada e fugiram em meio à escuridão. Atrás deles, o castelo começou a ruir, engolido por chamas e sombras.

No alto da torre, Cen lançou uma magia final. Uma onda escura se espalhou pelos céus, cobrindo Framon como uma praga. Nos vilarejos e nos campos, as pessoas congelaram em meio ao movimento, paralisadas.

A carruagem atravessou os limites da cidade. Os cavalos exaustos pararam próximo a um bosque. O silêncio foi quebrado apenas pela respiração ofegante do grupo.

Mitty tomou um gole de seu cantil, a voz trêmula:

— Quem diabos é aquele homem? Bartolomeu, você precisa fazer algo.

— O que vamos fazer? — Julius perguntou, a voz falhando.

Catherine o tocou no braço do irmão, ainda em choque. Romeu mantinha os cavalos sob controle, mas seu rosto transparecia a dúvida.

— Precisamos de um plano, Bartolomeu.

Clarissa chorava em silêncio, o corpo trêmulo.

— O que vamos fazer, irmão?! — Julius sacudiu o ombro de Bartolomeu, desesperado.

O jovem não respondeu de imediato. Seus olhos estavam vidrados, a alma em frangalhos. Quando finalmente falou, sua voz era um sussurro partido:

— Eu... eu não sei.

Uma única lágrima escorreu por sua bochecha.

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Comentários

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Tenso, filho estou ate assustado, como vão resolver esse dilema?

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esse cp foi tenso! espero que o.romeu e o bartolomeu e tbm o julius consigam livrar fremon das garras de cen .amando seu conto

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